Ribeirão, o meu lugar escolhido

Ribeirão, o meu lugar escolhido

Temos uma crença de que nós escolhemos um lugar para morar, mas eu acho que de maneira sorrateira e misteriosa somos escolhidos pelo lugar que nos acolheu para viver. De alguma maneira, o lugar vai tomando conta da nossa alma. Quando nos damos conta, tudo está em nós: o céu, o clima, as pessoas, os caminhos que percorremos todos os dias. Tudo vai se ajustando, é como aquela roupa conhecida que já tem o formato do nosso corpo. Tudo vai se moldando para que a vida siga no seu próprio ritmo. 

Cheguei aqui para cursar Jornalismo na Unaerp em 1982. Naquela época, a cidade tinha 300 mil habitantes, segundo o censo do IBGE de 1980. O município hoje tem 711.825 moradores, é a nona cidade mais populosa do país sem contar as capitais — no geral, é a 27ª e, no Estado, a sétima, incluindo a capital paulista, segundo a última projeção feita pelo IBGE em 2020. 

É muito bom assistir a esse crescimento no dia a dia. No caminho, um dia você percebe uma nova avenida, uma nova rua, um novo prédio. A paisagem vai mudando como uma dessas imagens de TV que vão passando rapidinho, na velocidade da tecnologia. 

Naquela época dos bancos da faculdade, eu já tinha a percepção dos colegas que estudavam comigo: na maioria, éramos migrantes, estávamos vindo estudar para, quem sabe, construir o nosso futuro aqui.  Mas essa já era a história da cidade, a sua vocação de acolher brasileiros de todos os lugares. Uma vila que foi fundada lá pelos idos de 1856 e que já recebia muitos mineiros que deixaram suas terras esgotadas pela mineração para buscar uma nova vida. 

Esta história é conhecida por todos. A terra roxa que seria boa para a agricultura, mas o que eu acompanhei de perto foram as histórias de vida de pessoas, aqueles meus colegas que também vieram buscar os sonhos de ter uma profissão. Aqui fiquei e construí meu trabalho, minha família e meus amigos. 

O que acho bom lembrar nas datas comemorativas é rememorar o que acontecia naquele momento, no mundo, no país e na cidade. Em 1982, o Brasil completava 18 anos sob o comando dos militares, período no qual a população só votava em cargos legislativos. O presidente João Figueiredo era o último general da ditadura militar, aquele que preferia o cheiro dos cavalos. 

Acontecimentos que me marcaram naquele ano: a morte de Elis Regina, a voz mais bonita da MPB, uma personalidade aguerrida que nos fazia querer ser rebelde como ela. Foi lançado o álbum que seria o mais vendido da história: Thriller, do Michael Jackson (mais de 104 milhões de cópias vendidas). A Madonna lançava o primeiro single de sua carreira: Everybody. E na literatura, o colombiano Gabriel Garcia Márquez ganhava o Nobel pelo conjunto da sua obra, que, entre outros livros, inclui o aclamado Cem Anos de Solidão.

Aqui, o prefeito era o Antônio Duarte Nogueira, o pai do atual prefeito. Desde então, acompanhei todas as eleições para a escolha de prefeitos e vereadores. Pude acompanhar de perto a publicação da nova constituinte municipal (até publicamos na íntegra em uma das edições da revista). 

Ter essa cidade como ponto de partida para o meu trabalho foi uma escolha generosa que a vida me proporcionou. Com todas as dificuldades, posso dizer que aqui é a melhor cidade do mundo, porque vivo nela e quero continuar aqui por muitos anos e ajudar a contar a história dessa gente que me acolheu tão bem há quase 40 anos. 

Podia fazer uma lista das coisas que gosto de fazer aqui: como ir à missa com meu amigo Edgard de Castro na nossa histórica e icônica Catedral (sempre um deleite para os olhos) e logo depois ir à Única, a esquina mais famosa da cidade, ouvir as histórias do querido Peninha, tomar aquele café e degustar o pão na chapa (isso é impagável). Ter como rotina acordar muito cedo para ver a cidade amanhecer, correr ainda no escuro pela Fiúsa, andar pelas ruas do centro, reconhecer os novos bairros pedalando na bike. São os pequenos deleites que Ribeirão Preto me proporciona que me fazem sentir parte da cidade com tudo que ela tem de bom. 

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