Muita coleta pela frente

Muita coleta pela frente

Apesar de ter aumentado cerca de 100% no último ano em Ribeirão Preto, a coleta seletiva ainda abrange uma pequena parte da cidade

Entre os termos mais recorrentes na mídia e nos discursos contemporâneos está, certamente, a sustentabilidade. Se em um dado momento este substantivo referia-se apenas à característica do que é sustentável, a palavra se tornou um verdadeiro princípio, segundo o qual o uso dos recursos naturais no presente não pode comprometer a satisfação das gerações futuras.

De outra forma, pode-se entender a sustentabilidade como a capacidade de interação com o mundo, especialmente com o meio ambiente, sem promover a escassez ou o esgotamento dos recursos indispensáveis à sobrevivência dos filhos e netos dos adultos de hoje em dia. Fato é que considerar todos esses conceitos é, mais do que uma necessidade, uma obrigação da geração contemporânea. Afinal, o uso indiscriminado de recursos naturais e as consequências geradas pela atuação despreocupada do ser humano já apresentam uma conta alta a ser paga.

Basta observar, por exemplo, a atualíssima crise da água vivida pelo país, especialmente na região Sudeste, além de catástrofes ambientais recentes no mundo inteiro.

Para que se garanta maior harmonia na relação entre o homem e a natureza, é preciso considerar uma série de variáveis. Uma delas, sem dúvida, é o tratamento dado ao lixo. Segundo o site www.suapesquisa.com, os brasileiros produzem, diariamente, cerca de 250 mil toneladas de lixo, sendo a capital paulista a maior responsável por este número, correspondendo a algo em torno de 19 mil toneladas diárias. Em Ribeirão Preto, os descartes ultrapassam 600 toneladas todos os dias. Sob a responsabilidade da Estre desde 2013 (quando a empresa adquiriu a então contratada Leão Ambiental), com a fiscalização da Coordenadoria de Limpeza Urbana, quase a totalidade desse volume é encaminhado ao Centro de Gerenciamento de Resíduos (CGR), ou aterro sanitário, de Guatapará.  Pouco mais de 1% do lixo da cidade passa por coleta seletiva e é reaproveitado.

De acordo com André Batalhão, pesquisador em ciências ambientais, com doutorado em andamento na área, o número relativo à coleta do gênero em Ribeirão Preto é 10 vezes menor do que o verificado na vizinha Araraquara. Para o pesquisador, o reaproveitamento de parte do lixo produzido é fundamental por uma série de aspectos. “Sob o ponto de vista geográfico, a coleta seletiva é uma boa alternativa para a falta de espaço para a disposição do lixo e para a preservação da paisagem, aumentando, inclusive, a sobrevida dos aterros já existentes e reduzindo a necessidade de abertura de novos espaços.

Também há importantes razões sanitárias e ambientais para se investir na coleta seletiva, já que a disposição inadequada do lixo pode trazer problemas de saúde pública, bem como a contaminação do solo ou de águas superficiais e subterrâneas”, lista o especialista. Segundo André, existem, ainda, motivos sociais e econômicos para se investir nesse tipo de coleta, já que a revenda ou o reaproveitamento de materiais recicláveis permitem a geração de empregos, melhoram as condições de trabalho de catadores, diminuem o número de pessoas trabalhando em lixões, movimentam o comércio e a indústria, além de reduzirem os gastos com limpeza urbana e os investimentos em novos aterros.


Busca da otimização

Apesar de ter sido implementada em 1991, a coleta seletiva não recebeu a atenção devida em Ribeirão Preto nas últimas décadas, tendo sobrevivido graças a esforços pontuais. Tanto é que, apesar de passados 24 anos desde seu início, o serviço está disponível em apenas 25 bairros ribeirãopretanos, o que significa 17% da área total do município. Uma das prováveis razões para isso passa pelo custo: enquanto o serviço relativo ao lixo orgânico demanda dos cofres da cidade R$ 85,83 por tonelada, fazer a coleta seletiva significa gastar R$ 583,00 pelo mesmo volume.

De acordo com o gerente regional de operações da Estre, Thiago Fernandes, os resultados da coleta seletiva no município, assim como na grande maioria das cidades brasileiras, são tímidos face ao potencial que possuem. “De qualquer forma, tivemos, no segundo semestre de 2014, uma evolução, aumentando o volume coletado na ordem de 100%”, comemora, afirmando que esse desempenho só foi possível por conta do apoio da população e do poder público.

