HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NA SALA DE AULA: o lúdico a favor da leitura

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NA SALA DE AULA: o lúdico a favor da leitura

De acordo com Scott Mcloud, as pinturas rupestres nas cavernas da França, mostrando etapas de uma caçada podem ser consideradas Histórias em Quadrinhos (HQs), assim como os hieróglifos egípcios, um dos mais antigos sistemas de escrita do mundo, e, ainda, os vitrais das igrejas medievais contando a via sacra de Jesus. As tentativas de representar os feitos dos homens, suas aventuras e sentimentos remontam aos primórdios da civilização.

Para alguns estudiosos, a hipótese de Scott Mcloud sobre a origem das HQs é controversa, merecendo ainda outras discussões. Entretanto, não se pode dizer o mesmo sobre a popularidade das HQs. Pesquisadores do assunto destacam que o desenvolvimento dos Quadrinhos até o formato atual caminha junto com o desenvolvimento da imprensa e, não por acaso, Joseph Pulitizer, considerado pai do jornalismo moderno, teve ligação indireta com isso. Podemos dizer que foi no seu jornal, The World, que a imprensa publicou a primeira tirinha em Quadrinhos, com o personagem Yellow Kid, menino de traços orientais vestido de amarelo.

Yellow Kid foi criado pelo cartunista Richard Felton Outcault, que também foi o primeiro a usar a fala em primeira pessoa e a integrar texto e o desenho. Até então, as falas eram ditas por um narrador, em terceira pessoa, como uma legenda, geralmente abaixo das imagens.

 

A partir da iniciativa de Outcault, o caminho foi aberto para que, em 1897, os autores Rudolph Dirks e Bud Fisher, com a série Os sobrinhos do Capitão, introduzissem o uso sistemático do balão da fala, logo se popularizando pelos outros autores e marcando definitivamente a produção de Quadrinhos pelo mundo, tornando as histórias mais dinâmicas, permitindo mais interlocutores nas cenas e aumentando enorme e definitivamente as possibilidades narrativas das HQs.

As histórias em quadrinhos mais famosas são aquelas que retratam a vida de super-heróis, eternizados na arte sequencial e transportados para a linguagem cinematográfica, ganhando projeção internacional e povoando o imaginário de leitores do mundo inteiro. Mas nem toda HQ fica restrita a narrar as peripécias de personagens dotados de superpoderes: artistas como Marjane Satrapi e Art Spiegelman utilizaram as histórias em quadrinhos para narrar suas histórias de vida. Persépolis, livro de Marjane Satrapi publicado em quatro volumes, narra a infância da escritora iraniana durante a Revolução Islâmica. Já o livro Maus, do americano de origem judia Art Spiegelman, conta a história de seus pais, sobreviventes dos campos de concentração de Auschwitz, durante a Segunda Guerra Mundial. Maus recebeu, em 1992, o primeiro prêmio Pulitzer destinado a um livro de história em quadrinhos.

É interessante observar que o balão da fala instantaneamente identifica uma HQ, como bem lembra Jean Pierre Conseuil, mas o quadrinho é o elemento fundamental que caracteriza e diferencia as HQs das demais linguagens. De acordo com o citado pesquisador, é o uso do quadrinho que torna as HQs diferenciadas,  sendo que “(...) a função do quadrinho nas HQS não é simplesmente emoldurar o desenho e dar unidade à cena”, mas mostrar que “(...) o conteúdo e a ordem de cada quadrinho indicam o caminho que o autor pretende dar à obra” (CORSEUIL, 2016).

Vale destacar que é justamente no espaço vazio, entre um quadrinho e outro, que o leitor exerce o seu protagonismo de maneira mais explícita, podendo intervir livremente no processo de produção de sentidos.

A meu ver, as HQs constituem importante recurso para o trabalho pedagógico com a leitura na sala de aula. Coloridas, divertidas e instigantes, as HQs situam-se no âmbito do discurso lúdico, promovendo possibilidades interessantes de atribuição de sentidos, tanto por parte dos estudantes quanto por parte do professor.

É através das HQs que muitas crianças encontram motivação para aprender a ler e a escrever, pois compreender o que está escrito dentro dos balões, os diferentes personagens e suas histórias, as onamatopéias, o colorido das imagens e a intertextualidade, dentre outros elementos, contribuem para que a leitura seja agradável e prazerosa, podendo acontecer também para além dos muros das escolas.

Alguns professores ainda têm preconceito com esse gênero textual, as HQs e deixam de explorar o seu potencial comunicativo e pedagógico. Conhecer o gênero e apropriar-se de conhecimentos específicos a ele relacionados poderá ajudá-los a romper com esses preconceitos. Levar para a sala de aula práticas pedagógicas com HQs, seja em forma de tirinha, charge ou cartum, contribui para que os estudantes conheçam e experimentem esse gênero, quer por meio da leitura, quer por meio da produção própria.

Desde 2007, entre os livros entregues pelo governo às escolas, encontram-se diversas obras em Quadrinhos. Os professores dispõem, portanto, de material rico e interessante para incentivar os estudantes à leitura. Para tanto, eles próprios precisam ler e (re) conhecer o valor desse gênero textual.

 

Prof.ª Elaine Assolini

Referências:

CONSEUIL, Jean Pierre. HQs; do mundo para a sala de aula. Jornal Mundo Jovem, nº 467-Junho de 2016.

McLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos. São Paulo: SP,  Makron Books, 1995.

VERGUEIRO, Waldomiro e RAMOS, Paulo (orgs). Quadrinhos na Educação. São Paulo: SP, Contexto, 2009.

RAMA, Angela e VERGUEIRO, Waldomiro (orgs). Como usar os quadrinhos em sala de aula. São Paulo: SP, Editora Contexto, 2010.

 

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