METODOLOGIAS ATIVAS DE ENSINO

METODOLOGIAS ATIVAS DE ENSINO

Rogério Dutra Bandos – Médico e mestre

em Otorrinolaringologia

(USP –  Ribeirão Preto)

Docente de medicina (UniFacef, Franca)

A arte de ensinar constitui um dos pilares mais importantes em qualquer sociedade. Desde as primeiras famílias e tribos, adquirir e transmitir o conhecimento sempre foi vital para o indivíduo e a coletividade frente aos seus desafios. Sem o esforço dos mestres e discípulos ao longo dos séculos, estaríamos ainda nos primórdios do saber.

Nas últimas décadas, a ciência e a tecnologia mudaram nossa forma de viver e de aprender. A quantidade de informações que nos chegam e influenciam nossa vida excedem cada vez mais nossa capacidade cerebral. A educação na era digital obrigou professores, muitos da era analógica, a se adaptarem para sobreviver neste admirável mundo novo.

A simples transmissão do conteúdo pelo professor, detentor do conhecimento, para uma plateia ouvinte e pouco participativa  ̶  metodologia transmissiva, expositiva, passiva ou tradicional de ensino  ̶  foi sendo questionada e substituída. Novas formas de ensino surgiram; mais atrativas, interativas, capazes de despertar a atenção, estimular a criatividade, evitar a dispersão e aproximar o educando ao educador.

Estes procedimentos, chamados metodologias ativas de ensino, são o conjunto de abordagens, estratégias e técnicas sistematizadas de ensino-aprendizagem, que envolvem o estudante no desenvolvimento de ações e discussões sobre o conteúdo a ser apreendido, muitas vezes através de atividades práticas, individuais ou coletivas. Como consequência deste envolvimento, há maior fixação, compreensão e aproveitamento dos conteúdos por parte do aluno, que passa ser o protagonista de seu aprendizado.  

Ao professor, cabe orientar, questionar, intermediar e facilitar este processo de aprendizagem. Nas metodologias ativas, seu papel de avaliador também pode mudar, pois não só o resultado final de provas interessa, mas também, a participação e a contribuição do estudante durante todas as etapas do processo, podem ser consideradas.

Apesar de ser um tema atual, não pode-se dizer que os métodos ativos de ensino sejam práticas recentes. Na China, cinco séculos antes de Cristo, Confúcio, que também era professor de matérias como história e filosofia, já sabia da importância da ação e da participação na assimilação do aprendizado, ao dizer: “O que ouço, esqueço. O que vejo, me lembro. O que faço, entendo.”

De acordo com a pirâmide de aprendizagem de Glasser , o mestre chinês estava certo. Estudos mostram as justificativas e vantagens da adoção de metodologias ativas. A integração teoria-prática, ou ação-reflexão, mostraram-se eficazes promotoras de aprendizagem, ao aumentar a retenção do conhecimento e a flexibilidade cognitiva, superando modelos mentais rígidos e irrefletidos.

Pouco depois de Confúcio, Sócrates, com seu método pedagógico peculiar, instigava os jovens na praça central de Atenas a pensar e questionar ao limite seus conhecimentos, contribuindo para as bases da educação compartilhada, crítico-reflexiva e libertadora. Nota-se, há muito tempo, a relação da educação participativa com a autonomia e a própria democracia. No entanto, isso nem sempre agradou a todos, e o filósofo foi condenado à morte, na sua nem tão democrática Grécia, acusado de perverter as ideias da juventude ateniense.

 A educação livre e reflexiva, historicamente, foi (e ainda é) vista em muitos locais como ameaça ao Status Quo. Fatores como pobreza, precariedade, violência, guerras, distâncias e dificuldade de acesso à informação, escravidão, vassalagem e todo tipo de exclusão social também atrasaram seu desenvolvimento. O ensino, na Europa medieval, passaria ainda pela escolástica (séculos IX a XVI)  ̶  ensino alinhado ao pensamento religioso  ̶ , até chegarmos ao Iluminismo, no século XVIII, trazendo mudanças sociais, políticas e culturais que influenciariam a educação.

A partir da segunda metade do século XIX, muitos teóricos da educação solidificaram as bases que sustentam e explicam a eficácia das metodologias ativas. Dentre eles, se destacam a aprendizagem experiencial de Dewey; o construtivismo de Piaget e o sócio-construtivismo de Vigostsky, que têm em comum o papel ativo do sujeito na criação e modificação de seu conhecimento; o cognitivismo, corrente de ensino que estuda os processos mentais da aprendizagem; conectivismo, que estuda a aprendizagem na era digital, e defende que o aprendizado ocorre de várias fontes e de forma integrada, formando uma rede de conexões. Estas, e outras evidências atuais, indicam ainda que o aprendizado ativo melhora não só a retenção e a compreensão, mas também o desenvolvimento de habilidades cognitivas de ordem superior.

