Teoria da inteligência através dos tempos (Parte 3)

Teoria da inteligência através dos tempos (Parte 3)

Uma teoria e um teste

O fim do século XIX e o início do século XX presenciaram outro intenso debate sobre o fenômeno da inteligência. Este debate começou da discussão sobre a importância relativa das tarefas simples ou complexas para a mensuração da inteligência iniciada a partir da publicação e divulgação, talvez, dos dois mais importantes trabalhos da história da pesquisa sobre inteligência: o trabalho de Spearman de 1904 e o trabalho de Binet e Simon publicado em 1905. Spearman desenvolveu uma teoria, enquanto Binet e Simon desenvolveram um teste. Tanto a teoria quanto o teste modelaram a pesquisa sobre a inteligência durante quase todo o século XX.

 

O início da mensuração da inteligência

Ao examinarmos a evolução das ciências podemos constatar que o problema da medida tem sido objeto de atenção dos cientistas desde os tempos antigos, de forma que quanto mais evoluída é uma ciência tanto mais cedo foi a sua preocupação com a mensuração. Por exemplo, a Física, e, sobretudo, a Astronomia, preocuparam-se desde a antiguidade em medir a distância entre as estrelas e também em estabelecer uma medida do tempo, seja em termos de dias, meses ou anos, ou mesmo em termos de frações do dia como as horas e os minutos. Conhecemos também a importância fundamental das medidas nos trabalhos de Galileu (1564-1642) e de Kepler (1571-1630) e suas influências no desenvolvimento da mecânica racional durante o renascimento. Porém, foi Laplace (1749-1827) o primeiro a estudar sistematicamente os problemas teóricos levantados pela aplicação das medidas nas ciências de sua época. A Química permaneceu numa situação quase de estagnação até o momento em que Lavoisier (1745-1794) introduziu a balança analítica e através dela a mensuração na Química. Indubitavelmente, foi este fato que permitiu uma rápida evolução das ciências químicas. É claro que a ciência das medidas denominada de Metrologia nasceu e se desenvolveu no contexto das ciências mais velhas, as quais, graças a ela, naturalmente se chamam exatas; mas posteriormente generalizou-se para as outras ciências, incluindo a Sociologia, Economia, Antropologia, Psicologia, etc... Certamente, foram estes marcantes desenvolvimentos ocorridos no domínio das ciências exatas que estimularam alguns pensadores ou pesquisadores a tentar generalizar a ideia da medida e a criação de instrumentos de mensuração para alguns fenômenos psicológicos, entre eles a inteligência. Assim, a mensuração da inteligência tem uma história recente (apenas dois séculos).

 

 

Francis Galton (1822-1911)

Talvez a qualidade mais conhecida de Galton tenha sido sua inclinação obsessiva pela quantificação e esta acoplada com a forte influência da teoria da evolução proposta por seu primo Charles Darwin (1809-1882), acabaram resultando numa teoria da inteligência como sendo hereditária e em sua missão durante toda a vida para mensurar a habilidade intelectual humana.  Assim, Galton excitado com o penetrante tópico da mensuração da inteligência, acreditava que ao redor dela todas as tentativas para definir o constructo, bem como as discussões da influência relativa da genética e do ambiente seriam resolvidas.  Ele acreditava que os dados somente entrariam para a mente humana através dos sentidos. Para ele, o nível de inteligência de um indivíduo deveria ser diretamente proporcional à sua acuidade sensorial, uma constelação de características hereditárias. Portanto, na concepção de Galton, a inteligência deveria ser unicamente hereditária.

Como um produto natural desta conclusão e de sua fixação pela mensuração, Galton, primeiramente procurou estudar a ocorrência de eminência (como um indicador de gênios) nas crianças de pais eminentes quando comparadas à frequência de eminência em crianças de pessoas leigas. Na verdade, Galton foi o primeiro a usar a frase "natureza e criação" para descrever pontos de vistas opostos no debate sobre as origens da inteligência. Galton admitiu, todavia, que qualquer predisposição genética não era uma causa suficiente da eminência e que a motivação era a variável que ele acreditava mediar a relação genética-eminência.

