O EDUCANDO SÓ APRENDE SE QUISER: IMPLICAÇÕES TRADICIONALISTAS NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM DA LÍNGUA INGLESA

O EDUCANDO SÓ APRENDE SE QUISER: IMPLICAÇÕES TRADICIONALISTAS NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM DA LÍNGUA INGLESA

Introduzir o sujeito educando em universos intelectuais constituídos por objetos cujos sentidos não decorrem de uma relação com o mundo vivenciado é aparentemente o problema central da escola contemporânea. Neste contexto, o atual debate sobre como o processo de apropriação da língua inglesa é viabilizado em sala de aula, abre uma frutífera reflexão sobre como encontra-se pensada e estruturada a sociedade pós-moderna.

Referenciando as pesquisas do sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman em seu livro Tempos Líquidos (2007), a vigente sociedade estagna-se paradoxalmente em um volátil sistema móvel e inconstante de múltiplas relações socioculturais. O sujeito, neste tempo concebido pelo autor como “líquido”, assujeita-se aos caprichos dos mercados de mão de obra e de mercadorias que inspiram e promovem a competitividade, a divisão e o egocentrismo, em uma subversiva rede de conexões e desconexões neoliberais. A exposição do sujeito aos golpes políticos e ideológicos de uma sociedade estruturalmente “aberta” vulnerabiliza as suas escolhas em um sinistro jogo mercantil de incontáveis diferentes possibilidades que lhe são oferecidas, mas que por de trás são basicamente equivalentes.

A organização política em movimentação e a configuração educacional dos séculos XX e XXI caracterizam-se pelo prisma tecnológico da indústria da cultura. A introjeção dos diferentes “meios de comunicação” em massa, principalmente na pós modernidade, como a televisão, os computadores, telefones, tablets, dentre outros mecanismos ideológicos, encontra-se legitimada nas diversas formações discursivas em sala de aula como uma necessidade escolar. A imposição destes sistemas na sociedade vigente subverte o conceito de comunicação, impondo ao indivíduo um ideal de manipulação e alienação na realidade em seu cotidiano.

Quanto a esta realidade escolar, o pensamento formalista e sistematizante desenvolveu-se com toda a plenitude, suas estruturas polarizadas, pragmáticas, burocráticas e verticais evidenciam contradições estruturais de uma instituição que incide inevitavelmente em uma sociedade que demonstrou-se desenraizada e multifacetada.  O cenário, portanto, da educação pensada em uma lógica econômica é o reflexo do poder nas relações sociais pós modernas do imediatismo e do individualismo preconizados pela influência culturalista norte-americana e eurocêntrica de globalização, que por entre a liquides do mal-estar moderno, espalhou-se sem questionamento pela maioria dos governos mundiais, pelos serviços tecnológicos e pela mídia internacional.

O assujeitamento do sujeito pós moderno se dá, também, a partir de sua subordinação à cultura massificada, não somente em seu cotidiano trivial, como também, e o mais preocupante, no âmbito educacional. É necessário pensar em qual lugar o sujeito professor se inscreve enquanto elemento de importância na formação humana de seus alunos.

Mas o que o ensino do inglês tem a ver com tudo isso?

Cabe refletir por meio desta perspectiva que a ordem sócioinstitucional da escola contemporânea está atravessada ideologicamente por essas diversas formações discursivas mercantilistas, as quais estão naturalizadas e faladas por meio de uma língua ideologicamente autorizada, a língua inglesa.

É preciso que nos debrucemos sobre as implicações históricas na abordagem da linguagem, não de maneira linear, leviana, assim como o significante história é visto pelo senso comum, porém sim em relação à noção de descontínuo e de subjetividade inerentes ao movimento histórico e ideológico.  Por esse sentido, a ideia de sujeito como um centro, aquele consciente e dono de si, de seus dizeres, choca-se com o que entendemos como sociedade, e a noção cartesiana e positivista referenciada não mais define o sujeito sócio histórico cultural, o qual tomamos como discursivo. O sujeito vai além do empírico, assujeitado pelo simbólico, este é marcado pela pluralidade, heterogeneidade, por vozes que ecoam constantemente em suas formações discursivas, e a língua inglesa, por sua vez, também não escapa desta relação que perpassa por inúmeros outros dizeres.

De acordo com Vitor Henrique Paro (2007), a educação é a apropriação da cultura humana, não a culturalista, advinda de grandes corporações em massa, planejada mercadologicamente, mas sim, como produto histórico humano, entendido de forma ampla.

Ensinar inglês, queira ou não, é considerar que cada sujeito educando presente em sala de aula constitui-se com e através da letra, ou seja, do simbólico. Para tal, apropriar a língua como cultura humana ao longo do processo educacional, envolve conhecimentos, informações, valores, crenças, ciência, arte, filosofia, costumes, tudo que o homem produz em sua transcendência da natureza. Desta forma, é preciso levar em conta três elementos indissociáveis neste processo: educador, educando e conteúdo.

 Há uma iminente necessidade de romper a educação escolar enquanto um ensino instrumental, tecnicista e manipulador, conforme salientado, afinal é essa a instituição que incute a língua inglesa em suas grades curriculares, em seus livros didáticos, em suas salas derivadas por competências, idades e níveis de produção, é essa a escola que manipula o inglês como um mero objeto de consumo. Certamente há de se adotar outros parâmetros metodológicos, que considerem a condição de sujeito tanto do educador, quanto do educando, quero dizer, significa que o processo de apropriação da língua inglesa só fará sentido e produzirá sentidos em sala de aula se o sujeito educando participar como detentor de vontade, como autor. “O educando só aprende se quiser. Diante disso, o que há a fazer é buscar formas de levar o aluno a querer aprender.” (PARO, 2007)

 Não basta, portanto, o educador ser um explicador de conteúdos e o educando um receptor de informações em uma relação entre indivíduos que se comunicam com o simples propósito de passagem de conhecimentos de quem sabe para quem não sabe, espera-se que o processo educacional tome um sentido de reconfiguração das experiências formativas iniciais e de reconhecimento da necessidade de propiciar uma educação diferenciada e múltipla em todos os níveis, no que tange à liberdade do pensar e do agir do sujeito historicamente constituído.

“É o momento de perguntar como essas mudanças modificam o espectro de desafios que homens e mulheres encontram em seus objetivos individuais e portanto, obliquamente, como influenciam a maneira como estes tendem a viver suas vidas.” (BAUMAN, 2007)

Angélica Müller

Elaine Assolini

 

Referências:

 

BAUMAN, Z. Tempos Líquidos, Rio de Janeiro, Editora ZAHAR, 2007.

PARO, V. H. Educação como Exercício do poder: crítica ao senso comum em educação, Cortez Editora, 2007.

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