Vinho e Chocolate - 1

Vinho e Chocolate - 1

O vinho e o chocolate, quando degustados por si só, podem se constituir em uma delícia única e rara, mas, quando associados, sua capacidade de harmonização rivaliza e se sobrepõe a de todos os outros alimentos. Vinhos e chocolates de alta qualidade carregam em si elegância e finesse capazes de extrapolar as barreiras frequentemente impostas por aromas e sabores convencionais. O aspecto mais relevante e bonito de sua harmonização é o fato de não seguirem regras definidas e, por isso mesmo, são um constante desafio à nossa percepção sensorial cognitiva, ao nos colocar em contato com o aparentemente novo e desconhecido, ampliando nossa capacidade de gerar prazeres gratificantes, inéditos e sem limites. Esta cadeia de eventos pode ser desencadeada pela interação dos aromas e sabores que são comuns aos dois elementos ou através de contrastes entre os mesmos — como teremos a oportunidade de ver ao longo de algumas semanas.
chocolate e vinha
Mas, antes, seria interessante conhecermos o que é o chocolate, desde sua origem até o momento em que derrete em nossas bocas e não em nossas mãos. Uvas, cacau e café são cultivados de maneira semelhante e requerem os mesmos cuidados para que suas qualidades naturais sejam preservadas. 
O cacaueiro (Theobroma cacao) é uma planta exclusivamente tropical que se desenvolve entre 20 graus ao norte e 20 graus ao sul do equador. Seu cultivo deve ser integrado com as florestas ao seu redor para seu completo desenvolvimento e defesa contra pragas. Os primeiros frutos aparecem em plantas de mais de cinco anos de idade até o máximo de 30 anos, sendo que cada planta adulta produz cerca de 12 frutos com 40 sementes cada, com colheita bianual, o que dá cerca de mil sementes por planta ao ano. São necessárias 500 sementes para a produção de 500 gramas de chocolate amargo. A título de curiosidade mais do que de valor prático, três variedades de plantas são identificadas: a Criollo; a Forastero, nativa da Amazônia, responsável 90% de toda produção mundial, inclusive no Brasil; e, finalmente, a Trinitario. 
A fermentação das sementes é, sem dúvida, o passo mais importante na transformação em chocolate. Durante essa fase, a adstringência (sensação de secura na mucosa bucal) é reduzida e os aromas e sabores naturais se desenvolvem. Em local semelhante aos nossos terreiros de café, as sementes são depositadas no solo ou estrados elevados de madeira e recobertas de folhas de bananeiras. O fermento natural, na presença do calor, transforma o açúcar em álcool que, por sua vez, na presença de bactérias, é transformado em ácido acético (vinagre), bem como ácido láctico, a partir do açúcar residual. Os ácidos gerados, bem como o álcool, “matam” as sementes do cacau, desenvolvendo novos e complexos compostos responsáveis pelos aromas e sabores típicos, bem como a redução da adstringência. Esse processo dura cerca de uma semana, e mais outro tanto para a secagem completa e total das sementes que, de preferência, deve ser realizada lentamente ao sol. No nosso próximo encontro, continuaremos seguindo a trilha do cacau ao chocolate em busca da harmonização com os vinhos. Até lá! Um bom final de semana para todos nós.

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