A advocacia como um investimento das empresas

A advocacia como um investimento das empresas

A advocacia como aliada das empresas na sua função de gerir e agregar riquezas.

“As empresas prestam muito atenção ao custo de fazer alguma coisa. Deviam preocupar-se mais com os custos de não fazer nada” (Philip Kotler, Economista americano).

 

No atual cenário econômico, as empresas brasileiras estão convivendo com vários desafios que as expõem ao risco da descontinuidade, especialmente, no que tange aos aspectos jurídicos do negócio.

O ímpeto de um novo empreendimento sem o suporte de um plano de negócios com a avaliação prévia dos reflexos jurídicos que circundam a atividade empresarial pode comprometer a curto, médio, ou longo prazo uma ideia promissora ou a respectiva estratégia negocial com possibilidade de êxito.

A problemática ilustrada reflete os efeitos nefastos de uma atividade empresarial desemparada de uma consultoria jurídica preventiva, implicando, muitas vezes, na responsabilidade severa tanto na esfera civil como penal dos seus administradores e sócios, além da inviabilização do negócio.

Por muito tempo, a advocacia como um investimento encontrou resistência no paradigma de valores. O advogado, muitas vezes, era tido como um médico socorrista, acionado somente na ocorrência do infortúnio, e não de forma profilática.

Entretanto, cada vez mais observamos que a atuação das bancas não está se restringindo à administração do contencioso judicial. A área consultiva do Direito vem ressaltando a importância do advogado que proporciona, com sua expertise, uma maior segurança jurídica a qualquer tipo de negócio.

Uma reflexão sobre vantagens competitivas é fundamental para a continuidade dos negócios. Reduzir custos, atualmente, é muito mais do que cortar números, é saber identificar as deficiências e riscos do próprio negócio.

Urge, portanto, a mudança neste paradigma. E, para que esta mudança seja possível, se faz necessária à modernização da advocacia enquanto empresa de prestação de serviços jurídicos focada em determinado nicho de mercado, com gestores especializados e amparados com a expertise de profissionais de outras áreas, como por exemplo, as contábeis.

Entre alguns dos problemas enfrentados pelas empresas, causadores de empecilhos financeiros, perda da credibilidade, momentânea ou até mesmo perpétua, destacam-se as áreas:

Societária

Problemas: Sociedade irregular; Estrutura societária precária; Ato constitutivo omisso e/ou irregular; Planejamento societário ausente ou deficiente; Participação e responsabilidade pessoal dos sócios; Ausência de acordo de sócios; Imóvel inadequado; Descumprimento de obrigações sujeitas à fiscalização do Estado; Ausência de licenças.

Riscos: Sanções administrativas pecuniárias, administrativas de proibições e impedimentos do desenvolvimento da atividade; Responsabilização ilimitada dos sócios; Conflitos entre sócios; Impossibilidade de retirada de certidões; Impossibilidade de participação em procedimentos licitatórios; Dificuldade na obtenção de financiamentos; Sanções de natureza criminal.

Trabalhista

Problemas: Descumprimento de obrigações trabalhistas; Desconhecimento dos direitos e deveres dos funcionários, protocolos sanitários e falta de aconselhamento jurídico quanto ao trabalho remoto, em razão da covid-19, dentre outros.

Riscos: Ajuizamento de reclamações trabalhistas; gastos com custas processuais; Execuções, Penhoras e bloqueios de contas; Sanções administrativas pecuniárias; Dificuldade na obtenção de financiamentos; Dificuldade de captação e retenção de pessoal; Sanções de natureza criminal; Perda da credibilidade.

Tributária

Problemas: o negócio econômico fundado em um regime tributário inadequado, bem como, o desconhecimento das obrigações tributárias pela falta de um planejamento adequado à contabilidade da empresa, ocasionando um ônus maior.

Riscos: tributação mais elevada, além de sanções de natureza pecuniária, administrativa e criminal. Não obstante, podem acarretar no enfrentamento judicial de um processo executivo, impossibilidade de retirada de certidões, e em participar de procedimentos licitatórios, obtenções de financiamento, etc.

Civil/ Consumerista:

Problemas: descumprimento da legislação cível/consumerista.

Riscos: com a massificação da relação de consumo, problemas como o descumprimento da legislação, podem ocasionar uma dimensão exorbitada no que tange as demandas ajuizadas em desfavor da empresa em todo o país, com prejuízos financeiros em larga escala, além da perda de credibilidade.

Propriedade intelectual:

Problemas: ausência de registro e proteção de marcas, patentes, direitos autorais, desenhos industriais, programas de computadores, entre, outros, e/ou a insuficiência do devido acompanhamento dos respectivos registros nas instituições responsáveis.

Riscos: inviabilizar negócios embrionários promissores; ajuizamento de demandas.

Família e Sucessões

Nessa área, destaca-se o planejamento sucessório em empresas familiares, testamentos, heranças, protocolo familiar, de modo a viabilizar a sua continuidade, bem como, a segurança jurídica dos empresários, extirpando os riscos oriundos das disputas entre os herdeiros ou de sua inabilidade para gerir o patrimônio ou conduzir os negócios.

A constituição de uma holding familiar, por exemplo, permite que se atribuam regras de convivência mínimas, à medida em que os herdeiros são submetidos ao ambiente societário, estando obrigados a se comportar não mais como parentes, mas como sócios, respeitando as cláusulas de um contrato social e jungidos a resolverem seus conflitos pelas balizas do Direito Empresarial, frisa-se, de forma profissional.

