A calamidade da educação

A calamidade da educação

             O relatório anual da ONG Todos pela Educação, que mostra, baseado em dados do MEC e do IBGE, um panorama do 9º ano do ensino fundamental das redes públicas. Várias manchetes anunciaram uma calamidade na educação: além de revelar que3,8 milhões de crianças e jovens estão fora da escola, os dados claramente mostraram que os padrões de ensino estão extremamente ruins. Por exemplo, apenas 35 cidades brasileiras, ou seja 0,6% do país, tem 50% ou mais de seus alunos com aprendizado em matemática pertinente à série que cursam. Dito de outra forma, esses dados indicam que a maior parte dos estudantes desses municípios não aprendeu, por exemplo, a identificar objetos em mapas nem a resolver problemas com números inteiros e racionais através de várias operações.

            No caso da língua portuguesa é de 1,2%, isto é, apenas 67 municípios apresentam a metade ou mais de seus estudantes desempenhando, satisfatoriamente, no nível escolar em que estão. Em outras palavras, a grande maioria ainda não aprendeu a identificar o cenário e os elementos que configuram a narrativa de um texto, por exemplo. No caso do 5º ano, em Matemática, apenas 1.029 cidades, 19%, tiveram 50% ou mais de seu alunado sabendo o que foi ensinado, tais como, ler dados em tabelas, em figuras e em gráficos. Em língua portuguesa essa porcentagem é 14,3%, ou seja, 773 cidades, têm metade ou mais de seus pupilos sabendo, por exemplo, identificar efeitos de emoção num texto.

            Ademais, nenhuma das capitais do país tem metade ou mais de seus estudantes com o aprendizado adequado nestas duas disciplinas avaliadas. Por outro lado, o MEC anuncia que distribuiu, ou irá distribuir, 150 mil laptops para 325 escolas em 36 cidades, dentro do projeto Um Computador por Aluno. E que há 27 equipes de pesquisa, ligadas à universidades federais, que acompanham o desenvolvimento e a execução do projeto. O estudo servirá de base para os ajustes do processo de inclusão social. O MEC também alardeou que está disponibilizando 600 mil tablets, com rico conteúdo digital, para todos os professores de ensino médio. Uma lousa digital permitirá aos professores partilharem os conteúdos digitais com seus alunos. Excelente.

            As iniciativas do MEC para disponibilizar equipamentos computacionais de última geração nos ensinos fundamental, médio e superior merecem pleno e cabal elogio. Todavia, a equipe do MEC parece estar fazendo ouvidos moucos a inúmeros estudos, publicados nos últimos 20 anos, mostrando que apenas instrumentalizar escolas e professores, não fomenta, ou seja, não é o ingrediente ativo que melhora, o desempenho acadêmico dos estudantes em matemática, leitura e ciências. De modo similar, os dados revelados pela ONG Todos pela Educação, se analisados com outros olhares, revelam que, também, o contexto familiar-estudantil, instrumentalizar escolas e qualificar instituições não são determinantes cruciais do rendimento escolar.

            Estimativas, baseadas nos dados do PISA e do TIMSS, revelam que educação familiar associada à quantidade de livros no ambiente doméstico constituem importantes preditores do desempenho estudantil em muitos países. Todavia, a quantidade de livros domésticos, na realidade, é um reflexo do nível econômico, social e educacional das famílias dos estudantes. Não obstante, é importante ser claro sobre a interpretação destes dados. Isto não implica que livros, no ambiente doméstico, seja, sozinho, causa direta do desempenho acadêmico, tampouco que, fornecendo-se mais livros às famílias elevar-se ia os resultados acadêmicos. Livros no lar espelham diferenças sistemáticas na educação familiar e recursos domésticos, que são presumidos serem diretamente relacionados ao desempenho.

            Em relação a instrumentalizar a escola, um conjunto de medidas que inclua gasto por estudante, tamanho da classe, disponibilidade do material instrucional e características do professor indicam que, em geral, análises comparativas internacionais da associação do desempenho do estudante com estes recursos tendem a ser muito mais fracas do que com os níveis sócio-econômico. Ou seja, na maioria dos níveis básicos, países com alto dispêndio educacional, parecem desempenhar no mesmo nível que países com baixos dispêndios. Além disso, dispêndio e tamanho da classe não explicam a variação entre países no desempenho educacional. Isto parece ocorrer, do mesmo modo, quando o foco é a comparação entre escolas dentro dos países.

            Por fim, quando analisamos a qualidade das instituições, por exemplo, sua natureza de gestão, autonomia escolar, acompanhamento e orientação escolar, as variáveis que tendem a ser associadas com níveis mais elevados de desempenho incluem tipo de gestão, avaliações externas e autonomia escolar no processo e decisões em relação ao corpo administrativo-discente, bem como, se a escola é pública ou privada.

            Nossos dirigentes, portanto, parecem esquecer que o que se tem, verdadeiramente, que fomentar, são as habilidades cognitivas dos estudantes. O foco de qualquer reforma escolar, e olha que o Brasil precisa, com urgência, de uma, não deve ser centrado, exclusivamente, em mudanças estruturais nas escolas, seguidas pela simples adição de recursos materiais ou financeiros. O importante é o que as pessoas conhecem, e está claramente demonstrado que a distribuição de habilidades na sociedade parece intimamente relacionada à distribuição de renda. E, talvez, o mais importante, crescimento econômico, e desempenho educacional que o sustenta, é fortemente afetado pelas habilidades cognitivas dos trabalhadores.

 

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