Sobre gravatas, nós e ESG

Sobre gravatas, nós e ESG

 

“Isto é para os loucos. Os desajustados. Os rebeldes. Os criadores de caso. Os que são peças redondas nos buracos quadrados. Os que veem as coisas de forma diferente. Eles não gostam de regras. E eles não têm nenhum respeito pelo status quo. Você pode citá-los, discordar deles, glorificá-los ou difamá-los. Mas a única coisa que você não pode fazer é ignorá-los. Porque eles mudam as coisas. Eles empurram a raça humana para frente. Enquanto alguns os veem como loucos, nós vemos gênios. Porque as pessoas que são loucas o suficiente para achar que podem mudar o mundo são as que, de fato, mudam” (Texto do comercial “To the crazy ones” de uma famosa marca)

 

 

A ética pode ser entendida como um conjunto de normas e valores que determina a conduta das pessoas e que visa à consecução de objetivos úteis aos interesses dos indivíduos e das sociedades.

Nas famílias, escolas, organizações não governamentais, governos, enfim, deparamos com essa norma de conduta, imprescindível à harmonia e sobrevivência dos seres em todos os âmbitos da vida social.

Por sua vez, no âmbito corporativo não é diferente. A ética deve ser um componente intrínseco no relacionamento entre o sócio (dono) e aqueles que dirigem a empresa (administrador/gestor) com o intuito de aperfeiçoar o desempenho da empresa e facilitar o acesso ao capital e maximizar o retorno do capital de risco.

Neste sentido, em uma perspectiva macro, a governança corporativa é primordial ao sistema de gestão de empresas, porquanto tem o objetivo de sanar conflitos entre membros da organização, alinhar interesses, de forma ética, buscando a maximização de riquezas, melhor direcionamento de decisões, por meio de seus mecanismos de fiscalização e administração.

Não raramente, a família empresária é pautada por emoções e passionalidades, oriundos dos laços de parentesco e vínculos, de modo prejudicial à condução dos negócios.

A empresa deixou de ser um centro de distribuição de lucros para o controlador, que era uma figura onipotente. Hoje ela é uma parceria entre stakeholders, igualmente preocupada com suas funções social e econômica.

A liberdade da iniciativa econômica, força motriz do capitalismo, traz à luz a oportunidade de gerar valor para a sociedade por meio da criação de negócios que inovam, empregam, capacitam e fomentam o desenvolvimento profissional e bem-estar dos seus colaboradores e terceirizados.

Uma sociedade livre deve ter os seus próprios mecanismos naturais de solidariedade e cooperação, com senso de responsabilidade social.

As nossas mazelas sociais evidenciam a necessidade de um capitalismo mais solidário e responsável tendo como atores principais os empreendedores, como forma de criar inserção social, dignidade e mercados, em um círculo virtuoso de crescimento e sustentação econômica e social.

Hodiernamente, com a proliferação das mídias sociais e maior conexão da vida social não há mais a dicotomia entre construir um mundo mais sustentável ou ter bons resultados financeiros em uma empresa.

Neste contexto, a ESG sigla em inglês para “environmental, social and governance” (ambiental, social e governança, em português) deve ser um componente obrigatório no âmbito corporativo, assim, como o freio ABS, tido como diferencial no passado e hoje, indispensável por sua importância.

Não é apenas uma questão de marketing e sim de ação, por meio da consolidação de um processo de governança em todos os níveis da empresa, começando pelo conselho, com comitês e processos internos, até chegar ao RH e as terceirizadas.

A letra “S” da sigla – Social – concernente a nossa temática, abrange todos os stakeholders corporativos: acionistas, clientes, colaboradores, comunidade, concorrência, equipe envolvida em um projeto, fornecedores, terceirizados, gestores, mídia, governo, sindicatos e advogados.

Os benefícios de escala [1] decorrentes da adoção do ESG no âmbito das corporações são patentes enquanto gatekeepers do processo produtivo, agraciados pela lacuna representada pela ineficiência estatal na promoção do bem comum e consequente crise de identidade.

O advogado é peça imprescindível a este ecossistema de governança ética e social. Contudo, o ESG só avançará quando as bancas darem o exemplo, sob pena de serem taxadas as suas ações, como mera jogada de marketing.

