
O parlamento desvirtuado
O Brasil vive hoje o seu mais longo período democrático após vários intervalos de períodos ditatoriais e democráticos. É uma conquista a ser mantida e ampliada, com o aperfeiçoamento da democracia. Neste trabalho de consolidação, o Legislativo é fundamental para manter um dos três pilares do regime democrático.
Mas nas últimas campanhas eleitorais e nos últimos mandatos, o que se tem visto é uma desvirtualização do Legislativo. Os parlamentares têm se transformado em despachantes de prefeitos e vereadores na busca de verbas estaduais ou federais para os municípios, por meio de emendas parlamentares.
Ora, um parlamentar deve discursar (parlar), elaborar e votar leis e fiscalizar as ações do Executivo, nos três níveis de poder. A função mais importante é exatamente a de fiscalizar a execução orçamentária, a realização de obras, contratação de servidores etc.
Uma boa fiscalização ao menos reduziria a corrupção nos setores públicos. A redução provocaria economia de recursos para que mais obras fossem feitas e mais serviços prestados. Mas com o desvirtuamento de funções, os parlamentares ficam limitados a votar poucos projetos de autoria do Legislativo e pouco fiscalizam.
Enquanto se preocupam com a elaboração e liberação de emendas, o governo vai tocando sua vida com pouca cobrança. E a situação está ficando grave. Muitas vezes o parlamentar tem que negociar com o governo uma liberação de emenda e até apoia projetos que votaria contra.
Mas a gravidade está começando pela campanha eleitoral. Os candidatos – em sua quase totalidade – se oferecem para o eleitor como um homem que vai para Brasília ou São Paulo para trazer dinheiro para suas cidades, como se fosse essa a principal função de um parlamentar.
Os candidatos a deputado federal alardeiam que têm R$ 15 milhões em emendas por ano, cada um. Isso daria um total de R$ 60 milhões no mandato. Um valor considerável que passa a valer – no mínimo – como moeda de troca de apoio.
Um candidato com base eleitoral em Ilha Bela chega a dizer o cúmulo que levará para sua base eleitoral “um mar de recursos”. Há caminho mais curto para enfraquecer o Parlamento? Parece que não.
Enquanto isso, a discussão necessária, de uma revisão no pacto federativo, com melhor distribuição dos recursos públicos vai ficando para depois. Principalmente se os eleitores continuarem a votar nos candidatos “emendeiros”. Vale a pena refletir sobre isso.