Outra implicação da inteligência como sendo produto da informação sensorial, de acordo com Galton, era que a habilidade intelectual de um indivíduo poderia ser avaliada por meio de testes sensoriais. Pensando assim, Galton construiu uma bateria de tais testes e também instrumentos para a sua administração em seu "Laboratório Antropométrico", em 1884.  Neste Laboratório, Galton fez várias medidas das acuidades sensoriais, as quais entendiam como testes de inteligência, bem como de outras características fisiológicas (deste modo ele poderia estudar as diferenças individuais).   Em seu livro "Hereditary Genius" há menção de vários estudos sobre as diferenças individuais de inteligência e abriu o caminho para os testes mentais. A crença de Galton na hereditariedade da inteligência fomentou o seu desejo aristocrático de controlar o sistema de seleção humana através da eugenia. Se as crianças de indivíduos altamente realizados fossem provavelmente mais inteligentes do que as outras crianças, Galton concluiu, então, que os governantes deveriam materialmente encorajar o eminente a procriar um com o outro na expectativa de causar uma proliferação de indivíduos inteligentes na espécie.

A plataforma eugênica de Galton foi posteriormente mal interpretada como suportando a retórica de genocídio de vários grupos racistas, incluindo o partido Nazista, da Alemanha, na segunda Guerra Mundial. Isto, talvez, tenha contribuído para que ele fosse, até recentemente, difamado ou, pelo menos, subestimado nos anais da psicologia. Embora a Antropometria de Galton tenha sido provada inválida, seu trabalho espalhou uma era de testagem mental na psicologia que continua intensa até aos dias de hoje. Além disso, Galton fez inúmeras e profundas contribuições na área de métodos de pesquisa e em estatística, incluindo os conceitos de correlação e regressão em direção a média, os estudos sobre gêmeos, os estudos de adoção, o grupo controle, o método de associação de palavras e o questionário.

 

James McKeen Cattell (1860-1944)

Por ironia do destino, foi o trabalho de um dos mais fervorosos discípulos de Galton, James Cattell que, tanto popularizou as ideias de Galton sobre a inteligência, antropometria e eugenia na América, quanto as desacreditou na comunidade cientifica. Cattell, o primeiro americano a receber o grau de doutor sob a orientação de Wilhelm Wundt (o fundador do primeiro laboratório de psicologia experimental, em Leipzig, Alemanha, no ano de 1879), procurou Galton devido ao interesse mútuo na mensuração objetiva das diferenças individuais. Após estudar, durante dois anos, com Galton em Cambridge, Cattell retornou à América e a um posto de professor na Universisity of Pennsylvania,Philadelphia.

Cattell imediatamente fundou um laboratório de psicologia (o primeiro para estudantes de graduação) e criou treinamentos e programas de pesquisa baseados em seu conjunto de "testes mentais e mensuração" (um termo que Cattell cunhou).  Cattell tinha essencialmente integrado as medidas de acuidade sensorial de Galton com os métodos psicofísicos de Wundt, com o propósito de desenvolver uma bateria de testes antropométricos mentais de inteligência, os quais acreditavam poderiam ser administrados a todos os estudantes universitários.  Poucos anos depois de se mover para a Columbia University, New York, em 1891, Cattell realmente estabeleceu, em larga escala, um programa de aplicação de sua bateria de testes para cada estudante que ingressava nas escolas de Columbia. Dentre os objetivos de Cattell para testar este programa (que durou mais de 10 anos) estavam a determinação da validade concorrente (correlação entre os resultados obtidos em vários testes) e da validade preditiva (correlação entre os resultados dos testes e o sucesso acadêmico) de seus testes. Entretanto, sua ignorância em matemática impediu-o de realizar tais análises até que a ele se juntasse um assistente, Clark Wissler, que tinha sido treinado nos novos métodos correlacionais elaborados por Galton. Após submeter à análise o trabalho de uma década realizado por Cattell, Wissler fracassou em descobrir correlações entre os testes e entre quaisquer testes e o sucesso acadêmico nas Universidades.

