Reinserção na prática

Reinserção na prática

Há certos assuntos sobre os quais, mesmo sem o conhecimento necessário, as pessoas fazem questão de manifestar sua opinião. E quanto mais complexo o tema, maior parece ser a disposição para se posicionar, postura nem sempre embasada em conhecimento. O sistema penitenciário brasileiro, suas condições precárias e sua capacidade de recuperar cidadãos, é um desses assuntos polêmicos. De um lado, uns defendem que a razão que levou a situação aonde ela se encontra hoje é de exclusiva responsabilidade do governo. De outro lado, os que acreditam que foram as escolhas dos próprios criminosos que os levaram a trilhar um destino inglório.

Mas, com este texto, gostaria de chamar a atenção para algumas informações que me fizeram refletir nos últimos tempos. Dados de 2012 mostram que a maioria dos presos brasileiros é formada por jovens homens de baixa escolaridade. Cerca de 30% dos presidiários têm entre 18 e 24 anos e, quando estendida para 34 anos, a porcentagem sobe para 75%. A mim, saber que boa parte dessas pessoas poderia engrossar a força de trabalho do país mobiliza e faz pensar em saídas exequíveis. Afinal, são jovens que, com uma dose de orientação e outro tanto de interesse, teriam tempo suficiente para agarrar uma segunda chance.

Essa crença norteou, 30 anos atrás, a criação da Fundação “Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel” (Funap), que busca recolocar a população carcerária paulista no mercado de trabalho. A experiência da instituição vem demonstrando bons resultados. Foi por isso que, como antecipei há poucas semanas, neste espaço, a Coordenadoria de Limpeza Urbana estabeleceu uma parceria com a Fundação, levando 46 presidiários do Centro de Progressão Penitenciária (CPP) de Jardinópolis a trabalhar em Ribeirão Preto. Esses homens já estão desempenhando suas novas funções: deixam o CPP às 7h para retornar às 17h, depois de se dedicarem à limpeza de ruas, avenidas, calçadas, parques praças e pequenos consertos.

A inserção desses cidadãos — tão jovens quanto a média etária verificada em todo o país — na força de trabalho municipal foi amplamente debatida internamente e, por isso, eu já esperava que a receptividade dos funcionários do município com os novos colaboradores fosse elevada. Mas os relatos que tenho escutado da equipe da Coordenadoria são ainda mais positivos: da parte dos servidores, ficou clara uma total consciência sobre a importância da reinserção social e uma enorme boa vontade em relação aos presidiários em busca de uma nova chance.

Do outro lado, esses homens parecem estar mesmo interessados na mudança: colocaram-se à disposição dos coordenadores para todos os serviços necessários, listaram habilidades e vêm demonstrando dedicação durante as horas de trabalho. Aqui, saliento que, muitas vezes, não temos ciência, pela distância entre realidades tão distintas, do quão latente é a falta de oportunidades pelo Brasil afora e como isso pode ser determinante na construção dos caminhos a seguir.

Os presidiários foram recebidos com o máximo de dignidade, materiais adequados para o desempenho de suas funções, camisetas de manga longa e bonés para aguentar as horas de exposição ao clima ribeirãopretano, entre outros itens possíveis graças à consciência, também, do empresariado da cidade. Faço questão de destacar, neste universo, o empresário Fernando Junqueira, da Perplan Empreendimentos e Urbanização, e Antônio Luiz Chaguri, atual superintendente da Unimed Ribeirão Preto.

Essa mão de obra já é utilizada, através de empresas contratadas pela Prefeitura, já parceiras da Funap, responsáveis pela manutenção do Cemitério da Saudade, pela limpeza de bocas de lobo de Ribeirão Preto e pelo Parque Curupira. A intenção é fazer com que a parceria da Prefeitura, por meio da Secretaria de Infraestrutura e da Coordenadoria de Limpeza Urbana, com a Funap cresça e seja fortalecida. Até o final deste ano, deve ser criada uma segunda equipe de 46 presidiários. Não posso negar minha satisfação quando vejo frutos os positivos de uma iniciativa como esta. Mais ainda me alegra quando comprovo que as crenças que trago comigo não são apenas minhas, mas compartilhadas por muitos. Espero, desta forma, contribuir para a mudança que quero ver no futuro.

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