Apocalipse "zumbi" na arte, ou réquiem para um gênio arrependido

Apocalipse "zumbi" na arte, ou réquiem para um gênio arrependido

A junção de arte e tecnologia é mais antiga do que imaginamos, e depende muito do que entendemos por “tecnologia”. Um violino e seu arco são tecnologias, bem como o piano, o pincel, o cinzel e até a voz e o corpo no canto e na dança, na medida em que se tornam ferramentas de irradiação de sentidos. O piano é uma tecnologia muito complexa, ao contrário do que se possa pensar, talvez mais do que o teremim.

O problema da junção entre tecnologia e arte é a quantidade de interferência de uma na outra. Imagine uma orquestra composta por instrumentos inteligentes que corrigissem erros e afinações em tempo real. Neste caso, quanto mais aumenta a técnica extra-humana, mais diminui a técnica humana, até chegar o momento em que qualquer sujeito fosse capaz de cantar e tocar de forma perfeita sem a aquisição da técnica corporal (vocal, manual etc.) necessária para a execução de uma obra complexa. Em níveis ainda mais extremos, podemos pensar em sinfonias, pinturas, esculturas etc. compostas e executadas por algoritmos e máquinas sem nenhuma participação humana. Por mais belos e sublimes que fossem, os efeitos seriam estranhos, difíceis de precisar.

Nada disso também é novidade. Em níveis diferentes, o aumento da técnica inumana e a diminuição da técnica humana já ocupa grande espaço na arte de entretenimento de nossos tempos, e lentamente essa transição nos acostuma a níveis mais artificiais de produção artística. Não seria impossível pensar que no futuro pessoas teriam interesse em assistir uma partida de futebol entre robôs que não erram. O problema é que o ser humano não precisaria mais jogar, nem seria desejável. Não precisaríamos mais tocar, aprender, estudar por décadas um instrumento musical. Ficaríamos fora do jogo da produção, até que um dia as máquinas aprendam também a apreciar a arte, talvez até criticá-la a níveis inumanos, e nós ficaríamos ali, diminutos, fora do jogo.

 

Foto: Miguel Á. Padriñán/ Pexels

 

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