Denota-se a importância do planejamento patrimonial não só como meio de garantir o máximo de eficiência, agilidade e segurança a sucessão familiar, visando à sua preservação, à celeridade de sua distribuição entre os herdeiros, porquanto, em conjunto, pode proporcionar uma maior economia com relação a impostos e despesas, e à continuidade das atividades empresariais por ele sustentadas.

Outro grande desafio é o uso da ética no âmbito das empresas. Hodiernamente, convivemos com denúncias de todos os tipos, fraudes, desvios de dinheiro, falta de transparência na administração das companhias, como por exemplo, nos casos da Enron americana e da italiana Parmalat.

A ética pode ser entendida como um conjunto de normas e valores que determinam a conduta das pessoas e que visam à consecução de objetivos úteis aos interesses dos indivíduos e das sociedades. Nas famílias, escolas, organizações não governamentais, governos, enfim, em todos os lugares nos deparamos com normas de conduta, imprescindíveis à harmonia e sobrevivência dos seres em todos os âmbitos da vida social.

No âmbito da empresa não é diferente. A ética deve ser um componente intrínseco no relacionamento entre o sócio (dono) e aqueles que a dirigem (administrador/gestor), com o intuito de otimizar o seu desempenho, facilitar o acesso ao capital e maximizar o retorno do capital de risco.

No mundo atual, em que a movimentação de ativos financeiros para investimentos atinge níveis elevados nos mercados globalizados, dúvidas quanto à transparência e confiabilidade das informações são altamente onerosas aos agentes.

Estudos realizados pela Transparency International[1] demonstram que a corrupção praticada no âmbito das empresas é um custo relevante, interferindo desfavoravelmente em sua capacidade de produção, nos preços e qualidade dos produtos e agregados econômicos.

Vislumbramos fraudes em escala mundial, seja nas sociedades familiares, em que há a concentração da propriedade e do controle da empresa nas mãos de uma mesma pessoa ou grupo de pessoas, como também nas organizações cuja propriedade está separada da gestão.

Nas sociedades familiares, ocorre muitas vezes o desvio de dinheiro para o enriquecimento pessoal de algum membro da família em detrimento de acionistas minoritários, fornecedores, trabalhadores, ora hipossuficientes ante a inoperância da Justiça em detectá-lo e combatê-lo.

Por outro lado, nas organizações onde há a divisão entre gestão e propriedade o problema não é exceção. Este modelo de gestão – o controlador (principal) nomeia uma diretoria profissional (agente) para gerir a firma – cria uma assimetria informacional entre as partes, o gestor possui em diversas situações, informações desconhecidas pelo proprietário.

Diante disso, e pelo fato de que na maioria das vezes os interesses das partes (principal e agente) serem distintos, abrem-se as portas para todo tipo de ação oportunista por parte do administrador, configurando assim o chamado conflito de agência[2].

Neste cenário, evidencia-se a importância de um departamento jurídico de compliance, palavra derivada do verbo em inglês “to comply”, que significa “cumprir, executar, satisfazer, realizar o que lhe foi imposto”, ou seja, compliance é estar em conformidade, é o dever de cumprir e fiscalizar o cumprimento de regulamentos internos e externos impostos às atividades da instituição.

De início, entre as atividades do profissional de compliance está a elaboração de um check-up da empresa: ramo de atuação e relações com consumidores, clientes, investidores e governo, em todas as suas esferas e; a elaboração um plano de integração a todas as áreas da empresa, utilizando-se de ferramentas e meios próprios específicos para cada tipo de mercado, due diligence, etc., de modo a minimizar riscos e de forma simultânea, aumentar a vantagem competividade dos seus negócios.

Buscando a excelência no serviço o seu departamento deve abrigar gestores multidisciplinares, com o conhecimento das minúcias legislativas que circundam a rotina da empresa.

Em resumo, o serviço do profissional compliance se constitui basicamente de medidas a serem tomadas para prevenir os riscos que os desvios de conduta, dos funcionários ou sócios, possam trazer à instituição.

A efetividade do compliance está diretamente relacionada à importância que é conferida aos padrões de ética corporativa na instituição.

O mundo sofreu mudanças profundas e rápidas nas últimas décadas, para não dizer nos últimos anos. Grande parte da crise atual, e das incertezas do futuro, está em nossa incapacidade de compreender estas mudanças, as novas tendências do mercado, e cada empresário entender efetivamente o seu próprio negócio.

A figura do advogado de “tribunal”, “artesanal”, “socorrista” e da postergação dos problemas deve dar lugar ao um profissional mais preparado, focado e especializado, para cada nicho de negócio dos seus clientes, atuando de forma profilática.

O futuro será particularmente implacável para com as empresas que não forem capazes de entender os aspectos essenciais de continuidade, aqui analisados, e de se inserirem na nova ordem econômica mundial. Porém, será altamente gratificante para aquelas que souberem se preparar para novos desafios, que interpretarem e se ajustarem às mudanças, e perseguirem a criação de vantagens competitivas.

A mudança deste paradigma representaria não só a modernização da profissão, elevando o patamar da advocacia a investimento (e não custo) imprescindível para as empresas, aumentando suas vantagens competitivas. O advogado como aliado, na sua meta de gerir e agregar riquezas.

Notas:

[1] Organização não governamental de escala mundial dedicada a combater a corrupção, congregando a sociedade civil, sertor privado e os governos, numa vasta coalizão global. Os estudos realizados por esta, podem ser obtidos no site: www.transparency.org/.

[2] O gestor possui objetivos pessoais, está sempre preocupado com sua riqueza pessoal, ao passo que o proprietário tem os de natureza sociais, ou seja, o valor e a riqueza da sociedade.

*Foto:  Free-Photos por Pixabay (Imagem ilustrativa).

 

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