ENSINAR A VIVER: os agridoces desafios de se construir um projeto de vida significativo com os alunos

ENSINAR A VIVER: os agridoces desafios de se construir um projeto de vida significativo com os alunos

GIOVANNA WRUBEL

 

É notável que, com o advento do documento orientador da BNCC relativo às mudanças do Novo Ensino Médio, a preocupação da comunidade escolar a respeito de como agregar, e até mesmo sistematizar questões relacionadas ao Projeto de Vida, seja em materiais didáticos ou em outras vivências escolares, ganhou ênfase.

Contudo, a abordagem dessa temática permeia, desde sempre, o cotidiano da interação professor-alunos em todos os níveis de ensino. Estudiosos clássicos da Educação, como John Dewey (1859-1952), já ressaltavam a importância de não haver dissociação entre a vida escolar e a vida geral dos educandos:

“[...] não deve haver nenhuma separação entre vida e educação. As crianças não estão num dado momento, sendo preparadas para a vida e, em outro, vivendo. Vida, em condições integrais e educação são o mesmo [...]”. (DEWEY, 1978, p.7).

Nesse contexto, observamos a consonância entre o pensamento de Dewey e as orientações da própria BNCC no sentido de se enfatizar o olhar integral do desenvolvimento do estudante: não apenas relacionado às suas competências técnicas, cognitivas e conteudísticas, mas também ao contexto sócio-histórico que exerce influência sobre seu aprendizado e às habilidades socioemocionais – que também podem (e devem/deveriam) ser aprendidas e desenvolvidas em ambiente escolar.

Na esteira desse movimento, observamos iniciativas vinculadas à Educação Socioemocional, que visam abordar o Projeto de Vida de maneira mais sistematizada com os estudantes, em livros didáticos específicos sobre a temática, por exemplo. Essa iniciativa é louvável, até mesmo no sentido de promover uma orientação aos docentes que nunca tiveram experiências práticas relacionadas à área. O cuidado com as emoções dos alunos no cotidiano escolar e o interesse por conhecê-los de maneira ampla e profunda, partindo de seus interesses, aspirações e afinidades, estimulando os processos de autoconhecimento desde o Ensino Fundamental, propiciam que esses alunos lidem melhor com os desafios que certamente surgirão em sua vida pessoal, acadêmica e, no futuro, profissional.

No entanto, esse deve ser um movimento que, em sua essência, aposte na transdisciplinaridade. Em seu livro Ensinar a Viver: manifesto para mudar a educação (2015), o grande pensador francês Edgar Morin retoma a importância do desenvolvimento do pensamento complexo com os alunos – aquele que evita a fragmentação e aposta em uma visão do saber que seja interligado:

“A etapa do Ensino Médio deveria ser a da junção dos conhecimentos, da fecundação da cultura geral, do reencontro entre a cultura das humanidades e a cultura científica, da fecundação recíproca do espírito científico e do espírito filosófico: o tempo da reflexividade sobre a ciência, sobre sua situação no mundo contemporâneo.  A literatura desempenharia aí um papel proeminente, pois ela é uma escola de vida. É na literatura que aprendemos a nos conhecer, a nos reconhecer, a reconhecer nossas paixões. É no romance que vemos os seres humanos em sua subjetividade e complexidade.” (MORIN, 2015, p. 124.)

Dessa forma, pensamos que a abordagem de projetos de vida nas escolas envolva nuances desafiadoras aos docentes e a toda comunidade escolar; porém, quando eles  são construídos levando-se em conta o ser humano em seu desenvolvimento integral, tornam-se essenciais para uma educação do futuro que se pretenda significativa, capaz de formar cidadãos críticos e que reconheçam a influência do papel de cada um no complexo cenário social em que vivemos.

Referências

 

DEWEY, John. Vida e educação. Tradução de Anísio Teixeira. 10. ed. São Paulo: Melhoramentos, 1978.

MORIN, Edgar. Ensinar a Viver: manifesto para mudar a educação. Porto Alegre: Sulina, 2015.

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