Avaliação educacional (3): o desempenho dos alunos

Avaliação educacional (3): o desempenho dos alunos

             Abordar a relação existente entre desempenho escolar e habilidades cognitivas de estudantes com as políticas públicas a eles oferecidas é o objetivo deste texto. Uma vez que tal abordagem trata de intervenções públicas, somos obrigados, necessariamente, a considerar dados agregados, e não dados individuais. Para tanto, talvez um exemplo possa significar melhor o que estamos querendo refletir. Considere duas crianças de 11 anos e uma prova de matemática valendo de 0 a 10. Uma destas tem nota 9 e a outra 7. O que podemos dizer sobre as diferenças entre ambas? A princípio, baseados em importantes aspectos, e com confiança, nada podemos afirmar. Por quê? Porque tais pontuações seriam valorosas apenas se combinadas com outras variedades de informações, tais como, personalidade, talento, temperamento, entre outros. Ou seja, as notas individuais em matemática que elas tiveram são úteis, certamente, mas, na ausência de um contexto, de pouca valia. Entretanto, considerando duas classes de 6ª série, com uma delas apresentando média 9 e a outra média 7, perguntamos: “O que podemos dizer sobre a diferença entre ambas e seus prospectos médios para o futuro?”. Diferentemente do primeiro caso: muita coisa. E com confiança. Não sobre um estudante, em cada classe, mas, sim, sobre resultados médios importantes tanto para a escola, como para as políticas públicas educacionais e sociedade de modo geral.

            Ao longo dos últimos anos, tanto em nível nacional, quanto internacional, diferentes tipos de avaliações têm sido implementados, todos visando capturar o desempenho de nossos alunos, comparando-os regionalmente ou com outros países. Como exemplos de aferições do desempenho estudantil no País, podemos citar o SARESP (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo), ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), ENADE (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes) e exames vestibulares gerais, como, FUVEST, VUNESP, UNICAMP, entre outros. Já em nível internacional, o TIMSS (Trends in International Mathematics and Science Study) e o PISA (Program for International Student Assessment) são avaliações usadas para comparar o desempenho estudantil entre diferentes paises. Todos, respeitando-se suas especificidades, procurando dizer, de um modo ou de outro, o quão bem nossos jovens estudantes estão preparados para enfrentar os desafios do futuro. Mas, na realidade, o quê todas estas avaliações tentam capturar é se os estudantes são capazes de analisar, raciocinar e comunicar suas idéias efetivamente. Neste contexto, tais provas tentam, fundamentalmente, aferir a capacidade de nossos estudantes em continuarem a aprender por toda a vida.

            A rigor, o grande dilema que se apresenta em todas estas avaliações é se elas devem focar o conhecimento de conteúdo em matemática, leitura, escrita e ciências, ou as habilidades, competências, raciocínio e capacidade de análise, aqui incluindo os demais atributos incorporados nos indivíduos, relevantes que são para o bem-estar pessoal, social e econômico dos mesmos. Ou seja, quando testando diretamente o conhecimento, e as habilidades escolares básicas, tais avaliações examinam o grau de prontidão dos estudantes para a vida adulta. E, por conseguinte, a efetividade do sistema educacional. Ademais, muitas são as avaliações que focam o potencial do capital humano, no sentido de que este tenha uma participação democrática e social na vida adulta. Todas dando condições às pessoas para se tornarem contínuos aprendizes. Em síntese, no contexto da teoria das habilidades cognitivas, tais avaliações tentam capturar duas formas de inteligência, a saber: a fluída e a cristalizada. Esclarecendo que, por inteligência fluída devemos entender nossa capacidade de raciocinar e pensar, abstratamente, bem como, de lidar com a complexidade e com aspectos inéditos e originais. Representando, portanto, o estado atual de nosso poder cerebral. Já a cristalizada, como o conhecimento adquirido através de intensa, e constante, interação com o nosso ambiente de aprendizagem. Representando, por sua vez, conhecimento ou experiência educacional, os quais fluem, geralmente, de nosso estoque de conhecimento. É o conhecimento solidificado em nosso cérebro.

            É certo que, ao menos teoricamente, aqueles que têm maior inteligência fluída são capazes de processar informações mais rapidamente, armazenando-as, e recuperando-as, por isso, em maior quantidade. Assim consideradas, o grande dilema de todas essas avaliações educacionais é saber qual destas inteligências, cristalizada (conhecimento) ou fluída (raciocínio), deve ser focalizada. Cabe, portanto, indagar: “Qual delas, fluída ou cristalizada, respectivamente raciocínio ou conhecimento, é o melhor preditor para o sucesso na vida pessoal e profissional?”. Neste sentido, é vasta a literatura que questiona estas diferentes formas de inteligência, revelando, em suas sínteses, que os escores agregados, em testes de inteligência fluída, correlacionam-se, altamente, com, indicadores educacionais oriundos do PISA e TIMSS (em escrita, matemática, leitura e ciência) e mesmo com os indicadores de produtividade científica e inovação tecnológica. Em adição, há, também, dados indicando que os escores de inteligência fluída são altamente correlacionados com o SAT (Scholastic Assessment Test), verbal e matemático, usado para admissões nas universidades norte-americanas. Logo, é fácil entender que, fruto destas altas correlações, as avaliações educacionais deveriam, essencialmente, mensurar a inteligência fluída. Pois, é esta o verdadeiro abridor de portas na vida. Importante que é, entretanto, não é sinônimo da excelência humana.

            Finalmente, é relevante mencionar que, avaliações internacionais comparativas, como TIMSS e PISA, permitem, aos sistemas educacionais, monitorar o processo de ensino-aprendizagem, bem como, expandir, e enriquecer, o panorama educacional nacional, ao estabelecer os níveis de desempenho a serem alcançados por estudantes brasileiros, quando comparados com aqueles de estudantes em outros países. Além disso, fornecem um contexto muito maior, no bojo do qual, interpreta os resultados nacionais. Tais análises comparativas ainda podem fornecer direções para os esforços instrucionais das escolas e, para os estudantes, compreendendo as fraquezas e potencialidades dos currículos adotados. A partir de tais resultados, com reforços apropriados, os educadores podem motivar os estudantes a aprender mais, fomentarem professores a ensinarem muito melhor, e as escolas, a se tornarem mais eficientes. Em resumo, o sistema educacional pode verificar, comparativamente, se suas políticas públicas têm dado frutos maduros e saborosos. E se recursos aplicados não tenham se esvaído pelo ralo, ou sido desviados para outros fins.

 

 

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