Meu caro Fabiano

Meu caro Fabiano

Fiquei comovida com sua atitude e incomodada com a falta de respeito quando não te deixaram falar. Tempos difíceis esses, em que argumentos se esvaem diante de vaias. Precisamos reconhecer que é necessário coragem para se posicionar diante de um cenário tão conturbado na política de Ribeirão Preto. A paralisação dos servidores públicos estampou uma necessidade urgente de reorganização pública municipal – seja no discurso político, seja na administração.

Vivemos em uma cidade cicatrizada. Afinal, o que foi a tal Operação Sevandija? Expôs feridas que chocaram os ribeirãopretanos. Ganhamos as páginas de jornais nacionais. Percebemos um modelo equivocado de se fazer política, de gerir, de administrar. Acordos promíscuos, relações incestuosas, trocas de favores, barganha. Um modelo que existe, saberá há quanto tempo, e que foi tido como o pilar principal de sustentação em anos anteriores. 

A política é a relação do homem com o homem, com a organização social, com o público e o privado. É o estabelecimento de regras, é o cumprimento de leis, mas é também o bom senso e a discussão de ideias. Quanto mais conheço sobre a máquina pública, quanto mais conheço sobre o outro, melhores podem ser as discussões para a solução dos mais variados problemas.

Você sabe que estive, por cerca de dois anos, como secretária municipal na Prefeitura de Ribeirão Preto. Conheço os números e sei do impacto que os gastos, encargos e folha salarial têm no orçamento. Sei que falta dinheiro para investimentos, que faltam recursos para os serviços públicos municipais. Mas também sei que, neste momento, não há quem queira pagar a conta. Sempre acreditei que medidas de austeridade, compartilhando as informações com os cidadãos, poderiam retornar Ribeirão Preto ao prumo.

Percebi, a duras penas, que é difícil lidar com a opinião pública, principalmente diante de uma sociedade cada dia mais intolerante e com sentimentos egoístas, em um cenário em que, o que importa, é o bem que cada um consegue para si mesmo.

Quando você se posicionou em favor do Plano de Demissão Voluntária (PDV), lembrei-me da medida tomada pela USP, em 2016, para redução dos gastos com a folha de pagamento. Seria tão errado assim propor? Foi corajoso de sua parte trazer essa ideia à tona. 

Sabe que fico muito incomodada com o tamanho do palanque político que a greve criou. Fiquei impressionada ao ver, em uma das últimas sessões, vereadores vestindo, literalmente, a camisa dos servidores. Isso não é, em hipótese alguma, errado. Eu diria que é exagerado. Todos os vereadores ali sabem, exatamente, qual o funcionamento da máquina pública? Conhecem os números? As medidas possíveis? As experiências de outras cidades? Têm a ampla noção da realidade do Brasil?

A política pode ser assustadora. Uma série de aspirantes a transformadores sociais que baseiam as ações em livros como as 48 Leis do Poder, uma bibliografia cruel sobre como chegar ao poder e mantê-lo, fazendo o que for necessário com os outros — e cabem aqui as atitudes mais cruéis possíveis.

Esquecemos da ação social, do pensamento de Max Weber, de que as ideias, crenças e valores são os principais catalisadores das mudanças sociais. Estamos nos perdendo em não utilizar essas ideias para o bem comum.

Fico com a impressão de que quem se aproveita do cenário não tem interesse em saber de nada profundamente. Essas pessoas querem o barulho, a desordem. Algumas podem querer até o caos em troca de favores políticos. Não demonstram vontade de construir, de entender e de compartilhar.

Sei que você está em um início de mandato, de vida pública, e já te adianto: esse não será seu último desafio, sua última dificuldade. A jornada está no começo, mas, se eu pudesse te fazer alguma sugestão, ela seria a transparência. Transparência nas ações, nos discursos e nas ideias. Fazer aquilo que é coerente com o que se propõe. A política pode ser grande, mas também pode se tornar um meio de vida para se locupletar com o dinheiro público e resolver o problema de amigos.

Um político jovem como você pode fazer toda a diferença nesse cenário de transição, com clareza nas ideias e em princípios bem fundamentados. Não deixe de defender o que você acredita, não deixe de defender suas ideias. O medo de sangrar em praça pública não pode ser o delineador das atitudes de alguém que quer, de fato, transformar nossa cidade. É difícil, é dolorido, mas é preciso coragem e isso você tem demonstrado. A jornada não vai ser fácil, mas pode ser transformadora. Boa sorte, Fabiano. 

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