Estes resultados bem analisados e publicados fomentaram a morte da antropometria mental, bem como serviram para encerrar a carreira de Cattell como pesquisador. Em 1917, ele foi demitido da Universidade em virtude do seu declarado pacifismo; contudo, Cattell iria criar uma posição muito respeitada na história da testagem mental como fundador da Psychological Corporation, a qual, no mundo todo, é reconhecida ainda hoje como a maior editora de instrumentos e testes psicológicos, que ele fundou em New York. As mais importantes realizações editoriais de Cattell foram a fundação da prestigiosa revista Psychological Review(ainda, uma das revistas com maior impacto na literatura psicológica) e a edição da revista Science, órgão oficial da American Association for the Advancement of Science. Esta última publicação foi vendida à Associação pela família de Cattell no ano seguinte à sua morte.

 

Alfred Binet (1909-1975)

Mesmo antes da análise elaborada por Wissler, a antropometria mental proposta por Cattell tinha sido criticada pelo fato de focalizar excessivamente as funções sensoriais e motoras (processos fisiológicos, excluindo as funções cognitivas (psicológicas) de alta ordem).  Para rejeitar os argumentos de Cattell de que tais habilidades cognitivas complexas não eram passíveis de serem quantificadas e mensuráveis, seus oponentes apontaram os trabalhos do médico Francês, Alfred Binet, o qual estava desenvolvendo um instrumento para detectar o retardamento mental nas crianças escolares para propósitos de educação especial.

Em 1905, Binet e seu estudante, Theodore Simon (1873-1961), publicaram a escala de inteligência Binet-Simon: uma bateria de 30 testes primariamente construída para avaliar as habilidades cognitivas que os autores acreditavam englobar a inteligência e que discriminava muito bem entre crianças normais e crianças evolutivamente atrasadas. Em adição ao fato de ter sido o primeiro teste direto de inteligência, a Escala de Binet-Simon pode ter introduzido o conceito de normas de grupo ou grupos de referência. Isto é, a determinação da existência e o grau de retardamento mental foram feitos baseados na comparação do desempenho do sujeito com o desempenho médio sobre os mesmos itens estabelecido previamente por normas de grupos de crianças com leve, moderado e severo retardo mental.

A revisão de 1908 da Escala de Binet-Simon foi uma expansão do objetivo principal da escala para discriminar níveis de inteligência tanto para crianças retardadas quanto para não retardadas. Os autores selecionaram tarefas que eram capazes de discriminar entre crianças de diferentes idades. Por exemplo, constatou-se que apenas uma minoria das crianças de 3 anos de idade poderia copiar um quadrado, uma maioria de 4 anos de idade (75% ou mais) poderia copiá-lo e praticamente todas as crianças de 5 anos de idade poderiam realizar esta tarefa.. Se, pelo menos, 75% das crianças de certa idade pudesse passar no teste, então ele era considerado apropriado para aquele nível de idade. Isto permitia ao examinador comparar o desempenho de uma criança com as normas de sua idade, para determinar se a inteligência de uma criança mesmo sem retardo mental estava na média, abaixo ou acima da média.

Em 1911, a escala foi revisada para elevar o teto do nível de dificuldade do item (para ser apropriado para indivíduos com idade de 15 anos) e para prover 5 testes para cada nível etário. Isto permitiu uma computação mais precisa da "idade intelectual" de uma criança (em quintos de um ano) que poderia ser maior ou menor do que, ou aproximadamente igual, a idade cronológica da criança, tal como determinada pelo desempenho da criança comparado àquele das crianças mais jovens, de mesma idade e mais velhas do que ela.  Binet reconheceu o perigo de rotular uma criança com um nível de inteligência inferior àquele de sua idade cronológica, notando o potencial para a profecia da auto realização na sala de aula. Em adição, Binet destacou as conclusões precipitadas que poderiam ser feitas a partir de um desempenho pobre no teste, citando a falta de motivação, a doença física e a falta de conhecimento cultural como potenciais perturbadores. Enquanto Binet acreditava em um teto hereditário na habilidade intelectual, ele também postulava que a maioria dos humanos não funciona no máximo de seu potencial e que, portanto, a educação poderia enriquecer quase todas as habilidades intelectuais.  Devido a sua facilidade de uso, eficácia e economia de tempo relativo à aplicação, a Escala de Binet-Simon continua sendo usada no mundo todo desde o início da primeira guerra mundial.

