2016

2016

2016: O ano da cegueira e do tapa-olho. Não viu quem é vesgo, míope ou simplesmente idiota, alienado. Tudo estava à nossa frente. Saímos da hibernação, quando doeu no bolso. Fomos às ruas, quando a podridão já ficara raízes. Trocamos ladrões, que nos exploravam há 12 anos, por aqueles que nos exploram há 50.
As desilusões forjam as utopias. Quem sabe não esteja em 2016 o esterco que adubará a semente para deixarmos definitivamente para trás os versos de Belchior de "Como nossos pais" e abraçarmos os versos de Geraldo Vandré: "Quem sabe/ faz a hora / Não espera acontecer".
A geração dos meus pais não deixou um mundo melhor, para a minha e a minha não deixará nada que valha a pena. Como a caixa de Pandora deixará a esperança e, com ela, a paralisia. Ah! E a péssima mania de reclamar, sem fazer. Deus resolve tudo, basta orar. Não preciso fazer a minha parte.
O problema atávico do Brasil é o fato de que não sabe que não sabe. O Brasil não lê, não estuda, confunde "achismos" com opiniões, despreza sua história e se rende ao complexo de Vira-lata e ao de Zé Carioca sem perceber que isso interessa a "alguém". A quem? A quem domina a mídia? A quem domina o capital? A quem domina a política? A quem...?
O Brasil é o único país do mundo onde a população faz greve para melhorar a qualidade do ensino, mas não vai à escola. Onde o corta e cola cumpre a função de fazer "pensar".
A crise econômica do Brasil se anunciava há, no mínimo, 12 anos. Pagaríamos a conta por causa dos gastos com os jogos Pan-Americanos, assumiríamos a estrondosa dívida de uma Copa do Mundo e de uma Olimpíada. Não foi bom todo aquele ufanismo do Galvão Bueno? De qualquer forma, mesmo ganhando, perdemos. 7 x 1 foi muito pouco, diante do que ainda perderemos. Quem sabe, Neymar nos salve?
A crise política existe desde a Ditadura militar. Nenhum partido tem um projeto para o Brasil, mas projetos indecorosos de" phoder" (como diz o grande jornalista Geraldo Muanis). Só isso explica uma aliança entre Lula e José de Alencar. Só isso explica o fato de o PMDB assumir o governo, toda vez que um presidente cai. Só isso explica um Congresso eleito sob medida para que o "baixo clero" determine quem fica ou sai, de acordo com o tamanho do suborno que receberá. Um congresso vergonhoso que determina quais serão os "safados" que manterão o "pudê".
2016 é o ano dos refugiados. 
Todo o mundo, dito civilizado, sabia que as potências ocidentais, ao obrigarem povos miseráveis a comerem areia e beberem petróleo, acabariam construindo uma das maiores tragédias humanas da história da desumanidade. A miséria e a fome invadiu o bolso da mãe rica, querendo, com propriedade, o seu quinhão.
Todo o mundo sabia que Aleppo traria para narizes indiferentes o fedor da guerra, os destroços dos prédios e dos homens. Aleppo é a imagem dilacerante da luta entre o capital e a fé, as ditaduras bancadas por russos e americanos para venderem armas para todos os lados. Capital não tem lado, nem consciência, nem culpa.
Se formos estabelecer uma medida, quem é mais terrorista: o Estado Islâmico ou os bombardeiros russos e americanos, que "erram" o alvo, atingem crianças e velhos nas zonas de conflito? Quem mata ou quem manda matar? Quem manipula consciências para receber patrocínios entre uma notícia e outra ou quem se sujeita a apoiar e votar em quem promete destruir ainda mais os restos de uma cultura de que jamais ouviu falar?
2016 fez a cara das redes sociais aparecerem, como verdadeiramente são, sem a maquiagem da hipocrisia: disseminação do ódio, dos profetas do caos, da fé cega, dos donos das verdades universais, da burrice incólume, das frases de autores famosos que jamais as reconheceram. Estava mais do que na hora de o internauta ficar nu. 
O Brasil precisa se descobrir. Ficar atento à desinformação, mas, para isso, precisa perder essa mentalidade de procurar sempre o mais fácil e não o mais confiável.
Não preciso sair de casa: Aleppo é o Brasil e o meu pesadelo, espero que seja também o seu.

Compartilhar: