As faces diabólicas da desigualdade humana (XIV)

As faces diabólicas da desigualdade humana (XIV)

Os escores médios obtidos por estudantes de diferentes países em avaliações escolásticas se correlacionam fortemente com o Quociente de Inteligência (QI) médio da população das nações. Assim considerando, podemos entender que as avaliações que mensuram o conhecimento dos alunos podem representar a inteligência geral dos habitantes de um país. Também tem sido mostrado que o QI médio da população de vários países de correlacionam-se negativamente com as taxas de fome e subnutrição,  e positivamente com  os indicadores de sobrepeso e obesidade. 

Um estudo realizado recentemente por um de nossos pós-graduandos em Psicobiologia investigou as influências das habilidades cognitivas (HC) específicas, da inteligência geral (índice agregado das HC específicas) e da renda per capita sobre a alimentação e a nutrição da população dos estados brasileiros. Também se buscou analisar os impactos da boa qualidade alimentar e nutricional e da precoce escolarização dos estudantes sobre a variação da inteligência geral dos habitantes daqueles estados.

Para isso os escores médios dos estudantes, em diferentes áreas do conhecimento, no Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes (PISA), foram usados como medidas das HC específicas. Os impactos das HC específicas e da inteligência geral  foram estimados sobre dois conjuntos de indicadores alimentícios e nutricionais: o primeiro, denominado de índice de fome e subnutrição estadual (IFSE) e o segundo, designado índice de sobrenutrição estadual (ISE).

Os dados foram muito interessante e com grandes implicações para as políticas públicas nacionais. A inteligência geral e a renda per capita explicaram juntas, 77% e 71 % da variação do IFSE e do ISE nos estados, respectivamente, mas somente a inteligência geral ou as HC específicas explicaram sozinhas, e de forma estatisticamente significativa, a variação do IFSE e do ISE. A inteligência geral ou as HC específicas constituíram os fatores que explicaram as associações entre a renda per capita e as desigualdades alimentares e nutricionais, no Brasil.

O que constatamos? Quanto maiores as HC específicas ou a inteligência geral da população de um estado, menores as suas taxas de fome e subnutrição e maiores as suas porcentagens de sobrepeso e de obesidade. A existência de um fator geral que explica as altas correlações entre as HC específicas foi também confirmada. Ademais, as HC específicas possuem influências praticamente idênticas ao impacto da inteligência geral sobre os indicadores compostos de IFSE e de ISE.

Por sua vez, as porcentagens de crianças, de zero a três anos de idade, matriculadas em escolas, as taxas de aleitamento maternos e as porcentagens de pessoas com deficiência calórica explicaram, juntas, 78% da variabilidade da inteligência geral dos habitantes dos diferentes estados brasileiros. Portanto, a melhoria da qualidade nutricional de uma população, associada ao início precoce da escolarização, pode influenciar positivamente as HC dos habitantes de cada estado, logo do Brasil.

 

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