
Capital Cognitivo e as Desigualdades Brasileiras
Há uma vasta literatura científica sustentando a ideia de que o desenvolvimento econômico de uma nação, ou mesmo, de um Estado depende, essencialmente, da qualificação do capital cognitivo daquela nação, o qual pode ser entendido como letramento, numeramento, habilidades ou competências cognitivas e inteligência. Usualmente, tem sido usado os escores do Pisa médio de cada nação como indicador básico para se fazer predições acerca do grau do desenvolvimento econômico das mesmas. O PISA, exame internacional padronizado, que avalia o desempenho escolástico em leitura, matemática e ciência de jovens entre 13 a 15 anos das nações agregadas à OECD, é aplicado de 3 em 3 anos, embora, algumas nações não pertencentes à OECD também busquem se submeter a essas avaliações, caso, por exemplo, do Brasil. Os resultados do PISA, portanto, sendo tomados por inúmeros pesquisadores para análise dos indicadores do progresso econômico e de outros, relacionados à educação, saúde, pobreza, sanitarismo, habitação, pesquisa e desenvolvimento, etc. Exemplo? Inúmeros países asiáticos, tais como, Coréia do Sul, Taiwan, Japão, Hong Kong, Cingapura e outros, como, Finlândia, Canadá, Suécia e França pontuam de forma mais elevada, ao passo que, Brasil, Peru, Chile, Filipinas, Marrocos, Albânia e muitos outros pontuam na cauda inferior da distribuição dos escores do PISA. Ao lado disso, há inúmeros estudos relatando que aos escores do PISA correlacionam-se de forma elevada com os resultados dos testes de inteligência, usualmente expressos em QI, quando, eventualmente, estimados dessas nações. Algumas correlações situando-se entre 0.70 a 0.90 (o máximo é 1), indicando, claramente, que o PISA, em essência, mede, de certo modo, a inteligência média da nação.
Assim considerando, tomei os dados do PISA aplicado no Brasil nos anos 2006, 2009 e 2012 para os diferentes Estados brasileiros e, fazendo cálculos estatísticos apropriados, calculei o capital cognitivo médio de cada Estado, colocando-o numa métrica de QI cuja média é 100 e o desvio é 15. Os resultados revelaram que o QI dos diferentes Estados brasileiros varia de 78 a 90, com uma média para o Brasil igual a 83. Adicionalmente, calculei, também, o QI médio das nossas cinco regiões tradicionais, bem como, aquele do Distrito Federal. Em seguida, tomei os seguintes indicadores de desigualdade publicados pelo IBGE nos anos de 1991, 2000 e 2010: esperança de vida, taxa de fertilidade, taxa de mortalidade, taxa de pobreza, renda per capita, taxa de sanitarismo para banheiro e água nos domicílios e taxa de matriculados no ensino superior acima de 25 anos de idade. Em seguida, tomando apenas as regiões como unidade de análise, elaboramos uma matriz de correlações considerando os escores QI-PISA e as pontuações dos diferentes indicadores acima listados. Os resultados? Surpreendentes. A correlação entre o QI PISA e a esperança de vida para 1991 foi 0.90 e para o ano 2000 foi 0.95. Em outras palavras, quanto maior o QI de uma dada região geográfica brasileira, maior a expectativa de vida, independente do ano censitário. Outro exemplo? A taxa de pobreza também está altamente correlacionada com o QI médio das regiões. Para o censo de 1991, a correlação foi negativa de -0.80 e, para o censo de 2010, foi de -0.82, o que indica que quanto mais elevado é o QI de uma região geográfica, menor a taxa de pobreza.
Tomando, agora, a renda per capita média de cada região e correlacionando-a com o QI PISA médio dessa mesma região, as correlações foram 0.77 e 0.81 para os censos de 1991 e 2010, respectivamente. Traduzindo, quanto mais elevado for o QI de uma dada região, mais elevada é a renda per capita da mesma, independente de qual ano ou censo estamos considerando. Importa esclarecer, todavia, que muitos desses indicadores de desigualdade têm melhorado em termos absolutos ao longo das décadas avaliadas. Por exemplo, vivia-se, em média, até 68 anos na década de 90. Atualmente, vive-se cerca de 74 anos, em média. Mas, independentemente da melhoria absoluta, o ordenamento entre Estados e Regiões brasileiros tem permanecido o mesmo ao longo desses diferentes anos censitários. Finalmente, tomando-se as médias aritméticas das taxas de desigualdade desses sete indicadores, construímos um Índice Brasileiro de Desigualdade Regional (IBD-R) e Estadual (IBD-E) para os anos 1991, 2000 e 2010 e, como já esperado, encontramos substanciais diferenças nesses índices entre as regiões brasileiras. Parece muito óbvio que há dois Brasis: o Brasil do Norte e o Brasil do Sul.
Indo para as correlações entre o QI PISA e o IBD-R observamos correlações extremamente elevadas, variando de 0.92 a 0.96 entre os anos de 1991 a 2010. O que estas correlações também significam? Indicam que as desigualdades aferidas por um único indicador global IBD-R são mais elevadas em regiões que possuem um capital cognitivo refletido pelo QI PISA menor. Concluindo: esta análise originalmente aqui apresentada, ainda que parcial, considerando apenas as regiões, adicionada àquela efetuada considerando os 27 Estados brasileiros, revelam, categoricamente, que há necessidade urgente de políticas públicas que visem à promoção e fomento do capital cognitivo da população brasileira, em especial, nas regiões cujos escores atualmente encontram-se mais baixos. Como fazer isso e quais são essas políticas públicas recomendadas é outra história, sobre a qual falaremos depois.