A mídia e a política

A mídia e a política

Com ousadia, cuidado e ética, o jornalista é uma das grandes esperanças da nossa democracia.

Tenho dedicado meus últimos 27 anos ao jornalismo. Sei, e pude vivenciar, que a relação da mídia com o mundo político não é uma das mais tranquilas e cordatas. Diria até que é bem controvertida. Nos últimos três meses, depois de assumir a Secretaria da Infraestrutura e a Coordenadoria de Limpeza Pública, passei a vivenciar esta relação controversa de maneira mais permanente. A atividade política tem me mostrado como a versão do fato pode ser mais poderosa do que o fato em si. Uma versão: a mídia, os colunistas políticos especulam que serei candidata à prefeita em 2016 — uma eleição que vai acontecer daqui a três anos — e ignoram o fato real de que não sou filiada a nenhum partido político e de que não tenho vinculações partidárias. Estive na presidência da Fundação Feira do Livro, desde 2007 e, durante sete anos, também diziam que eu seria candidata. Assim, a especulação em torno de uma candidatura tão distante torna-se mais importante que o trabalho desenvolvido. O fato é este, a versão é a criação de uma candidatura. A minha posição e o meu depoimento não são levados em consideração.  

Tenho buscado explicações para este fenômeno. Os políticos estão vivendo um momento de muito desgaste. Justificativas para isso há muitas, como as promessas eleitorais não cumpridas, os jogos de cena para barganha de cargos, a insatisfação com os serviços públicos, enfim, tudo isso pode ser discutido. O que não compreendo é por que a palavra de uma pessoa, que acabou de entrar neste mundo, não tem validade se não existe, no meu histórico, na minha vida profissional, algo que justifique essa desconfiança? Não existe nenhuma proximidade na minha maneira de agir, na minha atuação, com este desgaste pelo qual passam os políticos. Não há o benefício da dúvida.

Meu amigo Maurilio Biagi me disse, recentemente, que desistiu de participar da política como vice de Alexandre Padilha porque não consegue falar algo que não pensa, dizer algo em que não acredita e que, para ele, a política não aceita gente assim. Acho que sou bem parecida com ele. Na última semana, li de novo uma matéria em que o princípio básico do jornalismo — ouvir as partes — não foi seguido. Tornei-me a interlocutora do governo de um dia para o outro apenas porque visitei a Câmara de Vereadores num momento em que a pauta é a relação da administração com os vereadores. Não fui procurada ou questionada sobre o assunto. Parece que a mídia quer definir a verdade. 

Para qualquer bom jornalista, entender seu papel, os interesses comerciais e políticos que permeaiam essas relações, é muito importante porque, neste jogo, ele pode ser apenas um peão. No tabuleiro da política, é necessário conhecer o papel de cada um, ter o mínimo de sensibilidade. Sempre acreditei que o bom jornalista é um contador de histórias —mas só sabe contar uma história aquele que sabe ouvi-la. O jornalista precisa entender que não pode ser o personagem principal, nem torcer para o conflito, como dono da verdade. Ser jornalista é apenas ouvir e contar o que ouviu. Parece óbvio e simples, mas é cada vez mais raro. 

Penso que a função de um repórter não pode se apequenar diante do gigantismo que é o mercado de mídia. Hoje, este profissional já não tem tempo para amadurecer e identificar com precisão as tentativas de manipulação, os interesses políticos, religiosos ou as vaidades. A pressa inerente ao jornalismo, da briga acirrada e diária pela notícia exclusiva ou da guerra pela audiência, faz com que esses contadores de histórias do dia a dia, muitas vezes, afastem-se da conduta ética e ofereçam ao público uma informação de má qualidade. O leitor comum busca uma imprensa de credibilidade em um momento em que a lógica do espetáculo e do entretenimento contamina os veículos de comunicação.Nós, jornalistas, trabalhamos para que a sociedade seja bem informada: é o direito dos cidadãos à informação que justifica nosso ofício. Mas está cada vez mais raro encontrar estes contadores de histórias imparciais, sem torcidas e sem verdades. Não isentos de opinião, que todos têm, mas livres do que não cabe no fato narrado, porque a ele não pertence. O terreno é minado, mas com ousadia, cuidado e ética o jornalista ainda é uma das grandes esperanças da nossa democracia.


Isabel de Farias
Secretária de Infraestrutura e Coordenadora da Limpeza Urbana de Ribeirão Preto.

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