Por causa do fortalecimento deste trinômio — setor privado, setor público e população — foi possível atingir 60 toneladas de lixo reciclável em dezembro do ano passado, partindo de aproximadamente 29 toneladas coletadas em março de 2014. O avanço aconteceu graças a um trabalho de informação capitaneado pela Coordenadoria de Limpeza Urbana, que pediu uma maior participação da população e cobrou mais eficiência da prestadora do serviço. De acordo com Isabel de Farias, coordenadora da Limpeza Urbana de Ribeirão Preto, as iniciativas seguem no sentido de ampliar a coleta seletiva no município. “Nosso primeiro objetivo, que depende fortemente da integração com todas as partes deste tripé, é elevar o aproveitamento de 1% de material reciclável nas áreas já atendidas para 5%, nos mesmos locais, o que já representa um ganho considerável”, aponta a coordenadora, que também responde pela Secretaria de Infraestrutura.

Depois disso, a maior abrangência do serviço na cidade dependerá de fatores variados, como custo e investimento em educação ambiental.
Nesse sentido, o primeiro bairro a receber atenção especial foi a City Ribeirão, cujos moradores se mostraram bastante receptivos à proposta de separar o lixo com mais rigor e critério, contribuindo para a coleta seletiva. “Esperamos fechar 2015 com mais de 150 toneladas coletadas mensalmente pela Estre, evolução extremamente arrojada neste assunto”, afirma o gerente regional, ao lado de Alêxsandro Ribeiro da Silva e Marcos Gonzaga dos Santos, respectivamente gerente e coordenador operacional da empresa.

Para que seja possível ampliar o serviço, um planejamento de expansão está sendo preparado e deve ser concluído até março deste ano, permitindo que novos números se tornem realidade o mais breve possível. “O custo disso estará relacionado à forma como o programa se consolidará, mas ainda não há embasamento que nos permita mensurar um valor”, acrescenta Thiago. Já em relação ao potencial da cidade, o gerente arrisca dizer que, em comparação a outros municípios atendidos pela Estre, Ribeirão Preto deverá superar 1.200 toneladas de lixo reciclável ao mês quando o processo estiver amadurecido. “Este é um caminho longo, que depende, não só de ser renovado constantemente, mas também da participação ativa da população. Trata-se de um grande desafio”, afirma Thiago.

Além do meio ambiente
Considerados apenas os benefícios que traz para a natureza, a coleta seletiva é mais do que justificável: o reaproveitamento de materiais descartados promove uma economia direta de recursos naturais, como de água e da madeira que compõe as florestas, além de garantir menor poluição do solo, do ar e, novamente, da água, e assim por diante. A atividade se torna ainda mais forte quando se leva em consideração os ganhos econômicos e sociais que pode proporcionar. Para se ter uma ideia, estima-se que o lixo reciclável movimente cerca de R$ 12 bilhões no Brasil inteiro, sendo que outros R$ 8 bilhões são desperdiçados nos aterros sanitários pelo país afora. Além do retorno financeiro, vale reforçar que o reaproveitamento do lixo também diminui gastos com saúde pública e com os reparos de áreas degradadas, entre outros ganhos indiretos.

Há que se considerar, ainda, o retorno social que a coleta seletiva proporciona. A atividade gera empregos diretos e indiretos a uma parcela da população, geralmente, sem oportunidades. Esse ganho é verificado em Ribeirão Preto desde 2008, quando foi criada a Cooperativa Mãos Dadas, para onde é destinado todo o lixo reciclável recolhido no município. O grupo começou a tomar forma por iniciativa dos próprios catadores de material reciclável, capitaneados por Iracy Pereira, que continua à frente do trabalho. Formada, atualmente, por cerca de 30 trabalhadores, a Cooperativa mudou a vida de seus integrantes. “Hoje, temos um contracheque e direito a férias, 13º salário, aposentadoria e tudo mais. Através do lixo reciclável, resgatamos nossa dignidade e ainda colaboramos com a natureza”, destaca a trabalhadora.

