A proteção do Aquífero

A proteção do Aquífero

Artigo por Evandro Grili, advogado, sócio de Brasil Salomão e Matthes Advocacia, diretor da área ambiental do Escritório

A Câmara Municipal rejeitou, durante o mês de novembro, o PL 270, que previa o “congelamento” de dois setores da Zona Leste da cidade. É um tema antigo que volta à Câmara e que já foi rejeitado em votações anteriores. A discussão também é objeto de ações movidas pelo Ministério Público na Justiça e que não vem surtindo efeito, especialmente, porque o Tribunal de Justiça de São Paulo tem negado os pedidos para realização da proteção ambiental do Aquífero, da forma como eles vêm sendo feitos judicialmente.

Em que pese o tema ser amplamente debatido e com algum apoio popular, com todo respeito, o projeto de lei era mesmo inconstitucional. Primeiro porque promovia alterações na estrutura do Plano Diretor do Município e, as pretendia, de forma indireta por meio de projeto de Lei Complementar que sequer mencionava as diretrizes do Plano Diretor.
Nos termos da Lei Orgânica do Município (art. 10, das disposições transitórias combinado com art. 84), os projetos de lei que alterem o Plano Diretor são de competência exclusiva do Poder Executivo. Não podem, portanto, os vereadores, serem autores de iniciativa legislativa nesse sentido.

Nem se alegue que seria um projeto que alteraria apenas a estrutura da lei de uso e ocupação do solo, eis que o artigo 84 da Lei Orgânica é claro ao dispor que alterações desse tipo devem ser feitas por meio de planos diretores. O projeto sequer mencionava, também, a lei de ocupação do solo urbano. Era um projeto avulso e separado de todo o corpo legislativo das leis municipais existentes sobre o assunto.

Mais do que isso, não bastasse o vício de iniciativa, o projeto ainda desrespeitava o art. 5o, inciso XXXVI, da Constituição Federal, que diz que leis novas não podem atingir atos jurídicos perfeitos. O PL 270 fixava prazo de validade para certidões de diretrizes emitidas pela Prefeitura antes da vigência da lei, bem como para autorizações de parcelamento do solo já aprovadas. Nos dois casos, ofendia claramente o art. 5o, XXXVI, da Carta Magna, na medida em que fixava prazo de validade para atos jurídicos perfeitos praticados antes de sua vigência.

A decisão da Câmara, embora muito criticada, ante ao evidente apelo ambiental do projeto, foi acertada do ponto de vista jurídico, ante sua manifesta inconstitucionalidade. Senão, caberia ao Executivo vetar, ou, ao Judiciário, mais uma vez, decretar inconstitucional uma norma da nossa cidade; o que não tem sido incomum nos últimos anos.
Preservação ambiental é louvável, mas deve ser feita nos limites da Constituição Federal e da legislação vigente. Caso contrário, só atrasaremos o objetivo de preservar o meio ambiente, com a produção de normas jurídicas que serão facilmente derrubadas pelo Judiciário. A respeito do Aquífero Guarani, é bom lembrar que, em segunda instância, em todas as vezes que o Judiciário foi chamado a se manifestar sobre o assunto, o entendimento foi no sentido de que a proteção do Aquífero Guarani deve ser um tema de leis federais e até mesmo de tratados internacionais, eis que ele “banha” vários estados brasileiros e todos os países do cone-sul do Mercosul.  A solução legislativa definitiva para o problema, com todo respeito, não passa pela Câmara Municipal de Ribeirão Preto, mas sim pelo Congresso Nacional, que deverá produzir uma norma nacional que dê proteção efetiva e homogênea a este tipo de recurso ambiental. 


Artigo por Evandro Grili, advogado, sócio de Brasil Salomão e Matthes Advocacia, diretor da área ambiental do Escritório.


Foto: Renato Lopes.

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