Otimismo cauteloso

Otimismo cauteloso

Embora existam sinais concretos de retomada da atividade econômica, as empresas continuam enfrentando sérias dificuldades. Por todo o país, os trabalhadores convivem com o fantasma do desemprego. Na conjuntura atual, a instabilidade política está atrapalhando bastante a recuperação da economia. Se por um lado, o dólar voltou para a casa dos R$ 3,00, a inflação retornou para o centro da meta e os juros estão caindo, por outro, o governo de Michel Temer está no centro das delações da lava-jato, vários ministros já caíram ou estão para cair. 

Para projetar o que acontecerá no país em 2017, economistas, analistas de mercado e comentaristas da mídia estão de olho nos indicadores econômicos e nas nuances da política. Quem faz uma associação bastante objetiva e otimista dessa intersecção é o apresentador, jornalista e radialista, Carlos Alberto Sardenberg, âncora da CBN e comentarista da Globo News, que recentemente fez uma palestra em Ribeirão Preto para uma plateia formada, majoritariamente, por empresários. Como todo jornalista que valoriza a informação em detrimento da opinião empírica, o otimismo de Sardenberg está baseado na aprovação da PEC dos gastos, no encaminhamento, mesmo que não haja consenso, das reformas da Previdência, Trabalhista e Tributária, na queda dos juros e da inflação, além da própria expectativa de melhora que começa a contaminar o mercado. Não haveria essa dose de otimismo se a conjuntura internacional não estivesse ajudando. Nos números apresentados pelo jornalista, em 2017, o crescimento mundial será maior do que no ano passado — 3,5% contra 3,0%. Estados Unidos e China também devem ter desempenho positivo e o mesmo está previsto para os países emergentes, com a alta das commodities.

Evidentemente que há muitos riscos, principalmente para uma economia fragilizada como a brasileira. O maior perigo para a estabilidade mundial se chama Donald Trump, que após assumir a presidência dos Estados Unidos tem  mantido a média de um conflito novo por dia. Ainda tem o racha no Reino Unido provocado pela saída da União Europeia e as ameaças à globalização com possibilidades concretas de vitória da direita nacionalista e preconceituosa na França, na Alemanha e na Itália. A eclosão de conflitos motivados pela xenofobia está por um triz. No Brasil, a Lava Jato ainda vai fazer muitos estragos e ninguém sabe ao certo até aonde a economia poderá suportar. Na sua exposição, Sardenberg ainda mencionou um indicador importante, que sinaliza o desempenho da economia. Medido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), os índices de confiança do consumidor, do comércio, da indústria e da construção civil começaram o ano em alta, com expectativas acima dos 80 pontos para 2017.

Alguns desafios estão postos na conjuntura atual, o principal deles é o arranjo das contas públicas. Sardenberg ironizou o descalabro governamental provocado pela ex-presidente Dilma Rousseff, que deixou o governo com um rombo de 154 bilhões, considerado “bom” por alguns analistas, uma vez que durante a transição de governos o déficit nas contas públicas estava projetado em R$ 170 bilhões. Evidentemente, que um endividamento tão alto coloca o Brasil numa perigosa faixa de insolvência financeira, fenômeno que ocorreu em países como a Argentina e a Grécia. O déficit da Previdência bateu na casa dos R$ 150 bilhões e a dívida pública já representa 75% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse índice de endividamento mostra que o Estado incorporou uma estrutura perdulária, esbanjadora e que ainda por cima investe mal e não fiscaliza a aplicação dos recursos. Com gráficos, o jornalista mostrou que, de 2008 a 2015, a receita pública cresceu 17% e a despesa 50%.

Acuado, o governo recorre a estratagemas condenados pela opinião pública, como conceder foro privilegiado a quem está em vias de virar réu e ainda mantém nos cargos políticos acusados de corrupção. Governo, Congresso Nacional e uma parte do empresariado querem sabotar a Lava Jato a qualquer custo. A confirmação de Alexandre Moraes para o Supremo Tribunal Federal (STF) é uma estratégia descarada de tentar absolver muita gente envolvida com a corrupção. Políticos como Edson Lobão, Homero Jucá e Renan Calheiros circulam livremente pelo poder apostando na morosidade do STF. Apesar do otimismo de Sardenberg com o cenário econômico, o noticiário político continua preocupante, tanto que o Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem Pra Rua, que puxaram o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, convocaram uma manifestação nacional para o dia 26 de março. Na pauta, a defesa da Lava-Jato, o fim do foro privilegiado e a reforma trabalhista e da previdência. No Brasil, vigora um sistema corporativista que sustenta diversos interesses. Leva a melhor quem faz mais pressão, o povo inclusive. 

Compartilhar: