Das fronteiras que cruzamos

Das fronteiras que cruzamos

Às vésperas de mais um aniversário — no momento que você está lendo este texto, provavelmente eu já completei mais uma primavera, em 25 de setembro — é comum nos colocarmos muitos questionamentos. Nesse momento, vem à tona uma série de perguntas, daquelas bem existenciais, como para onde queremos direcionar nossa energia pelos próximos 12 meses? O prazo, aliás, como bem frisou Carlos Drummond de Andrade em sua poesia “Cortar o Tempo”, é suficiente para cansar qualquer ser humano que, à beira da exaustão, inicia mais um ciclo com a esperança renovada. Otimista convicta, creio que conseguiria ampliar a fatia do meu tempo em alguns meses extras, mas como isso não é possível, celebremos o início de mais uma etapa da jornada.

Em tese, a virada dos anos vai nos tornando mais experientes e, por isso, suavizando as perguntas e as respostas típicas desse período. Para mim, no entanto, isso não é uma verdade absoluta. Posso dizer que estou vivendo, atualmente, um dos momentos mais questionadores da minha vida. Isso porque a passagem do tempo não me fez perder, feliz e infelizmente, em proporções diferentes, o ímpeto típico dos inquietos e teimosos. Ainda me interessa cruzar fronteiras, conhecer países e falar outros idiomas.

Os amigos mais íntimos entendem, mas poucos apoiam essa vontade de desbravar o desconhecido. A maioria deles gostaria de me ver dedicada ao meu universo, intimamente ligado à própria Revide, que me acompanha diariamente por mais tempo do que os anos que vivi sem tê-la como projeto de vida. Imagino que, como espectadora de mim mesma, esse seria também o meu voto. Afinal, nada mais gostoso do que contar boas histórias, fazer aquilo que se gosta e ajudar o empresariado a conquistar seus objetivos.

No entanto, persiste em mim um ponto de interrogação. Será que permanecer na zona de conforto, por mais conhecida e cotidiana que ela seja, é o melhor que podemos fazer? O lado de lá da fronteira sempre possui um certo poder de atração. E o convite para uma nova viagem, mesmo que o destino pareça inóspito inicialmente, é uma oportunidade de explorar outras habilidades e utilizar os talentos conhecidos para finalidades diferentes das habituais. Para mim, embarcar em novos roteiros parece sempre interessante sob o aspecto do autoconhecimento, que entendo ser a razão de seguirmos adiante. Se o destino parece desafiador, os mais aventureiros ficam ainda mais tentados a confirmar a participação na viagem.

Mas a questão vem acompanhada de outras tantas dúvidas, como se vale ou não a pena tentar plantar boas sementes em outras searas, muitas vezes, mais interessadas no embate, no desgaste, quando o que me comove é a fraternidade. Esse sentimento reconheço frequentemente no discurso do Papa Francisco, uma referência para mim. Esse aspecto ficou ainda mais evidente em sua recentíssima visita a Cuba. O reconhecimento do próximo na condição de irmão é raridade na maioria dos âmbitos sociais da atualidade. Uma pena que as diferenças, muitas vezes meramente ideológicas, superem os objetivos comuns à humanidade, no sentido mais amplo da palavra. Ainda assim, prefiro aproveitar o momento, da virada de página do meu calendário pessoal, para renovar as esperanças e seguir em busca de cada desejo que me leve ao bem-estar.

Isabel de Farias
jornalista e empresária

“Quem teve a ideia de cortar
o tempo em fatias,
a que se deu o nome de ano,
foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança
fazendo-a funcionar no
limite da exaustão.
Doze meses dão para
qualquer ser humano
se cansar e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação
e tudo começa outra vez
com outro número e outra
vontade de acreditar
que daqui para adiante
vai ser diferente...”

Carlos Drummond de Andrade

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