O segredo da vida

O segredo da vida

Algumas vezes associada ao dinheiro, outras à paz interior, a felicidade permanece uma incógnita para muitas pessoas. Se existe um “segredo” para uma vida plena e feliz, todos gostariam de descobrir

Em resumo, viver pode ser bem simples: acordar, alimentar-se e dormir. Eis a “fórmula mágica” que o reino animal oferece. Além disso, tudo pode parecer distorção da natureza. Para o homem, no entanto, o que acontece entre o acordar e o dormir tem importância maior.  Sobreviver simplesmente não basta: é preciso existir. Justamente o que cada um faz entre o acordar e o dormir representa existir., mas, afinal, há um segredo para viver uma existência plena e feliz? 
Utilizando elementos comuns, como a generosidade ou o egoísmo, a determinação ou a inércia, a gratidão ou a revolta, todos buscam desvendar esse mistério. Os erros e os acertos se alternam porque, na tentativa de construir uma narrativa pessoal que satisfaça o desejo de existir, mas ainda atrelado ao sentimento natural de sobreviver, muitas vezes, o homem se perde.
 
Nestes momentos, histórias de pessoas que alcançaram seus objetivos ou superaram limitações são inspiradoras. Caso dos empresários Sebastião Edson Savegnago, o Chalim, da Rede de Supermercados Savegnago, e de João Braz Naves, fundador da Rodonaves Transportes, que aprenderam desde muito cedo a assumir responsabilidades, valorizar o trabalho e acreditar em Deus e, assim, escreveram para si narrativas surpreendentes.

Chalim brinca que se aos 19 anos dissessem que ele presidiria uma empresa com 6.500 funcionários teria um colapso. Hoje, com quase 40 anos de experiência, o peso dessa responsabilidade soa mais leve. O mesmo acontece com João Naves. “Muita gente diz que meu fardo é maior do que o dos outros, afinal, cada colaborador tem responsabilidade com sua família e eu, com as seis mil. Dá a entender ser mais pesado, mas, se fosse para analisar dessa maneira eu já não estaria andando. Deus dá a responsabilidade que cada um pode carregar e todos podem desenvolver suas próprias competências para ter fardos maiores”, pontua Naves.

Curiosamente parecidas, as trajetórias dos empresários fazem refletir sobre o que os diferencia, o que os torna pessoas vencedoras não apenas do ponto de vista material ou profissional, mas, principalmente, existencial, pois são extremamente de bem com a vida por natureza. 

Destino, sorte, “estrela”, fé. Há que atribuir o triunfo? O estudioso do sucesso, Napoleon Hill, combateu tais associações afirmando que o único lugar onde o sucesso aparece antes do trabalho é no dicionário, mas também o colocou lado a lado com a convicção. “Mais cedo ou mais tarde, cativa a vitória aquele que crê plenamente que a conseguirá”, determinou Hill.

Interessante observar como no caso dos empresários o sucesso foi justamente o que aconteceu enquanto estavam ocupados demais para pensar nele. Convictos de dar o melhor de si, de buscar realização interior, de existir, enfim, ambos simplesmente se entregaram à experimentação do sucesso e, com disciplina e fé, tornaram-se exemplos de como aproveitar esse período entre o acordar e o dormir para criar a realidade em vez de se deixar conduzir feito um navio sem rota. 

Outras histórias pessoais também ensinam com sabedoria a existir, a alcançar conquistas interiores incalculáveis e indispensáveis, desatreladas de sucesso, fama ou dinheiro. São trajetórias como da professora de dança Ieda Marta Baptista Costa Marques que, aos sete anos, começou a perder a visão, mas nunca desistiu dos seus sonhos ou da médica ortomolecular Fernanda Tamer Cardili, que superou a leucemia e o câncer de tireoide, conservando uma invejável disposição para se superar. Histórias que demonstram existir um dispositivo interno capaz de mover todo ser humano em direção à felicidade, independente das adversidades.

Diagnosticada com retinose pigmentar, uma doença hereditária, Ieda foi gradativamente perdendo a visão, mas não a capacidade de acreditar em si mesma. Aos 17 anos, decidiu investir na dança. Fez oito anos de balé clássico e também tango e dança do ventre. “Tinha uma porcentagem um pouco maior de visão naquela época, mas não sei precisar quanto. Nunca quis perguntar para o médico para não me limitar ainda mais. Sabia que era pouca, mas queria seguir em frente”, relembra.