 

William Stern (1871-1938)

Apesar das objeções de Binet, em 1911 o psicólogo Alemão Stern substituiu o termo idade intelectual por idade mental (IM) e propôs que este número fosse dividido pela idade cronológica da criança (IC) para derivar um quociente de inteligência: QI = IM / IC x 100 (tanto a abreviação do quociente de inteligência para QI quanto a multiplicação do resultado por 100 para eliminar o ponto decimal, foram sugestões de Lewis Terman, cujas ideias iremos sumariar mais adiante). Binet argumentou que a destilação das habilidades e capacidades complexas que compreendem a função intelectual num constructo representado por um simples número, era uma simplificação grosseira e imprópria. Não obstante, a ideia de um simples indicador global da inteligência tem sido historicamente popular e perdura até hoje em muitos destacados testes de inteligência.

 

Charles Spearman (1863-1945)

Spearman inspirado nas suas leituras sobre o trabalho realizado por Galton e ignorando as análises efetuadas por Clark Wissler desacreditando a testagem antropométrica com o propósito de avaliar a inteligência, conduziu vários estudos correlacionais da acuidade sensorial e das estimativas dos professores / pares sobre a habilidade na escola. Os resultados de Spearman incluíram correlações moderadamente altas entre as medidas sensoriais, e mais importantes, entre as acuidades sensoriais e as avaliações de inteligência, as quais, quando corrigidas para atenuação devido à fidedignidade imperfeita das medidas, se tornaram perfeitas, isto é, próximas de + 1,0 (posteriormente, Spearman rejeitou os resultados de Wissler como sendo um artefato de medidas sensoriais excessivamente não fidedignas). Baseado nestas correlações perfeitas, Spearman concluiu que suas medidas sensoriais eram indicadores de uma faculdade global da habilidade humana, ou uma “inteligência geral” (g) que ele acreditava ser totalmente hereditária. A despeito da popularidade da Escala de Binet-Simon, foi o conceito de uma inteligência hereditária, unitária, que se tornou naquela época a definição mais amplamente aceita de inteligência na América.

 

Henry Herbert Goddard (1866-1957)

Goddard, após receber o seu doutorado na Clark University sob a supervisão de Granville Stanley Hall (1844-1924), tornou-se o primeiro diretor de pesquisas de uma escola especial para treinamento de deficientes mentais, em New Jersey. Ele traduziu a Escala de Binet-Simon (bem como outros trabalhos de Binet e Simon) para o inglês, testou-a intensamente com os estudantes de sua escola especial e de outras escolas públicas ao redor de New Jersey e tornou-se um porta-voz da eficácia dos métodos de Binet para distinguir entre crianças revelando vários graus de retardo mental. Tal como fizeram muitos de seus contemporâneos que aceitaram os métodos propagados por Binet, Goddard rejeitou a concepção de Binet de uma inteligência largamente maleável e adotou, em vez disso, a visão proposta por Galton, Cattell e Spearman de que a inteligência era hereditária.

Inspirado por esta convicção e pelos resultados de que muitas das crianças em sua amostra de escolas públicas escoravam abaixo de suas normas etárias, Goddard procedeu para estudar uma família que ele deu o nome fictício de Kallikak (Grego para bom/mau). A essência do estudo foi que o patriarca na época da guerra teve um relacionamento fortuito com uma garçonete deficiente mental e ambos geraram uma criança que eventualmente tinha 10 descendentes, todos os quais eram indesejáveis como resultados de sua falta de inteligência (de acordo com Goddard). Eles eram mentalmente retardados, alcoólatras, prostitutas, criminosos, etc. Quando a guerra terminou, o patriarca casou-se com uma garota ilustre; os descendentes desta união foram quase todos, cidadãos realizados e de grande prestígio.

