Uma questão de respeito e de planejamento

Uma questão de respeito e de planejamento

Quem já teve a oportunidade de fazer um passeio de bicicleta pela ciclofaixa, aos domingos, que liga os parques Curupira e Carlos Raya, sabe que a iniciativa é um sucesso. Eu tenho frequentado o lugar e venho percebendo que o público que aproveita o espaço exclusivo para pedalar cresce a cada final de semana. Na minha avaliação, dá para dizer que está se criando um entendimento de que a bicicleta pode mesmo ser um bom programa de lazer e, mais do que isso, um meio de transporte adequado para o dia a dia — para esta segunda conclusão, as pedaladas estão só começando, na verdade.

Em conversas com especialistas da área, tempos atrás, como com o professor André Lucirton, é preciso investir em uma série de fatores para que, finalmente, as pessoas sintam-se à vontade para utilizar as bikes no cotidiano. A primeira delas talvez seja a segurança, em suas mais variadas formas: a certeza de não ser abordado em roubos e a confiança de ser respeitado durante o caminho como personagem do trânsito.

Na última segunda-feira, li, no jornal Folha de S.Paulo, uma entrevista com o urbanista colombiano Ricardo Montezuma, especialista em questões de mobilidade. Montezuma, criador de uma ONG chamada Cidade Humana, estava no Brasil para participar do Congresso Internacional Cidades & Transportes, no Rio de Janeiro, realizado na Cidade das Artes, para onde se dirigiu, como é seu hábito, de bicicleta.

Algumas de suas visões me chamaram a atenção, como o fato de o brasileiro — como pessoas de muitas outras nacionalidades — não valorizar o que tem de bom. É o caso, por exemplo, dos corredores exclusivos para ônibus, ideia implementada primeiro em Curitiba, mas que se tornou objeto de interesse nacional apenas depois de ter sido adotada em Bogotá. As faixas exclusivas para ônibus são apenas uns dos ingredientes necessários para que a mobilidade urbana melhore.

Antes disso, de acordo com Montesuma, é preciso olhar para o pedestre, geralmente esquecido. Sem ativismo político, o mais frágil dos personagens do trânsito permanece do lado de fora da pauta quando este é o assunto principal. As próprias bicicletas, que possuem defensores ferrenhos, são incluídos na discussão com mais facilidade, o que não parece certo. Os veículos, sob a perspectiva das prioridades, deveriam vir depois nessa lista. Antes, ainda, estaria o transporte público, pensado para beneficiar o seu usuário, e não quem circula de carro pelas mesmas ruas e avenidas.

Na sequência, dá para, aí sim, pensar nos automóveis e companhia. Para Montesuma, há algumas dificuldades a serem superadas antes de mais nada: os políticos, que não tem vontade, liderança ou institucionalidade para fazer as mudanças necessárias; a falta de entendimento do cidadão sobre os desafios da mobilidade, o que o faz permanecer restrito ao pensamento individualista nesse sentido; e o pensamento comum entre os motoristas que, por alguma razão, acreditam que a velocidade que imprimem no ir e vir de carro é praticamente um direito adquirido — o que, obviamente, não é verdade; mais do que isso, é um risco, uma ameaça aos demais agentes do trânsito.

Para mim, fica claro que está justamente na mistura desses personagens — pedestres, bicicletas, motos, carros e ônibus — a única solução possível para a mobilidade urbana, especialmente nas grandes cidades. Nessa junção de agentes, é preciso acrescentar, no entanto, uma boa dose de respeito mútuo e de planejamento, criando, assim, as mínimas condições para um trânsito melhor.

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