Não parou por aí. A paixão por esportes também não se viu limitada pela cegueira. Com pouca visão, mas muita coragem, Ieda foi para a faculdade de Educação Física, conseguiu se formar e passar em um concurso público. Se tivesse duvidado de si e atendido àqueles que queriam que desistisse, não seria responsável pelo belo trabalho desenvolvido na escola municipal Nelson Machado, onde, há dez anos, dá aula de dança para crianças. Não estaria citada aqui, nesta matéria, motivando quem lê a descobrir qual o seu segredo para viver uma existência de plenitude, independente das circunstâncias.

Citando Cora Coralina, “mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, fugir ou lutar; porque aprendi, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir”, a médica Fernanda Tamer praticamente desenha a importância das escolhas. Com uma carreira em andamento como intensivista em Campinas, ela abandonou tudo para começar do zero em Ribeirão Preto, em uma área completamente nova: a ortomolecular. “Estava mudando de cidade, profissão, salário, tudo, mas certas situações da vida exigem coragem. Mesmo com medo, é preciso pular essa etapa, vencer esse sentimento e seguir em frente porque a vida requer isso. No fim, vale a pena”, garante. 
Essa força íntima foi do que se utilizou para superar as duas doenças graves pelas quais passou. Foi em busca de respostas à leucemia, inclusive, que Fernanda acabou se descobrindo e se realizando profissionalmente. “Achava que faltava alguma coisa que agisse diretamente na unidade constitucional, pois somos formados por moléculas. Queria algo que fosse mais fundo nesse meu problema. Procurei a ortomelecular e acabei me encantando e decidindo que era o que eu queria fazer”, conta.

Nada diferente do que aconteceu com João Naves, que, por trabalhar com a venda de passagens, identificou uma oportunidade de negócio no transporte de mercadorias; de Chalim Savegnago, que foi emancipado pelo pai e escolhido para tocar sozinho o segundo mercado da família, que deu início à rede; ou de Ieda, que sentiu uma inexplicável necessidade de aprender dança, o que se tornaria a obra de sua vida; Fernanda também foi conduzida, através da doença, a um mesmo ponto: a escolha de protagonizar sua história.

Afinal, as oportunidades surgiram para eles pelo desejo de existir ou por causa delas esse desejo latente despertou? Qual o “segredo da vida” contido na equação do acaso? Se o perfil dessas quatro pessoas pode sugerir uma resposta, então, a determinação surge como forte candidata a ocupar o cargo. Dada a multiplicidade das personalidades, no entanto, talvez seja prudente considerar que exista mais do que um segredo para cada pessoa. A resposta cabe a cada um decidir, mas para contribuir com essa reflexão, começando o novo ano com renovada disposição de existir, Chalim, Fernanda, Ieda e João compartilham com o leitor a sua opinião sobre o tema, respondendo qual o seu segredo de viver e ser feliz.

O segredo da evolução
Fernanda Tamer Cardilli, 40 anos, desde pequena queria fazer medicina. Abria peixes e passarinhos porque queria saber o que havia dentro deles e, hoje, sacia essa curiosidade de menina praticando ortomolecular, estudando e auxiliando as pessoas a se equilibrarem fisiologicamente. “O equilíbrio é um exercício diário para o corpo e para a mente. Todos vivem momentos de tristeza, mas quando se tem a senha para sair disso — perdoar e agradecer —, tudo fica mais fácil”, avalia. Alegre e cativante, a médica que passou por duas doenças graves — a leucemia e o câncer de tireoide — acredita que o segredo da vida está na evolução. Fernanda encara cada dia como uma oportunidade de evoluir como pessoa, profissional, filha, tia, amiga. “Todos os dias, acordamos e temos essa chance. O segredo é aproveitá-la, ter consciência de que hoje pode ser melhor do que ontem, desde que se queira, é querer evoluir e melhorar a cada dia, sempre buscando a sua felicidade”, ressalta. Nesse sentido, ensina sua fórmula pessoal de evoluir: colocar objetivos para o dia a dia. Ela, que sempre praticou balé e ioga, de repente, resolveu mudar para testar sua capacidade. Foi para o crossfit pegar peso e se surpreendeu com o quanto desconhecia seu potencial. “É incrível como nosso corpo responde e como nossa força de vontade supera qualquer obstáculo. Vi, através do crossfit, o quanto nos subestimamos. Resolvi que queria mudar, que iria evoluir nisso e consegui. Evoluí meu corpo, minha saúde, tracei metas e estou conseguindo cumprir. Meu objetivo agora é participar de um campeonato de crossfit e não ficar em último lugar”, diverte-se.