Neste contexto, os seus núcleos de inteligência jurídica precisam ser consistentes e objetivas em estabelecer regras de operação e códigos de conduta e comunicar de forma assertiva o que esperam de seus integrantes quanto a ética nas relações internas e na interação com os principais stakeholders (clientes e parceiros).

Os colaboradores precisam de protagonismo, reciclagem e conhecer os valores que norteiam suas organizações. Isso requer esclarecimento, treinamento, prática e acompanhamento por líderes, para aperfeiçoamento contínuo do capital humano.

Portanto, boas práticas, somente serão repetidas e maximizadas, em grande escala, por meio de exemplos, seja de quem oferece os serviços de implementação de ESG, como também, do comando diretivo da empresa. Isso envolve a forma como a banca e a empresa são administradas e da estrutura de tomada de decisões, além da transparência sobre o que está sendo feito e sobre os resultados.

A adoção de canais claros e formais de comunicação, em todos os escalões, também se mostra imprescindível no processo de minimizar riscos. Investir na transparência e na fluidez das trocas de informação contribui para um ambiente mais seguro e menos vulnerável. Daí a importância do ESG, do compliance, acordo de sócios, política de proteção de dados e privacidade, dentre outros instrumentos oferecidos pela advocacia preventiva.

É necessária, ainda, uma governança da inovação. Estruturas de gestão engessadas, autoritárias e soberbas devem dar lugar a vários processos multifuncionais desde a geração de ideias até a introdução de novas soluções corporativas ao mercado.  

Para tanto é necessário o fornecimento de insumos para a sua colheita, quais sejam, a promoção de criatividade e disciplina, estímulo ao empreendedorismo, aceitação de riscos, incentivo ao trabalho em equipe, incentivo à aprendizagem e a mudança e também a facilitação de networking e comunicação com profissionais de outras áreas do conhecimento; em suma, requer um tipo especial de cultura organizacional, mais horizontal e menos vertical.

Em alguns casos, há escritórios que já abriram mão de uma estrutura própria por completo para se instalarem em espaços de coworking, e, deste modo, ficarem mais próximos de seus clientes e respectivos negócios. 

Há excesso de informação e pouco conhecimento aplicado. Este paradoxo, muitas vezes é explicado pela falta de customização dos serviços oferecidos no mercado.

As empresas e as bancas precisam trabalhar em conjunto. O advogado deve ir além da ciência jurídica, e avaliar com precisão o custo econômico de uma decisão judicial, bem como, dos riscos de êxito ou insucesso nas demandas, de modo a permitir as empresas provisionarem perdas, aperfeiçoando-se, deste modo, a sua gestão.  

Não há mais espaço para arrogância e egoísmo intelectual. O conhecimento não pode ficar parado: deve ser aplicado e compartilhado, de modo a gerar valor as empresas e profissionais, renovando-se o seu ciclo de riquezas.

Há, portanto, a necessidade de uma postura inovadora, criativa e flexível e menos burocrática e distante. A customização e elevação dos serviços jurídicos ao patamar de commodities é uma realidade da nova economia.

Não está aqui menosprezando o conhecimento técnico-jurídico, ora premissa para toda solução jurídica ofertada no mercado. Apenas argumentamos o fato de seu domínio isolado, destoar do mundo corporativo, porquanto o advogado contemporâneo é um gestor de conhecimento e solucionador de problemas, bem como, portfólio de commodities jurídicas, para monetização e ética aos negócios.

É necessário, portanto, desatar os nós das “gravatas mentais” da profissão. O novo mercado exige uma advocacia mais colaborativa e próxima e menos contenciosa, mais profilática e menos reacionária, e que seja descomplicada, ágil e inovadora.

 

 

Notas

[1] “Economia de escala é aquela que organiza o processo produtivo de maneira que se alcance a máxima utilização dos fatores produtivos envolvidos no processo, procurando como resultado baixos custos de produção e o incremento de bens e serviços. Ela ocorre quando a expansão da capacidade de produção de uma empresa ou indústria provoca um aumento na quantidade total produzida sem um aumento proporcional no custo de produção. Como resultado, o custo médio do produto tende a ser menor com o aumento da produção” CONTEÚDO aberto. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Economia de Escala.  Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Economia_de_escala. Capturado em 04/08/2021.     

*Foto:  Free-Photos por Pixabay (Imagem ilustrativa).

     

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