Admirável florescer

Admirável florescer

Em milhares de anos da história humana, gostos e opiniões sempre foram motivo de debate e, umas tantas vezes, razões de entreveros. Muito do que nos leva a discutir, especialmente em tempos eleitorais, está intimamente ligado ao que acreditamos e gostamos. É esta, inclusive, a razão que alimenta a proliferação exagerada das fake news: preferimos, descaradamente, compartilhar e passar adiante aquilo em que acreditamos, ou que gostaríamos que fosse verdade, e deixamos de lado o questionamento sobre a veracidade daquela informação.

Nossa percepção sobre o que nos apetece está no cerne, também, daquilo que consideramos belo, seja o que for: a aparência física de alguém, a arquitetura de uma construção, o layout de uma página, um artigo de decoração para a casa. 

Belo, segundo os dicionários, pode ter diversos significados: aquilo que produz uma viva impressão de deleite e admiração, algo de elevado valor moral, sublime, o que tem formas e proporções harmônicas e até o que desperta satisfação, emoção ou prazer específicos, de natureza estética.

Não adianta padronizar, embora, ao longo da história da humanidade, tenhamos tentado fazer isso. A beleza é algo tão subjetivo que a popular expressão “quem ama o feio, bonito lhe parece”, basicamente, é explicada por si só. Por que você acha alguém, ou algo, bonito? Muitas vezes, porque sim, e só.

Umberto Eco organizou dois livros sobre o assunto, que foram leituras obrigatórias na pós-graduação em História da Arte, que cursei há alguns anos. As obras têm títulos bem objetivos: História da Beleza e História da Feiura. Ambas reúnem ensaios sobre os conceitos de belo e feio desde a antiguidade clássica, em profunda reflexão e grande debate sobre definições construídas ao longo dos séculos. 

A mim, particularmente, as ideias de beleza e afeto sempre estiveram muito vinculadas à admiração. Não consigo achar belo, ou ter qualquer ligação afetiva com algo, ou alguém, que não admiro, pelo motivo que seja. É uma condição que se faz indispensável, dentro dos meus pensamentos. Mas há quem não ligue para isso e que tenha outros motivos para apreciar as belezas por aí.

Tento ter um olhar mais profundo e reflexivo a tudo aquilo com que me deparo diariamente. Não sou das pessoas mais calmas, nem das mais pacatas. Muito pelo contrário. Estou sempre correndo por aí, apressada, trabalhando insanamente e há quem diga que, com essa rotina, seja impossível que eu tenha algum tempo, por menor que seja, para prestar a atenção naquilo com que me deparo. De alguma maneira, consegui me forjar dessa maneira e estou, apesar de atribulada, sempre atenta.

É essa atenção que me fez, ao longo dos meus 55 anos, apreciar a beleza da primavera e do desabrochar das flores a cada estação. Não gosto de tudo isso só porque faço aniversário nessa época do ano. Gosto da primavera, porque, a cada ano, as flores nascem depois do frio inverno – que nem sempre é tão gelado em Ribeirão Preto. As cores de cada ramo aparecem como se estivessem livres, depois de um período de clausura. 

Admiro a eterna coragem de florescimento da primavera, especialmente em tempos tão difíceis e desesperançosos. É, certamente, esta admiração que me faz considerá-la a mais bela estação do ano. 

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