Recuo envergonhado

Recuo envergonhado

Não que todos os vereadores devessem conhecer o artigo 57 da CF, mas bem que algum poderia conhecer e informar aos outros

Foi nítido no olhar dos vereadores a vergonha ao anular a sessão que rejeitou o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Não é para menos. Dos 19 presentes, exatamente 19 votaram contra o projeto. E contra uma determinação do artigo 57 da Constituição Federal do Brasil, que determina a aprovação do projeto como único resultado aceitável.

Não se espera que todos os vereadores, que juraram cumprir a Constituição no momento da posse, conheçam tão profundamente da Carta Magna a ponto de que vexames como o que aconteceu tenha sido produzido. Mas seria bom que um ou outro – e lá estão vários advogados – conhecesse o tal artigo, para alertar.

Ficou ruim. Apesar de o presidente da Câmara, Walter Gomes (PTB), dizer que a Câmara avançou (justamente quando recuou), a tradução não é bem essa. Ficou uma sensação de desconhecimento ou de desleixo com o projeto em votação. E a impressão de que os projetos não recebem a atenção que deveria.

Basta refletir um pouco para lembrar que o projeto estava na casa desde final de abril. Que duas audiências públicas foram realizadas. Que quase 500 emendas foram apresentadas pela maioria dos vereadores.

Ora, ora. Quem apresenta emenda precisa aprovar o projeto original para ver suas sugestões inseridas na lei. Mas mesmo quem assinou, na Comissão de Finanças, Orçamento, Fiscalização, Controle e Tributária, um parecer pela aprovação da LDO, votou contra o próprio documento que apoiou. Lamentável, para dizer o mínimo

E mesmo vereadores dedicados, que estudam as matérias analisadas pela Casa, não levantaram um dedo sequer para dizer que ali estava se criando uma anomalia jurídica.

Concordar ou discordar do artigo constitucional é outra história. Há promessa de cumprimento da Constituição. É uma aberração apenas chancelar o projeto? Pode ser. Mas por que todos decidiram discordar da norma ao mesmo tempo? Uma rebelião constitucional? Não parece.

É triste ver que vereadores de vários mandatos simplesmente votaram. Certamente por desconhecer completamente a norma, já que não fizeram qualquer referência à existência da proibição. Se conheciam, prevaricaram.

Mas é preciso seguir em frente. A Câmara assumiu ter errado e demonstrou interesse em consertar. Mas talvez fosse o caso de um pedido de desculpas coletivo.

Afinal de contas, os contribuintes pagam bem aos vereadores para que estes os representem. A Câmara custa aos contribuintes cerca de R$ 60 milhões por ano. Não dá para um erro tão evidente ser simplesmente ignorado. É preciso fazer bem mais que conceder homenagens e aprovar benefícios a servidores municipais sem qualquer questionamento. 

Por isso os contribuintes – e também eleitores – que pagam as contas públicas, merecem, sim, uma explicação plausível. Até para decidir se votam ou não nos atuais vereadores.

DÍVIDAS
Aliás, os vereadores devem já há algum tempo algumas respostas aos eleitores. Como explicar os motivos de continuarem com Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) por até cinco anos sem conclusão ou qualquer justificativa. Tem até CPI sem objeto que segue tramitando na casa. Uma vergonha.

CONTAS
Os vereadores também estão “empurrando com a barriga” a votação de parecer do Tribunal de Contas do Estado (TCE) que reprova as contas da prefeita Dárcy Vera (PSD) de 2012 e 2013. A intenção é deixar para depois da eleição e se livrar do desgaste eleitoral. Mas a Lei Orgânica do Município (LOM) prevê prazo de 180 dias para votação. Os pareceres chegaram à Casa em dezembro. Só não estão com prazos vencidos porque há quem defenda que o período de recesso é descontado. Logo, logo a não votação deve travar a pauta.

EMENDA
Ao invés de enfrentar o problema, alguns vereadores defendem a aprovação de uma emenda vergonhosa à LOM para empurrar a votação para depois das eleições de outubro. Parece inacreditável. É preciso notar que os políticos que temos por aqui não são muito diferentes dos que atuam em Brasília. Há alguns bons e muitos muito ruins.

INVESTIGAÇÃO ARQUIVADA
O Conselho de Ética da Câmara Municipal votou pelo arquivamento de denúncia contra a vereadora Viviane Alexandre (PSC), que foi acusada de usar seu gabinete na Câmara em benefício de uma ONG de proteção a animais, presidida por sua irmã. O relator da denúncia, Beto Cangussú (PT), disse não ter encontrado conduta a ser tipificada como improbidade administrativa.

DENÚNCIA COM GRAVAÇÃO
O pedido de cassação foi protocolado na Câmara pelo radialista Rodrigo Leone, depois de ele telefonar para o número de telefone que constava como da ONG no cartão do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) e ser atendido no gabinete. A ligação foi transmitida ao vivo pela emissora de rádio. Já no dia da denúncia, a vereadora negou qualquer utilização irregular e disse que o telefone figura na ficha por um engano do contador.

Foto: Ibraim Leão

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