O segredo da autoestima
João Braz Naves, 64 anos, empresário, caçula entre 10 irmãos, começou cedo a desenvolver sua maior habilidade: lidar com pessoas. “Você vive melhor quando não se fecha, quando conversa e brinca com os demais. Misturando seriedade e brincadeira, muitas atividades podem ser realizadas”, afirma.  Seguindo essa filosofia e sustentado pela fé, fundou uma transportadora, presente hoje em sete estados brasileiros. “Quando você acredita e pede com fé, tudo acontece”, garante, lembrando que mais importante do que alcançar a graça é não perder a esperança. “Hoje, o ser humano está pedindo para ontem, para hoje. As pessoas precisam entender que somos atendidos no tempo certo. João Filho, por exemplo, levou 19 anos para chegar. É meu testemunho de que não se pode perder a fé”, pontua. Para ele, o segredo da vida está na fé e na autoestima, pois a pessoa que gosta dela própria, que tem fé em si mesma, transmite alegria, confiança e felicidade para os outros, criando uma rede positiva de acontecimentos. “Quando você determina que só se resolve os problemas com as melhores atitudes, descobre que, a cada dia, está mais preparado para a felicidade. Com palavras e apertos de mãos,  as pessoas vão se sentindo mais felizes de estar com você e multiplicando esse sentimento. Acho necessário soltar mais o coração e, ao se olhar no espelho, sentir o quanto se é feliz por amanhecer vivo e com saúde, afinal, não se está indo para a guerra”, argumenta.

O segredo da simplicidade
Ieda Marta Baptista Costa Marques, 46 anos, professora, foi gradativamente perdendo a visão, a partir dos sete anos, e aprendeu a desenvolver outras percepções. Para ela, o segredo da vida está na simplicidade e na persistência. Acorda cedo, toma banho e ela mesma ou o marido preparam o café para tomarem junto com Lucas, de cinco anos. A decisão de ter filho foi tardia por causa do receio da hereditariedade da deficiência. Aos dois anos, Lucas perguntou por que só o papai olhava para ele. “Eu não enxergo, mas estudei, fiz faculdade e tenho meu trabalho, que permite comprar coisas para você. Só não dá para ajudar a fazer lição, conferir se está certo ou não. Isso seu pai precisa fazer, mas nada fica a desejar”, explicou. O trabalho, por sinal, ensinar dança para alunos da EMEF Nelson Machado, no bairro Maria Casagrande Lopes, mais do que dignifica, enaltece. “É gratificante. Sinto que valeu a pena todo meu esforço. Acho que cada um tem um caminho a seguir, que existem pedras, mas que nunca se pode desistir. O importante é decidir o que se quer e buscar. Acredito que o segredo é esse: tentar, acreditar e nunca desistir porque, lá na frente, enxergamos que o que importa mesmo são as coisas mais simples, a família, o trabalho, o coração tranquilo. Afinal, a vida é uma passagem apenas”, ressalta Ieda.

O segredo do amor
Sebastião Edson Savegnago, 56 anos, foi emancipado pelo pai aos 17 anos para se tornar sócio do negócio da família e levou tão a sério essa responsabilidade que, aos 19, já encarava o desafio de tocar sozinho sua primeira loja. “Sou supermercadista nato. Adoro o que faço”, alega. Isso explica, por certo, o sucesso da rede de 33 lojas. Rigoroso com os compromissos e preocupado com as pessoas, Chalim diz que a empresa foca nos clientes e na equipe, a essência do negócio. Por isso, a atenção sempre voltada para o relógio, a fim de cumprir a agenda e não deixar ninguém esperando. Quando amanhece o dia, segundo ele, o pensamento está em Deus — na gratidão — e nas tarefas a cumprir. “Exijo muito de mim, entrego-me o máximo que posso para as pessoas que me rodeiam, mas também curto muito a vida com a família e os amigos em viagens, cavalgadas e festas. Sinto-me muito realizado profissionalmente e acho que consigo devolver para minha vida pessoal essa dedicação”, diz. Para Chalim o segredo da vida está no amor dedicado às pessoas, aos familiares, aos amigos e ao trabalho. “O amor é uma palavra pequena, mas muito profunda e significativa. O resultado é outro quando há o toque do amor. Onde o coração está na frente, onde se usa a emoção, o sentimento, as coisas saem mais bem feitas. Acho que levantar da cama com esse sentimento é muito bom porque quando se acorda achando tudo ‘um saco’ você se torna ‘um saco e meio’ para os outros”, enfatiza. 

Texto: Yara Racy
Fotos: Júlio Sian e Luiz Cervi

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