Esses resultados levaram Goddard a clamar em voz alta, ao longo com outros proeminentes cientistas, uma chamada para a esterilização obrigatória e/ou segregação dos “indesejáveis” (como descrito acima) para prevenir sua procriação. Em resposta a esta chamada, pelo menos 20 estados e vários outros países impuseram leis ou regras obrigatórias de esterilização de tais indivíduos, algumas das quais continuaram vigentes até meados de 1970. A afirmação de Goddard de que aproximadamente 50% dos imigrantes eram “deficientes mentais” (baseado sobre os resultados da Escala de Binet-Simon que fora pobremente traduzida e administrada em condições de testagem extremamente adversas) diretamente afetou severos aumentos nas taxas de deportação de imigrantes no período compreendido entre 1912 a 1914. Durante a última parte de sua carreira, a visão de Goddard acerca da natureza da inteligência mudou, de forma que chegou a concordar com a concepção mais ampla de Binet acerca dos limites genéticos da inteligência e em sua crença na educabilidade de muitas crianças que foram testadas como retardadas. Apesar dos prejuízos causados por Goddard, seu trabalho se constituiu no primeiro programa em grande escala de uso dos Testes de Binet e no primeiro conjunto de aplicações de testes mentais como política social.

 

Louis Terman (1877-1956)

Terman foi um professor de educação e, depois, chefe do departamento de psicologia na Stanford University, na Califórnia, descobriu que a tradução da Escala de Binet-Simon para a população americana não estava acurada como ela deveria ser. As normas estavam de, alguma forma, assimétricas em diferentes direções para diferentes grupos etários, provavelmente devido às diferenças culturais (por exemplo: questões para as crianças de 5 anos eram muito fáceis e aquelas para as crianças de 12 anos eram muito difíceis para seus respectivos grupos etários). Termam suprimiu os itens inconvenientes, adicionou itens mais apropriados e ajustou o escore médio em 100, de maneira que a Idade Mental e a Idade Cronológica dos grupos pudessem ser aproximadamente iguais. Como consequência, a Escala Stanford-Binet tem sido revisada várias vezes e se constitui numa das escalas mais amplamente usada para testar a inteligência das crianças.

Terman concordava com Goddard de que a inteligência era geneticamente transmitida e que a falta dela predisporia um indivíduo para uma vida imoral.  Em sua pesquisa para suportar a crença de que a criança genial teria provavelmente maior sucesso quando adulto do que teriam outras crianças, Terman iniciou o mais longo estudo longitudinal da história da psicologia. Ele começou por administrar a Escala de Binet-Simon para milhares de estudantes das escolas Californianas e englobou em sua amostra 1.528 crianças que foram designadas com escores acima de 135 (seu ponto de corte para gênio). Estes indivíduos têm sido (e continuam a ser) repetidamente estudados através de sua vida e têm alcançado as maiores taxas de educação, proeminência, sucesso global e ajustamento do que os indivíduos menos talentosos. Este padrão de resultados foi contrário à crença popular que prevalecia quando o estudo começou.

 

Robert Yerkes (1876-1956)

Yerkes advogou a aplicação de todos os itens da Escala de Binet-Simon para cada sujeito (opondo-se à tentativa habitual de ministrar uma amplitude de itens apropriada para cada sujeito) para derivar um escore pontual (como oposto a um único escore de QI). Isto poderia aumentar a facilidade de administrar o teste e facilitar as análises estatísticas dos resultados, fazendo o teste muito mais apropriado para a aplicação coletiva. Como Presidente da American Psychological Association(APA) durante a Primeira Guerra Mundial, Yerkes empreendeu um esforço de ajuda aos militares para desenvolver um teste coletivo de inteligência “inata” que fosse fácil de aplicar e escorar, ao qual ele denominou Army Alpha. A ignorância de 40% dos recrutas obrigou-o a desenvolver outro teste baseado no desempenho que ele denominou deArmy Beta. Embora o Exército tenha descontinuado o programa de testagem imediatamente após o término da guerra, 1, 75 milhão de recrutas foram avaliados até aquela época. Não obstante, o programa não teve o grande sucesso que dele se esperava; aparentemente, um desempenho fraco no teste apenas resultou na recomendação de eliminação de 0,005% dos indivíduos testados, e mesmo nestas circunstâncias, o Exército frequentemente desconsiderou a recomendação.  Todavia, a ampla divulgação do programa de testagem da inteligência no Exército cimentou o movimento de testagem da inteligência como uma força duradoura na psicologia.