A Cooperativa passou a funcionar de forma mais organizada, de fato, a partir da doação de um caminhão, durante a administração do ex-prefeito Welson Gasparini. O caminhão, doado em 2009, continua sendo usado até hoje.  Na sequência, o grupo lutou e conseguiu a cessão de um barracão para o seu funcionamento e também de algumas prensas para a execução do serviço. Além da estrutura, ainda precária, que funciona no Jardim Branca Salles, zona Oeste de Ribeirão Preto, os cooperados recebem Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), óleo diesel para o transporte dos materiais, além de transporte, cesta básica, café da manhã, água e luz pagos pela Prefeitura de Ribeirão Preto.

O grupo é responsável pela triagem, separação e comercialização do material coletado na cidade. Toda a renda obtida ao final desse processo é revertida a essas famílias. Estas e outras conquistas, como o projeto de mudança da sede da Cooperativa para um local mais completo, devem-se ao esforço do próprio grupo. Atualmente, não há vagas abertas para novos cooperados, mas lista de espera é grande. Espera-se que a ampliação do volume de recicláveis coletados faça crescer, também, o número de trabalhadores envolvidos. De acordo com dona Iracy, no entanto, não basta aumentar o volume da coleta: é preciso que isso aconteça de forma consciente. “O lixo que recebemos ainda apresenta um alto rejeito, a parte que não pode ser aproveitada. Por isso, é preciso investir, também, em educação ambiental, para que a população possa separar seu lixo do jeito certo, como deve ser, tornando nosso trabalho mais eficiente”, acrescenta a cooperada.

Lixo eletrônico
Com o crescimento e o desenvolvimento tecnológico, o consumo de bens duráveis, como computadores e smartphones, cresce a cada ano. Com isso, o descarte do lixo eletrônico também se torna um grande problema. De acordo com André Batalhão, os descartes eletrônicos são, na maioria das vezes, direcionados a países muito pobres, sendo boa parte deles africanos, sob a justificativa de servir para a educação digital. No entanto, uma parte importante desse lixo é descartada na travessia, em alto-mar, o que é extremamente prejudicial ao meio ambiente e à vida em geral, uma vez que tais materiais concentram substâncias químicas nocivas, inclusive, à saúde humana.

Em Ribeirão Preto, a população pode encaminhar o lixo eletrônico produzido a um ponto de coleta localizado na Secretaria do Meio Ambiente, que fica na Rua Cerqueira César, 1988. A população pode deixar seus descartes no local de segunda a sexta, das 8h às 12h e das 13h30 às 17h. No entanto, o container disponibilizado no local não aceita pilhas e lâmpadas. Conforme informou o atendimento da própria Secretaria, a Prefeitura não disponibiliza locais próprios para descarte desses materiais. Nesse caso, os ribeirãopretanos devem procurar postos de descarte em estabelecimentos privados.


Segunda-feira
Vila Tibério
City Ribeirão
Jardim Antártica
Jardim Macedo
Jardim Palma Travassos
Parte da Ribeirânia
(ao lado da Apae)

Terça-feira
Castelo Branco Novo
Jardim Primavera
Parque Bandeirantes
Leroy Merlin
Jardim Paulistano
Condomínio Genova e Veneza
Hospital Ribeirânia

Quarta-feira
Vila Virgínia
Monte Alegre
Vila Santana
Avenida Pio XII
Iguatemi
Ribeirânia

Quinta-feira
Lagoinha
Jardim São José
Jardim dos
Bancários
Manoel Penna
Condomínio
Genova e Veneza
Novo Shopping
Hospital Ribeirânia

Sexta-feira
Jardim Irajá
Santa Cruz
Jardim Itamarati
Avenida Castelo Branco
Jardim Recreio
Nova Ribeirânia

Sábado
Jardim Paulista e Centro

Exemplo bem-sucedido
Curitiba foi a primeira cidade a implantar a coleta seletiva no Brasil, tendo iniciado esse serviço em 1989. Desde 2007, o programa atinge 100% da cidade. Segundo dados do Ranking Brasil, em 2007, a capital paranaense produzia mais de 2 mil toneladas de lixo seco por dia, sendo que 550 toneladas eram separadas. Isso significa que 70% da população curitibana contribui com essa coleta seletiva. Com essa participação, cerca de 42 caminhões partem lotados para a reciclagem todos os dias.

Texto: Luiza Meirelles

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