A moderna gestão das empresas

A moderna gestão das empresas

“Seus mais insatisfeitos clientes são sua maior fonte de aprendizado” (Bill Gates)

A gestão das empresas vem revelando importantes avanços em sua forma de atuação, saindo de uma postura convencional de busca do lucro e rentabilidade para um enfoque preferencialmente voltado à riqueza dos acionistas.

 

No mundo globalizado, torna-se cada vez mais difícil às organizações viabilizar economicamente seus investimentos por meio de decisões direcionadas ao aumento de preços e de participação de mercado, conforme consagradas por longo tempo no passado. Os consumidores em economias abertas sacrificam impiedosamente os produtos caros, exigindo preços cada vez mais competitivos. O crescimento da competitividade ainda costuma exigir vultosos investimentos para ganhos adicionais de market share [1], avaliados muitas vezes como de difícil recuperação econômica.

O conceito de qualidade no mercado globalizado onde as empresas devem buscar vantagens competitivas, deixa de ter relação direta com a durabilidade do ativo, vinculando-se ao interesse despertado pelo produto e seu preço. A estratégia competitiva de qualidade é oferecer o produto que o consumidor deseja adquirir pelo preço que esteja disposto a pagar, sem maior vínculo com a qualidade material de seus componentes de fabricação.

A redução de despesas tendo como base o corte de valores monetários, outra medida adotada com ampla preferência, não introduz maior vantagem competitiva na nova ordem econômica, onde todas as empresas podem ter acesso e seguir o mesmo receituário de economia e gastos. A supremacia da empresa nesses ambientes competitivos encontra-se em descobrir suas ineficiências operacionais antes de seus rivais de mercado, atividade difícil e que dará o verdadeiro diferencial competitivo diante da concorrência.

Essa visualização da moderna gestão das empresas é totalmente incompatível com a velha economia.

A velha economia é aquela em que os modelos de negócios são muito tradicionais e para que cresçam é necessário injetar muito capital e até aceno político quando pretendem dominar um determinado setor do mercado. Essas empresas têm rotinas internas pouco dinâmicas e, quando alcançam reserva de mercado, permanecem no mesmo setor para sempre, imersas em um ambiente pouco competitivo, além da regulação e tributação excessivas, o que, consequentemente, faz com que os preços de produtos e serviços sejam altos e a qualidade, via de regra, seja baixa se comparada com outros países.

Contudo, a nova economia já é uma realidade, conforme vimos ao realçar o novel modelo de gestão empresarial. Estamos diante de uma sociedade que, cada vez mais rápido, depara-se com novas formas de produção e distribuição de serviços. Temos exemplos claros de como grandes empresas da tecnologia criaram grandes discussões jurídicas e sociais com suas entradas no mercado devido à disrupção que causaram no mercado como um todo, como UBER, AIRBNB, AMAZON, entre outras.

Neste contexto, podemos elencar os seus elementos, enquanto fontes de valor, da seguinte forma:

a) Propósito de mercado:

A abertura de mercado demonstrou, para inúmeros executivos, que os preços são estabelecidos pela interação de oferta e demanda dos agentes econômicos, e não unicamente do ponto de vista da empresa. É o mercado que avalia os investimentos empresariais, cabendo à unidade decisória a responsabilidade de ser eficiente em suas decisões, selecionando as melhores estratégias financeiras que adicionam riqueza aos acionistas.

b) Centralidade do cliente

Na nova economia, as pessoas tendem a consumir de forma consciente, contratando serviços e adquirindo produtos de marcas alinhadas aos seus valores pessoais. Desta forma, as empresas com maior vantagem competitiva são aquelas que investem em um atendimento de excelência, alinhado com os desejos pessoais do seu cliente. Até porque, não se vende hoje apenas um produto ou serviço, mas sim, a sua experiência, o seu valor agregado, perante os consumidores, cada vez mais exigentes e ávidos por novidades e produtos e serviços customizados.

c) Criação de demanda e valor

Hodiernamente, na era digital, as empresas e as ideias se desenvolvem a partir da busca pela solução de um problema evidente ou nem tão evidente assim. Neste cenário os empreendedores são mais proativos e tendem a criar demandas e fidelizar cada vez mais os seus consumidores e/ou clientes, por meio de operações mais humanizadas, mídias sociais como vitrine, melhor comodidade dos meios de pagamento, dentre outras medidas que proporcionem conforto e segurança a seu público.

A título de ilustração, cabe transcrever um pequeno trecho da palestra proferida pelo músico e empreendedor Bruce Dickinson [2], sobre essa temática:

"Odeio clientes. Porque clientes têm uma escolha e você como dono do negócio não quer que eles escolham a outra opção. Por isso eles precisam se tornar fãs".