 

David Weschler (1896-1981)

Esta mesma divulgação foi provavelmente responsável por estimular o interesse de Weschler para a testagem da inteligência na extensão em que, como um estudante de graduação na Columbia University, ele voluntariamente se submeteu ao teste Army Alpha. Posteriormente, como um oficial do Exército, Weschler teve a responsabilidade de examinar indivíduos que escoraram fracamente nos Testes Alpha e Beta usando a Escala de Stanford-Binet, o teste de inteligência individual mais popular naquela época. Weschler criticava o Teste de Stanford-Binet como sendo inapropriado para avaliar a inteligência dos adultos. Durante sua carreira militar, ele foi enviado à Inglaterra para estudar com Spearman, impressionado com o conceito de “g” por ele proposto, mas que subestimava o papel da motivação e personalidade na inteligência e fracassara em reconhecer os vários componentes de habilidades que compreendiam a inteligência. Diferente de todos os testes de inteligência populares naquela época, Weschler entendia que o Army Alpha era o mais útil porque usava o mesmo tipo de itens (e mensurava as mesmas habilidades) em todos os níveis de dificuldade, permitindo uma comparação de áreas de habilidades relativamente fracas e fortes, e porque o sistema de escoramento pontual não usava a relação idade mental / idade cronológica que poderia ser inapropriada para uso com populações adultas. Weschler melhorou o Teste Army quando ele recriou sua escala numa nova versão em 1939 e depois a revisou em 1955. Esta escala foi denominada de Escala de Inteligência para Adultos (Weschler Adult Intelligence Scales - WAIS). Esta escala foi dividida em sub-testes Verbal e Desempenho derivado dos Testes Army Alpha e Beta,respectivamente.

Os resultados nos diferentes sub-testes podem ser comparados a uma visão multifacetada das habilidades intelectuais dos indivíduos (ou incapacidades). Todavia, em deferência à utilidade do índice unitário de inteligência proposto por Spearman, Weschler também incluiu um escore de QI de desvio geral baseado na posição do escore individual na distribuição normal dos escores para os grupos etários de seus pares. Este método de escore de desvio tem sido agora incorporado nos testes mais comuns de inteligência, e o WAIS é atualmente o instrumento mais popular usado para avaliar a inteligência de adultos ao redor do mundo.

 

Um novo início

A concepção acerca das origens da inteligência que ainda prevalece nos dias atuais é uma visão que moderadamente imita aquela formulada por Alfred Binet no início do século 20. Muitos psicólogos acreditam que há algum teto genético no nível de habilidade intelectual de um indivíduo, mas que a inteligência pode ser de alguma maneira melhorada por intervenção educacional apropriada. O constructo de inteligência, embora aceito amplamente, é similar à ideia de Weschler de que um “g” global existe e influencia todas as nossas habilidades intelectuais, mas que há um número de habilidades específicas que é requerida por diferentes tarefas em diferentes extensões. As discussões modernas dos teóricos da inteligência têm se ampliado para incluírem os debates sobre a existência de uma “inteligência emocional”; os argumentos sobre o mérito e os perigos da inteligência artificial extremamente sofisticada, e uma ampla variedade de controvérsias sobre as aplicações dos resultados dos testes de inteligência. 

Não obstante, as polêmicas da idade antiga a respeito da importância relativa da natureza e criação e uma exata definição de inteligência permanecem vivas e ainda podem ser traçadas nos manuais de avaliação e mensuração da inteligência.  Teorias recentes têm ainda discutido a existência de apenas uma inteligência unitária ou inteligências múltiplas, da hierarquia das habilidades intelectuais que incluiria ou não uma inteligência geral (g), das diferenças entre inteligências: analítica (acadêmica), prática e criativa e, também, as relações existentes entre estas inteligências com o sucesso pessoal e profissional. Assim, parece que novamente recomeçamos...

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