Professores leitores e professores não leitores

Professores leitores e professores não leitores

Mais de uma vez, já expressei minha preocupação com professores que ainda não aprenderam a gostar de ler. A meu ver, é inadmissível um professor que não tenha amor pelos livros e pela leitura.

Eu me pergunto: como despertar o amor das crianças pelas quais é responsável quando ele mesmo não aprendeu o quão prazerosa a leitura pode ser? E como ele próprio irá adquirir conhecimentos, elevar o seu nível de letramento ou experimentar as belezas de um texto literário, por exemplo?

Nas minhas pesquisas com professores que ainda não aprenderam a gostar de ler – a amar a leitura e os livros –, observei que esses sujeitos não tiveram na infância, na adolescência nem na idade adulta oportunidade de construírem relações amorosas, instigantes e sensíveis com o livro e a leitura. Em sua maioria são sujeitos que não gostam de ler desde criança, sendo que a escola agravou e intensificou esse desgosto, por meio de cobranças, provas, chamadas orais, dentre outras atividades que exigiam que o estudante provasse que leu o livro.

Entretanto, alguns desses sujeitos pesquisados tiveram, em algum momento de suas vidas, oportunidades para ressignificar sua relação com o livro e a leitura. Esse processo se deu por vários meios, oportunidades e recursos. Citarei alguns apenas: em um determinado caso, o professor aprendeu a gostar de ler após ser convidado para participar de uma gincana na escola dos filhos. Ele deveria responder a questões sobre conhecimentos gerais. E, assim, passou a ler jornal e revistas da atualidade; posteriormente, a bíblia, depois livros que constavam entre os mais vendidos e, por fim, livros de cunho literário. Observe, caro leitor, que a responsabilidade diante do filho, da escola e da atividade (participação em uma gincana escolar) instigou-o a começar a ler. A partir dessa experiência, o sujeito-professor em questão tomou gosto pela leitura, talvez porque tenha aprendido algo de interessante a respeito de conhecimentos gerais, talvez porque tenha se saído bem na gincana e agradado o filho, não sabemos ao certo, mas, com certeza, em algum momento a leitura e os conteúdos lidos tocaram a sua alma e o seu coração.

Outro exemplo é o de uma professora que, segundo o seu próprio depoimento, chegou a adoecer várias vezes, ao longo dos anos que frequentou os ensinos fundamental e médio. Não foi diferente no ensino superior, no curso de Licenciatura em Pedagogia. A ausência de leituras – ou a realização dessas com o objetivo específico de conseguir as notas mínimas para ser aprovada – promovia afastamento e desencanto com a faculdade. Entretanto, certa vez, foi convidada por uma professora de outro curso (Letras) para atuar em uma peça infantil que estava em processo de montagem para ser apresentada às crianças de uma creche. A docente que lhe fez o convite não sabia de sua relação negativa e distante com a leitura. A jovem professora aceitou, começou a decorar as falas referentes à sua personagem, interessou-se pelo texto (Pluft, o Fantasminha), comprou o livro e o leu integralmente. Esse foi o primeiro passo rumo à constituição de uma professora leitora, apaixonada pelo ato de ler, pelos livros, por livrarias e bibliotecas. Essa mudança só foi possível porque ela passou pela experiência de ressignificar sua relação com a leitura, a partir do convite de uma docente que nela acreditou, ou seja, partiu do pressuposto de que ela seria capaz de ler, memorizar e atuar na peça, realizando todas essas etapas amorosamente.

As experiências acima relatadas mostram-nos que o não leitor não está condenado pelo resto da vida a não gostar de ler, a viver eternamente longe dos livros e da leitura. Essa situação pode ser modificada na escola e na universidade.

Assim sendo, é imprescindível que, nos cursos de formação inicial, os estudantes de licenciatura, futuros professores, sejam instigados a desenvolver relações amorosas com a leitura, aprendendo a amá-la e valorizá-la. Nesse sentido, é importante que os docentes que ministram aulas em cursos de graduação – particularmente os de licenciatura, responsáveis pela formação de professores que irão atuar na educação básica – sejam leitores e consigam transmitir o seu amor pela leitura, contagiando os estudantes e despertando-lhes o interesse. Vale contar o trecho de um livro e pedir para os alunos irem atrás do final da história, é pertinente a leitura compartilhada, é bem-vinda a propaganda, a difusão, o marketing de um determinado livro, por exemplo.

Com trabalhos pedagógicos dessa natureza, o professor universitário poderá contribuir para que, na formação inicial, o estudante aprenda a ler, descubra as suas belezas e a importância da leitura. Tudo isso é de extrema relevância, posto que esse futuro professor irá atuar na educação infantil e no ensino fundamental, tendo, portanto, a responsabilidade de formar alunos leitores.

Defendo entusiasmadamente o trabalho com a formação inicial, pois entendo que, desde sempre, o futuro professor deve amar a leitura e os livros: só assim ele poderá sensibilizar e convidar os alunos a conhecer essa prática cultural.

Profa. Dra. Elaine Assolini

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