Faces Diabólicas da Desigualdade Humana (1)

Faces Diabólicas da Desigualdade Humana (1)

Ainda no século XXI, enormes são as disparidades econômicas, e outras desigualdades globais nas condições humanas, que tem persistido no mundo. Estudiosos e líderes políticos, debatendo as causas das mesmas, bem como, meios para solucioná-las, têm, do mesmo modo, encontrado dificuldade em alcançar os melhores métodos para reduzi-las. Problema tão antigo quanto a humanidade, já em Aristóteles se encontra que, em termos de desigualdade social, em cada cidade “as pessoas são divididas em três tipos: os muito ricos, os muito pobres e aqueles que se situam entre ambos”. Esta observação de Aristóteles resiste em cada lugar no mundo. Por sua vez, no século 18, Montesquieu discutiu as disparidades globais, observando que nações ricas tendem a se situar em latitudes temperadas enquanto nações pobres tendem a fazê-lo nos trópicos e semi-trópicos, constatações, estas, que o levaram a concluir que o clima deveria estar, de algum modo, associado com estas diferenças.

Rosseau, um dos primeiros filósofos que tentaram explicar a origem das desigualdades, em 1754, tentou responder a questão proposta pela Academia de Dijon, a saber, “Qual é a origem da desigualdade entre os homens, e é ela autorizada pela lei natural?”, argumentando que a desigualdade era quase negligenciável no estado da natureza quando as pessoas viviam sem quaisquer posses pessoais significativas. Na sequência, após as invenções da metalurgia e da agricultura, as quais levaram ao aparecimento da propriedade privada, e das desigualdades nas sociedades organizadas, é interessante notar que Rosseau traçou a origem das desigualdades às diferenças nas habilidades inatas das pessoas.

Adam Smith, explorando a natureza, e as causas, da riqueza das nações, chegou à conclusão, em 1776, de que os fatores principais responsáveis pelo desenvolvimento econômico foram as habilidades humanas, a especialização e a divisão do trabalho, bem como, a existência de mercados. Smith não estava particularmente interessado na lacuna entre ricos e pobres, ou com as desigualdades econômicas dentro e entre nações. Ele atribuiu o desenvolvimento econômico e o crescimento da riqueza às habilidades especiais e talentos, educação e instituições políticas e econômicas adequadas necessárias para serem usadas em oportunidades disponíveis.

Em 1798, Thomas Robert Malthus arguiu que “a pobreza e a miséria observáveis entre as classes mais pobres de pessoas em cada nação” são principalmente causadas pela tendência constante da população aumentar mais do que os meios de subsistência. Como consequência, verificações muito poderosas e sistemáticas são necessárias para manter o número de pessoas nivelado com os meios de subsistência. Ele ilustrou sua teoria do impacto do crescimento da população sobre a pobreza e miséria por intensas evidências de vários países do mundo.

Em 1835, Alexis de Tocqueville, impressionado pela igualdade geral das condições na América, escreveu que “esta igualdade das condições é o fato fundamental a partir do qual todas as outras parecem ser derivadas”. Ou seja, embora a igualdade geral das condições tivesse produzido democracia, e alimentado a unidade para a igualdade ainda mais completa, a revolução democrática não tinha resolvido a luta eterna entre o rico e o pobre. Por sua vez, Karl Marx e Friedrich Engels, em 1884, arguiram que a propriedade privada das fontes, ou recursos, produtivos era a causa básica das grandes disparidades econômicas e sociais, especialmente nas sociedades capitalistas. Entretanto, tal teoria tem sido testada extensivamente na prática desde a revolta bolchevique, em 1917, na Rússia, mas todas as tentativas para estabelecer sociedades comunistas têm fracassado, fato, este, que tem impossibilitado entender a utopia comunista em qualquer lugar do mundo.

Os argumentos e ideias presentes nas concepções clássicas, acima citadas, envolvem alguns aspectos do problema das disparidades globais nas condições humanas. A observação de Aristóteles sobre a existência das grandes disparidades econômicas, e sua significância política, é, atualmente, tão valida quanto o foi há mais que 2.000 anos atrás. Montesquieu explicou as disparidades globais pelo impacto das diferenças geográficas e climáticas sobre a natureza humana. Rosseau traçou a origem das desigualdades unicamente às diferenças nas habilidades inatas das pessoas. Adam Smith enfatizou a significância das instituições econômicas e políticas e da educação. Malthus arguiu que a pobreza é causalmente relacionada à pressão da população para aumentar mais rapidamente que os meios de subsistência. Tocqueville afirmou que a igualdade geral da condição pode levar a uma diminuição significativa das várias desigualdades, embora ela não possa remover todas elas. O fracasso da utopia comunista de Marx e Engels mostra que a maleabilidade da natureza humana não é ilimitada. Ou seja, as disparidades nas condições humanas, e sua persistência ao longo da trajetória da humanidade, têm implicações diabólicas em todas as arenas da vida. Algumas destas iremos tratar nas próximas semanas.

 

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