JORNALISMO E EDUCAÇÃO: CAMINHO PARA A MUDANÇA

JORNALISMO E EDUCAÇÃO: CAMINHO PARA A MUDANÇA

O jornalismo que expõe as problemáticas do cotidiano confronta os responsáveis por solucionar tais problemas, pleiteando mudanças. Há no discurso jornalístico sério – porque há também discursos frágeis – a característica social de transformação.

Escancarar a realidade como caminho para transformá-la, cobrando dos órgãos públicos a devida atenção e propondo caminhos para tal transformação: eis o jornalismo sério.

O jornalista, há que se dizer, é um sujeito e, como tal, formado por inconsciente e ideologias, na teoria de Pêcheux. A linguagem está atrelada a essas duas instâncias. Não pode, assim, esse sujeito jornalista ser a fonte do seu dizer, já que o dizer está atrelado a uma bagagem profunda que habita o inconsciente e é afetada diretamente pelas ideologias que o cercam.

O sujeito – jornalista ou não – tem a ilusão de que consegue escolher as palavras e é dono delas. Mas, para as teorias da Análise do Discurso, ilude-se esse sujeito, que tem os sentidos e o esquecimento colados às palavras.

“Quando nascemos os discursos já estão em processo e nós é que entramos nesse processo. Eles não se originam em nós”, escreve Orlandi (PAG 35). O tempo todo, achamos que o que falamos é único. E está aí a nossa sensação de sujeitos detentores da língua.

Esse é o sujeito jornalista e é também o sujeito leitor. O jornalismo reúne o sujeito falante e sujeito leitor, cada qual com sua bagagem de sentidos e linguagem. Que caminho faz a informação que é levada?

Não há meios, entre sujeitos tão complexos, de o jornalista levar ao leitor exatamente o que ele quer dizer. Orlandi defende que “não há sentido sem interpretação” e “diante de qualquer objeto simbólico, o homem é levado a interpretar colocando-se diante da questão: o que isto quer dizer?” (PAG 45).

O leitor irá aferir do que é informado suas próprias interpretações. Assim como fez o jornalista no momento em que apurou, selecionou e publicou as informações que julgou serem de interesse social.

O interesse social, aliás, deveria nortear as publicações jornalísticas. O que escrevo é de relevância para a sociedade? Seria a pergunta a se fazer. O jornalismo sério, como já foi dito, tem como veia pulsante o desejo de transformar a realidade.

A partir daí, entramos no ponto central deste artigo. De que forma pode o discurso jornalístico contribuir para a Educação? De que forma esse discurso pode auxiliar o professor em suas atividades?

Em junho de 2016, jornalistas que cobrem educação em todo Brasil lançaram a Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca).

O objetivo, conforme exposto por esses jornalistas, é apoiar os profissionais da imprensa que cobrem educação nos veículos de informação nacionais, pautados pela certeza de que esse tema prioritário no país ainda não tem o devido espaço na mídia. A associação critica também a falta de preparo dos jornalistas que cobrem educação.

Há, de fato, pouquíssimos profissionais especializados em educação quando se compara, por exemplo, os profissionais capacitados para cobrir economia, saúde e Justiça. Os jornalistas que cobrem educação – salvo exceções – são profissionais de cotidiano que recebem a pauta de explorar os resultados de uma ou outra avaliação da educação divulgada pelos órgãos governamentais.

Nos jornais de Ribeirão Preto, por exemplo, a educação é pauta quando há a divulgação dessas avaliações (como Prova Brasil, Saresp) ou quando a comunidade busca a solução para problemas pontuais como falta de vaga em creche e o atraso na chegada dos uniformes escolares para o ano que já se iniciou.

As reportagens, então  – e não é uma particularidade de Ribeirão Preto, mas de veículos nacionais – consistem em divulgar o problema: o que causa índices tão baixos dos alunos nas avaliações da educação, a falta de comprometimento da prefeitura em resolver  a falta de vagas em creches, os prazos para a entrega dos uniformes.

O jornalismo transformador, porém, não pode se pautar apenas pelo problema. É preciso, sim, mostrar o problema. Mas é preciso também levantar discussões em busca de soluções efetivas. Ouvir especialistas, não apenas para apontar as causas do problema. Mas para traçar os caminhos de transformação, participando na criação de políticas públicas.

Paulo Freire afirma que “o homem é um ser de relação, não só de contatos, como o animal. Não está apenas no mundo, mas com o mundo” (apud Ismar). A educação não é tema para ser exposto, mas para ser debatido, analisado e esmiuçado em pequenos pedaços de avaliação, para se chegar a um todo significativo e propositivo.

O jornalismo pode ajudar a transformar a educação, desde que aborde o tema com a complexidade que mora em sujeitos jornalistas, leitores, estudantes, professores: sujeitos, por si só.

Firma-se na América Latina um campo do conhecimento que trabalha a interpelação entre comunicação e educação: Educomunicação.

“Já se formou, conquistou autonomia e encontra-se em franco processo de consolidação um novo campo de intervenção social a que denominamos de inter-relação comunicação/educação. Tal inter-relação, ou simplesmente Educomunicação, não foi tomada tão somente como uma nova disciplina a ser acrescentada nos currículos escolares. Ao contrário, ela está inaugurando um novo paradigma discursivo transverso, constituído por conceitos transdisciplinares”, explica o professor Ismar de Oliveira Soares.

                No mundo pós-moderno, em que a explosão da internet reformula as relações, comunicação e educação não são mais instâncias segmentadas, com teorias paralelas – se é que um dia, de fato, o foram. Mas conhecimentos interligados. Essa interligação, levada em sala de aula, propõe um novo modelo de ensino que é latente.

                “Com um tempo próprio (o presente) e um espaço desterritorializado (o ecossistema virtual ou ciberespaço), a comunicação de massa mantém, como garantem os estudos de recepção, um pé na realidade, ainda que esta seja o universo fluido do imaginário e das paixões humanas. A comunicação de massa faz as pessoas sentirem-se, de alguma forma, cidadãs de um mundo em mutação”, também analisa o professor Ismar.

                Nesse contexto, o jornalismo superficial deixa de fazer sentido e de instigar sentidos. A informação superficial é disseminada pela internet, com nova roupagem e novos fatos a cada segundo. É preciso que o jornalismo que se propõe a cobrir educação vá além do superficial e efêmero. Escancare as raízes do problema, analise as repercussões e pense em mudanças.

                Dessa forma, a reportagem jornalística irá cobrar mudanças do poder público, instigar nos professores o questionamento e a reflexão e participar na criação de políticas públicas.

                O professor, como sujeito que também é, não pode ser retratado com simplismo. Bem como suas ações não se resumem a greves em busca de melhores salários, como a mídia, muitas vezes, quer fazer parecer. O professor e a função que ele exerce estão inseridos no contexto complexo em que a internet toma instâncias de realidade e a sala de aula adquire forma volúvel.

                “A educação “dura” na contradição permanência-mudança”, disse Paulo Freire.

                O discurso jornalístico, pautado na complexidade e na inter-relação entre comunicação e educação, pode ser capaz de redefinir os espaços da sala de aula e, de mãos dadas com o professor e o poder público ajudar a traçar os caminhos da mudança – tão necessária – que se faz no contexto escolar.

 

Daniela Penha

Elaine Assolini

Referências

Ismar de Oliveira Soares, Educomunicação: um campo de mediações, Comunicação & Educação, São Paulo, (19): 12 a 24, set./dez. 2000

Freire, Paulo. F934e Extensão ou comunicação?, 7ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983 93 p. (O Mundo, Hoje, v. 24)

ORLANDI, E. P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 2001

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