Alma leve

Alma leve

Não costumo compartilhar meus dramas e minhas incertezas. Não sei bem o motivo, mas, ao longo da vida, fui forjada a manter um comportamento mais introspectivo no que diz respeito às minhas questões pessoais. Profissionalmente, minha interação com os outros é mais comum, mas as questões de foro íntimo procuro resolver sozinha. Nunca fui uma pessoa de muitos amigos, sempre fui adepta dos “poucos e bons”, e, talvez por isso, eu leve a vida dessa maneira.

Muito do que carregamos em nossa história está conectado à nossa personalidade e cada um de nós encontra maneiras de conviver com as dores e as delícias do próprio eu. Desenvolver alguns métodos para minimizar os problemas e tentar controlar as situações mais dramáticas, internamente, foi algo que aprendi com o tempo, assim como cada um estabelece uma maneira de tocar a vida. 

Fato é que um dia não é igual ao outro, nem uma dificuldade tem a mesma dimensão que outra. Os problemas aparecem em cenários e circunstâncias diferentes e cabe a nós perceber a distinção e tomar atitudes que sejam condizentes com cada sofrimento. O remédio para a dor de estômago não cura a dor de garganta.

Nos últimos dias, tudo isso me trouxe questionamento e dúvida. Diante de um problema que não me deixava completamente segura sobre como resolver, questionei a mim mesma se deveria compartilhar com alguém, procurar uma opinião, tentar minimizar o drama. Há quem diga que o sofrimento dividido fica mais leve – os 100% de um se transformam em 50% para cada. 

Procuro ouvir minha intuição. Sempre apostei em minha percepção para tomar decisões e escolher alguns caminhos. Senti que nesses dias faltava calibrar meu radar, talvez em função do cansaço e do desgaste de ultimamente. Tempos difíceis, economia incerta e muitas questões em diversas frentes para resolver.

Quando decidi compartilhar minhas dúvidas mais recentes, por um momento me senti leve, mas a sensação foi logo atropelada por um misto de culpa e de arrependimento. Achei que não deveria repartir o que tanto me afligia, muito em função de considerar pesados todos esses assuntos que envolvem incertezas e inseguranças. 

Foi pouco tempo depois que precisei exercer o papel inverso. Ouvi e absorvi medos e angústias de outra pessoa, que também não estava muito confortável em partilhar. Fui capaz de ter discernimento para ajudar, talvez por ter o olhar de quem não estava imerso no problema em questão. Naquele momento, eu não tinha desconfianças ou agonias e, ainda que minhas dúvidas não tivessem sido respondidas, encontrei espaço para me ocupar com aquelas questões. Foi útil a mim, foi útil ao outro.

Para cada um de nós, nosso problema será sempre o maior do mundo e dividi-lo para tentar amenizar a dor é uma escolha nem sempre fácil, mas que deve ser tomada de coração aberto. Na pior das hipóteses, serão dois amigos perdidos juntos. Na melhor, serão duas almas mais leves. 

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