Influência salutar

Influência salutar

Quem acompanha este espaço já sabe bem que passei mais da metade dos meus anos de vida convivendo com o empresariado ribeirãopretano. À frente da Revide, foram 28 anos de muito trabalho e grandes parcerias estabelecidas. Posso dizer que muitas dessas relações extrapolaram o ambiente profissional e se tornaram amizades respeitosas e carregadas de admiração da minha parte. Outra afirmação que posso fazer sem medo de errar é que sempre houve, assim como acontece no Brasil inteiro, uma relação de oposição entre a política e as empresas. Essa imagem negativa decorre, certamente, de uma promiscuidade histórica no Brasil, com a mistura ilegal de interesses públicos e privados. Essa é a origem da corrupção que ainda vigora em muitos órgão públicos.

Apesar disso, na teoria, nunca consegui definir concretamente o antagonismo entre esses mundos. Mesmo sem experiência política, imaginava que seria mais fácil para ambos se fosse estabelecida uma relação de parceria e colaboração. Os últimos meses, ao enfrentar o desafio de encarar a política com a proposta de desenvolver um trabalho diferenciado, foram bastante enriquecedores nesse sentido, especialmente porque tornaram ainda mais clara para mim a ideia de que esses personagens não jogam, ou não deveriam jogar, em times opostos.

Parece que não sou a única a pensar dessa maneira. Lendo o jornal Folha de S. Paulo no último domingo, me surpreendi com a entrevista do empresário Marcelo Odebrecht intitulada “Tentar influenciar o governo é obrigação”. O conteúdo mostra sem rodeios a opinião do presidente de um dos maiores grupos do país: “o empresário tem o papel de tentar influenciar o governo naquilo que acha correto e fazer crítica construtiva no que não está bom. Mas precisa também entender algumas concepções do governo. Não consigo influenciar, vou me ajustar”. Odebrecht defende que o posicionamento do empresariado é mais do que dever, uma obrigação, e que quando a postura tomada é legítima e transparente, não é um problema. “O que não pode é defender interesses ilegítimos”, argumenta o empresário. 

Essa relação, encarada por aqui com enorme desconfiança, sempre existiu e nunca deixará de existir. Nesse sentido, acredito que a melhor forma de construir uma espécie de influência  salutar éa, justamente, apontar os holofotes sobre ela, tornando o posicionamento de cada grupo político e de cada segmento privado conhecido e aberto, baseado em ideias e conceitos bem definidos. 

Em ano de eleição, a discussão se torna ainda mais pertinente. Tanto que está presente, de uma forma ou de outra, em outros veículos de comunicação da semana, como nas principais revistas nacionais. A Isto é, por exemplo, convida a essa reflexão ao pontuar as ideias do empresário Antônio Ermírio de Moraes, que faleceu no final de agosto. Um dos homens mais ricos e bem-sucedidos do Brasil, à frente do seu Grupo Votorantim, arriscou-se e percebeu rapidamente que não havia espaço para um homem de negócios na política, por mais bem intencionado que fosse. A Veja também colocou em destaque a trajetória do empresário, conhecido pela obsessão pelo trabalho e o desprezo pela ostentação. A morte de Antônio Ermírio de Moraes também não ficou de fora da pauta da Época. Nesta última, uma entrevista de Maria Alice Setubal — filha do empresário Olavo Setubal, dono do Itaú, e coordenadora do programa de governo de Marina Silva —, revela, ainda, que a desconfiança beira ao preconceito quando as palavras “política” e “empresa” encontram-se na mesma frase. 

Antes de misturar esses dois universos, é preciso mesmo propor uma reflexão sobre as definições mais essenciais do que é político e do que é empresarial e quais os objetivos de cada um. A partir daí tudo pode ser mais fácil se feito com clareza e de transparência.

Isabel de Farias
Secretária de Infraestrutura e Coordenadora 
da Limpeza Urbana de Ribeirão Preto

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