
Nas dores do mundo
Nosso problema sempre parece ser maior que o dos outros, o maior do mundo. De uns tempos pra cá, passamos a ter muitas dores – ou elas sempre existiram e nós é que começamos a dar mais atenção a qualquer coisa não tão boa que apareça. Os consultórios médicos lotam, as buscas na internet se multiplicam e caminhamos à procura de soluções para problemas que nem sempre sabemos ao certo quais são.
Passamos a carregar na tinta no que diz respeito a nós mesmos. Momentos não tão agradáveis no trabalho se transformaram em estopim de demissões. Um descompasso nos sentimentos já é motivo para buscar remédios e acalmar a cabeça. Passamos a nos anestesiar diante das dificuldades — e do outro.
Em nosso protagonismo crescente, deixamos de olhar para o lado, para o sofrimento e para a dor do outro. Estamos on-line, respondemos mensagens o tempo todo, publicamos fotos, mas deixamos a essência do humano, da proximidade, do toque, da presença, mesmo que no silêncio. Falamos, mas deixamos de escutar. Deixamos também de apreciar a quietude perto de alguém. O tão falado “ombro amigo” passou a ser raro, e a sorte é daqueles que têm bons companheiros que ainda compreendem o sentido da expressão.
Lembrei de Carl Jung e uma frase que se tornou ainda mais popular nesses tempos de internet, compartilhada aos montes. “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.
Talvez poucos pensamentos descrevam tão bem o momento em que vivemos. Nos colocamos como centro das atenções, detentores dos maiores problemas do planeta Terra, por menores que sejam as nossas adversidades. Damos mais atenção a quem está longe quando estamos perto de alguém. Quantas vezes não interrompemos um almoço com algum amigo para atender ao telefone ou responder a uma mensagem? Quantas vezes não deixamos de olhar para quem está com a gente e escolhemos checar as redes sociais pela tela do celular? Quantas vezes conversamos com alguém pessoalmente, mas pouco depois esquecemos o assunto?
As dores do mundo parecem cada dia mais graves e mais intensas, mas precisam ser enfrentadas. Não dá para fazer isso por si só. É preciso ter e ser amigo. Estamos aqui para enfrentar as batalhas da vida, como seres humanos, sob o olhar e a companhia do outro.
Parece que perdemos o compasso da gentileza, desviamos o olhar do outro e da sua história. Na ânsia de nos satisfazer, ficamos distantes de quem poderia estar perto. Ficamos longe das almas humanas — nossa e do outro.
Fato é que, nesses tempos estranhos, perdemos o compasso da amizade e da proximidade, mas, como dizem, nunca é tarde para fazer os reparos necessários, corrigir a rota e retomar a viagem. Se você tem grandes amigos, que são intensas almas humanas, agradeça. E siga nessa estrada acompanhado.