O valor de uma empresa é medido pela sua capacidade em gerar benefícios econômicos de caixa no futuro, pelos retornos esperados de suas decisões financeiras e operacionais e não pelo seu desempenho passado ou tamanho do capital investido.

d) Falhas e flexibilidade: cultura experimental

Muitas vezes, a capacidade de planejar a oferta de um produto ou serviço no mercado, frisa-se, personalizado, não advém de tratados acadêmicos, e sim, por meio de validação perante o público consumidor, quanto a sua receptividade e aceitação.

Deste modo, a empresa deve realizar ajustes rápidos para que possa aproveitar as oportunidades e corrigir o percurso por meio de mecanismos de pivotagem [3] e MVP [4]. Não há guarida para qualquer aversão a riscos.

e) Ecossistema

Em poucas palavras, ecossistema significa o sistema onde se vive. É um termo que deriva das ciências biológicas.

Entretanto, é bastante utilizado no contexto empresarial para designar o conjunto de empresas nascentes e inovadoras que atuam em determinado local, por meio de interação com os hábitos de consumo existentes, com o auxilio de diversos agentes (aceleradoras, investidores, advogados, governos e entidades, incubadoras e etc.) em um cenário de riscos e incertezas.

Levando em consideração esses aspectos, os empreendedores não podem ficar refém das soluções propostas pelo legislativo, apesar de já temos avançado muito, inclusive com a promulgação da Lei de Liberdade Econômica [5] que tutela a garantia do livre exercício das atividades econômicas no nosso país. Há, portanto, a necessidade contínua de inovar, customizar produtos e serviços e ao mesmo tempo, descobrir ineficiências operacionais, conforme dito, culminando na ruptura da cultura tradicional de auferir lucros à meta de valor, nos termos expostos.

Convém lembrar que a globalização vem atuando de forma bastante acentuada sobre os mercados financeiros, resumindo-os praticamente a um único mercado mundial. Deste modo, os investidores são capazes, no ambiente globalizado, de mudar rapidamente os fluxos de seus capitais, procurando alternativas mais atraentes em qualquer parte do mundo. Ativos que não criam valor são rapidamente identificados pelos investidores globais, repercutindo sua desvalorização em todos os mercados.

Sob este viés, para fins de perpetuação no mercado é necessário eficiência as organizações, ou seja, a capacidade de agregar valor na sua hierarquia decisória. O lucro somente garante a continuidade de um empreendimento se conseguir, pelo menos, igualar-se ao custo de oportunidade [6] do capital investido.   

Uma nova era se apresenta: a de uma cultura aberta, experimental, interativa e horizontal, tendo como foco as diversas demandas do mercado e o intuito de melhorar a vida das pessoas, de forma conexa a realidade, e não em um passado ou tradição, perdido no tempo. 

*Foto:  Free-Photos por Pixabay (Imagem ilustrativa)

 

Notas:

[1] “Uma quota de mercado, também chamada de fatia de mercado, participação no mercado, porção no mercado e market share, designa a quantidade absoluta e relativa de mercado detida por uma organização. Sua medida, principalmente quantificada em termos percentuais, traduz a quantidade do mercado dominada por uma empresa.” CONTEÚDO aberto. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Quota_de_mercado. Capturado em 29/04/2022.

[2] BOURROUL, Marcela. "Você precisa transformar seus clientes em fãs". I. Revista época Negócios. Digital. Disponível em: https://epocanegocios.globo.com/Inspiracao/Carreira/noticia/2014/01/voce-precisa-transformar-seus-clientes-em-fas-diz-vocalista-do-iron-maiden.html#:~:text=Porque%20clientes%20t%C3%AAm%20uma%20escolha,porque%20tinham%20clientes%2C%20n%C3%A3o%20f%C3%A3s. Capturado em: 30/04/22.

[3] Pivotar é mudar a direção de um negócio mantendo a mesma base que já existia. O termo vem da expressão em inglês “pivot“, cujo significado em português é “girar”, “mover-se em torno do próprio eixo”, cuja operação é bastante comum de ser observada em startups.

[4] O Produto Mínimo Viável – ou Minimum Viable Product (MVP) – é a versão simplificada de um produto final de uma startup. A partir dela, o empreendedor vai oferecer o mínimo de funcionalidades com o objetivo de testar o encaixe do produto no mercado, por meio de vários testes e feedbacks de potenciais consumidores.

[5] BRASIL. Lei n. 13.874 de 20 de setembro de 2019. Institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica; estabelece garantias de livre mercado; altera as Leis nos 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), 6.404, de 15 de dezembro de 1976, 11.598, de 3 de dezembro de 2007, 12.682, de 9 de julho de 2012, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 10.522, de 19 de julho de 2002, 8.934, de 18 de novembro 1994, o Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946 e a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943; revoga a Lei Delegada nº 4, de 26 de setembro de 1962, a Lei nº 11.887, de 24 de dezembro de 2008, e dispositivos do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966; e dá outras providências.

[6] O custo de oportunidade representa o custo associado a uma determinada escolha medido em termos da melhor oportunidade perdida. Por outras palavras, o custo de oportunidade representa o valor que atribuímos à melhor alternativa de que prescindimos quando efetuamos a nossa escolha. 

 

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