Apoiadas nestes pilares, e contando cada vez mais com ferramentas tecnológicas, várias metodologias ativas de ensino surgiram e se consolidaram em todos os níveis educacionais, reinventando-se e gerando novas oportunidades de ensino, presencial ou à distância. Exemplos são os ambientes virtuais de aprendizagem (AVAs); treinamento com maquetes e simuladores (de materiais, construção, procedimentos como cirurgias, voos etc); jogos pedagógicos (gamificação do ensino); aplicativos interativos para computadores e smartphones e muitos outros recursos que surgem a cada dia, abrindo as escolas ao mundo.

Atualmente, e em geral, nas escolas brasileiras, a adoção de metodologias ativas é feita de várias formas, em várias graus e circunstâncias e de acordo com os recursos e condições de cada uma. Muitas apresentam um modelo híbrido, que associa estas metodologias para complementar o modelo tradicional de ensino.

Alguns exemplos de metodologias ativas:

• Aprendizagem baseado em problemas, ou PBL (Problem-Based-Learning) – surgida em 1969 no Canadá; muito adotado no Brasil e mundo afora nas novas faculdades médicas, com expansão gradual para outros cursos, contrapondo ou hibridizando-se em diferentes proporções com o modelo tradicional. O currículo é centrado na discussão de problemas apresentados em sessões tutoriais, em grupos de 8 a 12 alunos, supervisionados por um professor-tutor, que busca provocar a formulação de hipóteses, investigações, resoluções e conclusões sobre o problema, norteando e corrigindo-os quando necessário. Usualmente, uma unidade tutorial ocorre em duas sessões presenciais (abertura e fechamento do problema), separadas por um intervalo de poucos dias para o estudo do assunto.

• Aprendizado baseado em casos – de modo semelhante ao PBL, é fundamentado no trabalho em grupos tutoriais que discutem casos que se assemelham aos problemas. No entanto, a discussão é mais pré-estruturada e direcionada, sendo que usualmente há o estudo prévio do tema a ser abordado no casos. O professor-tutor tende a atuar de forma mais ativa, guiando a discussão com intervenções e perguntas que evitam discussões tangencias, para atingir os objetivos propostos.

• Aprendizado baseado em equipes – os estudantes, normalmente com o conhecimento prévio do assunto, são divididos em grupos (equipes) de cerca de 5 a 7 alunos em uma mesma sala, para responderem, inicialmente, de modo individual e depois em grupo, as questões propostas pelo professor, que as responderá com comentários (feedback) na mesma ocasião. A avaliação é baseada no rendimento individual e grupal.

• Aprendizagem baseada em projetos – propõe que os alunos investiguem e executem um projeto ou trabalho prático, com a “mão na massa”. Um bom exemplo disso é o movimento maker, corrente de ensino baseada no conceito de aprendizagem experiencial de Dewey.

• Aprendizagem por pares – após uma breve explicação do conteúdo, o professor aplica uma questão de múltipla escolha. Com 35% ou menos de acerto pela sala, o assunto é revisado pelo professor e discutido em grupos, para nova resposta. Entre 35-70% de acerto, os grupos são formados diretamente, para chegarem a uma nova resposta (acima de 70%), quando a questão é explicada.

Sala de aula invertida – inverte-se a lógica das aulas tradicionais expositivas, fornecendo aos estudantes o conteúdo de forma antecipada, para que estude por sua conta (ou em grupo), em casa ou outros ambientes, para depois, na sala de aula e com o conteúdo estudado, serem capazes de explorar e compreender melhor o conteúdo, tirar dúvidas e empregar metodologias ativas para soluções de problemas, projetos e questões.

Outros exemplos de metodologias ativas são o pensamento de design, inspirado no modo de  criar dos designers, e o coaching reverso, modalidade de instrução entre pares com idade e formações distintas, para ensinar e aprender uns com outros. Por sua natureza inovadora e flexível, há ainda muitas outras formas de metodologias ativas, bem como diferentes maneiras de aplicação das citadas, espalhadas pelas instituições de ensino mundo afora.

E em última instância, as metodologias ativas almejam preparar indivíduos para viver, contribuir e se adaptar a um mundo desafiador e em constante mudança. Tão importante como seus bons resultados de aprendizagem, é a inclusão do aluno, muitas vezes esquecido em algum canto da sala de aula na metodologia tradicional. Deste modo, o propósito das metodologias ativas vai ao encontro do desenvolvimento das competências fundamentais para os profissionais e cidadãos do século XXI, listadas por Tony Wagner, professor da Escola de Educação de Harvard, em 2016:

• senso crítico

• colaboração

• comunicação oral e escrita eficaz

• capacidade de solução de problemas

• iniciativa e empreendedorismo

• agilidade e adaptabilidade

• curiosidade e imaginação

• liderança por influência

• acesso e análise de informações

Tendo feito isso, a educação cumprirá sua missão de preparar pessoas para dar sua melhor contribuição à sociedade. Aos governantes e educadores, cabem trabalhar juntos para levar a bom ensino a todos, cientes que o estudante de hoje, neste mundo veloz, já é o cidadão de amanhã.

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