Transição da dor aguda para dor crônica após cirurgia

Transição da dor aguda para dor crônica após cirurgia

 

A primeira publicação que identificou lesão e cirurgia como um grande fator de risco para a doença crônica apareceu em 1998. Este estudo revelou que aproximadamente 40% de 5130 pacientes com dor crônica em dez clínicas de dor no Reino Unido tinham desenvolvido seu problema de dor crônica após cirurgia ou trauma.

Estes achados levaram a um aumento dramático no interesse sobre esta problemática tendo como conseqüência um aumento de trabalhos publicados sobre dor crônica ou persistente.  Importante é que a partir de tais publicações levantaram-se as hipóteses de que o trauma seria um grande percursor da dor crônica e que cada dor crônica tivesse sido dor aguda em algum estágio.

A verdade é que as consequências da dor pós-operatória e pós-traumática são significativas, não apenas em temos de sofrimento e redução da qualidade de vida para o paciente individual, mas também em relação aos custos subsequentes com os cuidados de saúde e com os sistemas de suporte social de nossa sociedade.

A dor persistente pós-operatória é uma área que pode nos ajudar melhor entender o desenvolvimento da dor crônica em geral e constitui-se num cenário ideal para o estudo dos fatores de riscos e protetivos num ambiente bem controlado.

Dor pós-operatória (POP) é um problema clinico liderando as deficiências no processo de cicatrização e prolongando a convalescença (isto é, o período de recuperação). Dado a grande quantidade de cirurgias realizada a cada ano, com estimativas de milhões por ano somente nos Estados Unidos, a extensão do problema não deixa qualquer dúvida, mas seu manejo permanece essencialmente insatisfatório. Por conseqüência, há uma vasta necessidade clínica para abordagens terapêuticas para prevenir a POP.

Uma publicação da International Association for the Study of Pain (IASP) define dor pós-operatória persistente como uma dor que desenvolve após intervenção cirúrgica e dura no mínimo 2 meses; outras causas para a dor sendo excluídas, em particular a dor originada de uma condição precedente à cirurgia. Em particular, o período de enquadramento de 2 meses tem sido questionado, porque não se suficiente dados para conhecer se dor está ainda diminuído 2 meses após a cirurgia, possivelmente devido ao processo inflamatório que emerge durante mais que 2 meses após algumas operações.

A incidência de dor crônica após cirurgias de grande porte é estimada situar-se entre 20% e 50%, comparativamente às pequenas cirurgias. No geral, a incidência estimada de incapacidade severa por dor após cirurgia fica na amplitude de 2 a 10%.

Estudos clínicos têm identificado vários fatores que tem sido preditivos para a CPOP. Com as taxas de prevalência diferindo entre vários tipos de cirurgias, alguns fatores preditivos são relacionados ao procedimento. Do momento da cirurgia em diante, múltiplos fatores atuarão para determinar quais pacientes desenvolveram POP e quais não. Entender os mecanismos subjacentes à transição de dor aguda para dor crônica de uma perspectiva neurobiológica poderá contribuir para o desenvolvimento de uma abordagem baseada em mecanismo para o tratamento eficiente visando prevenir a POP. 

É claro que nem todo procedimento cirúrgico não pode per se ser considerado suficiente para explicar a POP porque não há uma única cirurgia que resulta em  a POP em cada paciente. Seguramente, então, a dor induzida pela cirurgia amplifica mecanismos que não podem ser considerados mal adaptativos per se; mas, ao contrário contribuem para as respostas corporais necessárias para a cicatrização. Na maioria dos casos, a dor eventualmente resolve-se espontaneamente, mesmo em condições de lesão nervosa.

Estudos clínicos confiáveis identificaram muitos fatores, alguns que podem ser avaliados na fase pré-cirúrgica, que são de certo valor preditivo para o desenvolvimento da POP. Estes fatores, os quais podem ser considerados como “fatores de vulnerabilidade”, incluem a condição física do paciente, a duração da cirurgia, idade e sexo, obesidade e fatores psicológicos, tais como ansiedade, depressão ou catastrofização.

Em adição, tem sido sugerido que o regime de anestesia e analgesia usado durante a cirurgia possa influencia a POP. Alguns destes fatores de risco podem ser muito bem os procedimentos específicos. Após toracotomia, por exemplo, pessoas jovens, sexo feminino, controle inibitório nocivo difuso, extensão da cirurgia, tipo de anestesia, intensidade da POP aguda e administração de terapia coadjuvante (radioterapia e quimioterapia) têm sido todos mostrados ser associados com o desenvolvimento da mesma.

Na realidade tanto uma abordagem integrada e compreensiva, baseada em mecanismos, acerca da transição da dor aguda para a dor crônica quanto à contribuição de uma equipe multidisciplinar envolvendo neurobiólogos e clínicos de dor são condições necessárias para o progresso da prevenção da POP

A medicina personalizada tornar-se-á padrão, num futuro muito próximo, envolvendo uma cuidadosa e consideração multidisciplinar de cada fator de risco da cirurgia qualquer que seja o paciente ou a cirurgia; mas, certamente deverá focar em muito o período pré-operatório total.

 

 

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