Êxodo de cérebros: carência de gestão estratégica

Êxodo de cérebros: carência de gestão estratégica

Um país que negligencia a educação em todo o seu espectro de atuações, entre eles, mais especificamente o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, certamente, trata-se de um país que sempre estará a reboque e refém do atraso desenvolvimentista e da miséria social. Pior ainda, quando os gestores de um país como tal, desdenham de seus próprios recursos intelectuais, na figura de seus cientistas, jogando-os ao limbo e, ensejando com que os mesmos busquem desenvolver suas aptidões científicas em terras outras, certamente estes pseudos gestores, além de incompetentes, incorrem em crime de lesa-pátria.

Conforme já exaustivamente discutido e de pleno conhecimento da comunidade acadêmica e de alguns poucos leigos, a respeito da falência do nosso sistema acadêmico científico, a sociedade como um todo, pouco se interessa pelo que ocorre concretamente neste segmento tão fundamental para o nosso desenvolvimento econômico e bem-estar social, simplesmente pelo simples fato da falta de conhecimento. Apenas em momentos de crises mundial, nacional ou local, como agora ocorre, seja sob o ponto de vista econômico – recessão, ou pandêmico, ou ambos ao mesmo tempo, é que os cidadãos clamam pelos seus cientistas. 

Diante desta situação de descalabro, pela qual nosso país vive no atualmente em relação a ciência e tecnologia, embora saibamos que isto também é inerente ao somatório de inúmeros fatores ao longo do tempo, existe um panorama bastante preocupante em relação ao processo de desestabilização e quebra de continuidade em áreas fundamentais para a autonomia e soberania do desenvolvimento tecnológico do país, provocados pela saída de pessoas de alta qualificação para outros países (fuga/êxodo de cérebros).

Somente no ano passado (2020) houve um incremento de cerca de mais de 10,5%, em relação ao ano anterior, de profissionais técnicos de alta performance (cientistas, executivos, atletas, etc.), que buscaram a obtenção de vistos preferenciais em direção aos Estados Unidos, sendo considerado o maior patamar nos últimos dez anos, o que representa um acumulado de 40%. Nestes dois últimos anos (2019/20), a busca por este tipo de visto permanente (EB1 e EB2) aumentou cerca de 40% em relação ao biênio anterior (2017/18), enquanto, se compararmos com o biênio 2015/16 este incremento salta para 135%.

É preciso esclarecer que, estes números representam várias categorias de profissionais, não apenas especificamente aqueles relacionados a ciência e tecnologia, mas são pessoas que carregam em seus aportes um enorme leque de valores agregados, intelectualmente ou financeiramente, tais como grandes empresários e intelectuais, capitais tangíveis e intangíveis que poderiam ser investidos e/ou revertidos para o desenvolvimento e geração de empregos e tributos em nosso país.

Motivados pela descrença de mudanças a curto e médio prazo, além da real preocupação e percepção ante a violência no país, crises políticas e econômicas, inúmeras pessoas físicas e jurídicas têm preferido arribar e investir recursos em empresas no exterior.

Evidentemente, não restam dúvidas de que estamos tendo uma irreparável perda de cérebros (intelligence capital), justamente daqueles mais necessários ao desenvolvimento de nosso país. A maioria, cerca de metade deles, tem optado pelos Estados Unidos, porém uma grande parcela tem buscado países como Portugal, Canadá, Inglaterra e, inclusive países mais desenvolvidos dos Emirados Árabes e da China, nos quais os choques culturais são mais maiores.

Entretanto, neste contexto de saída para o exterior – tal como uma solução individual, considerando-se as piores expectativas em todos os sentidos para a pesquisa científica em nosso país, podemos apontar alguns pontos que podem minimizar estes problemas que possuem reflexos exponenciais, ensejando algumas alternativas de caráter coletivo mais favorável para o país.

Talvez, a primeira delas seria as universidades e instituições de pesquisas saírem de suas próprias clausuras e buscarem uma aproximação maior com o setor privado, integrando-se em todos os níveis da cadeia produtiva em busca de inovação e produção de bens e serviços, o que é incomum em nosso país. Tais procedimentos propiciariam maior produtividade acadêmica e maior valor agregado aos interesses das empresas, minimizando os investimentos por parte do erário, que nem sempre correspondem. 

Nesta sequência de raciocínio, há que se reduzir no país, a excessiva burocracia, herança do secular patrimonialismo, que foi instalada com o objetivo de cercear atos ilícitos por parte de uma enorme cadeia de interesses escusos, mas que hoje permeiam prejudicialmente todo os níveis hierárquicos dos diferentes níveis técnico-administrativo dos principais órgãos públicos financiadores de recursos para custeios dos projetos, provocando entraves em nosso sistema de identificação, captação e conservação de recursos intelectuais.   

Sucintamente e, ao final, porém, não menos importante, denota-se a questão da incompetência dos gestores públicos, em relação os financiamentos de projetos e capacitação dos recursos humanos no meio acadêmico científico em todos os níveis, pela ausência de um diagnóstico prospectivo, pela falta de um planejamento estratégico e uma implementação eficaz, somadas a inexistência de um efetivo sistema de regulação e controle destes escassos investimentos. Comprovadamente, nada disso existe, pois, editais e financiamentos de projetos, bolsas de pós-graduações e outras necessidades são abruptamente canceladas, suspensas ou cortadas, sem muitas explicações e justificativas, desestabilizando toda uma cadeia produtiva de trabalho nas instituições de ensino, pesquisa e extensão de nosso país.   

Imagem de Gerd Altmann por Pixabay.

 

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