
O ecossistema da honestidade intelectual
O primado da honradez intelectual enquanto método aplicado de resolução de problemas, em defesa da ciência, cidadania e da produtividade nas organizações.
“Aquele que diz a verdade e a defende presta um serviço aos seus leitores e ao seu tempo” (Mario Vargas Llosa)
A honestidade é um valor fundamental que envolve a prática de ser verdadeiro e transparente em ações e palavras. É uma virtude moral que se manifesta em várias áreas da vida, incluindo relações pessoais, profissionais e sociais.
É antes de tudo um ato de humildade relacionada ao autoconhecimento, ou seja, implica em reconhecer as próprias falhas, limitações e conquistas, sem distorcer a realidade.
Lado outro, a honestidade fortalece a confiança, melhora os relacionamentos e promove um ambiente de respeito mútuo.
O autoconhecimento é agregador e construtor de pontes; é visão sistêmica e holística refinada, é desdobramento e consequências. É o futuro no presente. Em resumo, é o autorrespeito para reconhecer limites.
Nesse compasso, a honestidade intelectual é um princípio que envolve a busca pela verdade e a disposição de reconhecer e aceitar ideias e argumentos com objetividade, mesmo que esses possam desafiar as nossas crenças ou interesses. Ela exige que uma pessoa seja transparente em suas intenções; evite plágio, dê crédito a fontes e esteja aberta a críticas e revisões.
No âmbito corporativo, você tem a coragem de admitir não saber como fazer uma tarefa? Dá créditos a uma estratégia aconselhada por um colega? Defende seus argumentos de forma racional e com evidências, de forma autônoma, ou é influenciado pela maioria? Ou, ainda, na ânsia de impressionar, você tem o discernimento quando está desviando do foco do projeto? Tem a honestidade de precificar corretamente os riscos de um produto/serviço ao cliente em detrimento da ganância pelos lucros/honorários?
A verdade[1] é um processo de construção do conhecimento em um mundo onde a profundidade perdeu espaço para a superficialidade.
Para isso, é preciso ter uma ancoragem profunda, ou seja, um sentido de propósito que não se perde em meio à superficialidade do cotidiano. Reconhecer suas carências e buscar uma formação complementar e autodirecionada diante das exigências do mercado de trabalho, ajuda os profissionais a se manterem atualizados e relevantes em um ambiente de trabalho dinâmico, sendo, portanto, uma vantagem competitiva.
A honestidade e a verdade, bebem da mesma fonte: o conhecimento. Devemos, portanto, abraçar o desconhecido, em busca do nosso aperfeiçoamento profissional.
Sob essa ordem de ideias, “ignorância tática” não significa negligenciar informações importantes; ao contrário, trata-se de filtrar estrategicamente o ruído para enfatizar o que realmente importa na organização.
O Nobel de Economia Herbert Simon[2] já alertava: “a riqueza de informação leva à pobreza de atenção.”
Líderes intelectualmente honestos admitem seus equívocos, utilizam-se os fatos, como premissas para tomadas de decisões com racionalidade, comunicam-se com transparência e promovem o pensamento crítico com eticidade entre os seus liderados.
Ao aceitar a incerteza e focar no essencial, líderes podem tomar decisões que conduzirão suas organizações à longevidade e sustentabilidade de longo prazo, como direcionar de valor, maximizando o seu intagível.
Doutra parte, a honradez intelectual é fundamental em ambientes acadêmicos, promovendo um espaço de aprendizado e compreensão mútua, na fronteira entre o conhecimento e ignorância.
Usar as aspas, atribuir a fonte das ideias, as inspirações, o raciocínio. Esses atos, fortalecem seu trabalho, mostram que o autor pesquisou, revisou a literatura e, principalmente, denotam sua honestidade intelectual e credibilidade.
A verdade deve ser como uma espada; que “rasga tudo”, especialmente os seus inimigos mais ferozes: o ego, a ideologia e o fanatismo, enquanto fruto incondicional da lógica.
No cotidiano, desafios complexos exigem esforço coletivo de pensamento, enriquecido por diálogo franco e honestidade intelectual. Sem responsabilidade e eficiência, o caos é inevitável.
Dessa forma, manter uma atitude crítica é o oxigênio da evolução e progresso científico contínuo de modo a semear a reciclagem de ideias e estratégias, sob uma perspectiva lógico-racional, como aferidor da busca pela verdade.
Partindo dessa premissa é fundamental promover uma cultura organizacional que valorize a transparência, a honestidade intelectual e a aprendizagem contínua. Isso significa encorajar a comunicação aberta e o debate sobre riscos, oportunidades, envolvimento em projetos, entre todos os membros de uma organização, demandando, em contrapartida, investimentos em capacitação e tecnologia.
A crença na razão, na virtude e no propósito como bases de uma vida plena devem ser os ancoradouros de cada pessoa, em todas as suas facetas: pessoal, profissional e como cidadão.
Pensar de forma crítica e independente é uma habilidade vital para navegar no mundo ora indiferente, vazio, e inóspito a razão, mergulhado por ideologias, algoritmos replicáveis, capazes de robotizar o indivíduo, alimentando, muitas vezes, ditaduras, sem olvidar da perpetuação da miséria material, intelectual e do prejuízo a produtividade das organizações.
*Foto: Free-Photos por Flickr (Imagem ilustrativa).
Notas
[1] A verdade tratada no texto é na sua acepção lata, ou seja, àquilo que é real, fidedigno e condiz com os fatos, a realidade ou os princípios estabelecidos. Ela representa a conformidade de uma afirmação, ideia ou crença com a realidade ou com os fatos observáveis, especialmente, no ambiente corporativo.
[2] Simon, Herbert A (1971). Designing Organizations for an Information-rich World. Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press. pp. 40-41. Archived from the original on 6 October 2020. Retrieved 28 October 2020. Traduzido do original: In an information-rich world, the wealth of information means a dearth of something else: a scarcity of whatever it is that information consumes. What information consumes is rather obvious: it consumes the attention of its recipients. Hence a wealth of information creates a poverty of attention and a need to allocate that attention efficiently among the overabundance of information sources that might consume it.
Referências Bibliográficas
SERTILLNAGES, Antonin-Dalmace. “A Vida Intelectual”. Roberto Mallet (Tradutor). Edição em português. Editora Kirion. Publicado em 24/01/19.
FEYNMAN, Richard. What Do You Care What Other People Think? Editora: W. W. Norton & Company. Publicado em 06/02/18.