ELITE COGNITIVA (11): INTELIGÊNCIA E ACIDENTES

ELITE COGNITIVA (11): INTELIGÊNCIA E ACIDENTES

       Todos nós queremos médicos inteligentes e que nunca cometam erros. Também queremos produtos e estradas seguros, bem como pilotos de aviões competentes. Todavia, as adversidades do cotidiano, como os acidentes fatais, por exemplo, nos ensinam que, para desfrutarmos de segurança, é nosso dever nos precavermos contra os mesmos. Acidentes fatais, constituindo a quarta causa de morte no mundo, superados apenas pelo câncer, doenças cardíacas e derrames, rivalizam com as doenças crônicas enquanto problema de saúde pública. No Brasil, respondem, sozinhos, por mais da metade de todas as mortes acidentais, com um terço da população sofrendo, anualmente, algum acidente que requisita tratamento, ou que resulta em, pelo menos, um dia de atividades restritas. Lidera, portanto, a causa de morte nas idades entre 1 a 44 anos, explicando, aproximadamente, metade de todas as mortes ocorridas entre 1 a 14 e 25 a 34 anos, num total de quase três quartos entre 15 a 24 anos de idade.

            Na maioria das vezes, as pessoas concebem que estas mortes são explicadas, exclusivamente, pela fatalidade, sendo, puramente, acidentais e fugindo ao controle humano, ou seja, ocorrida por “falta de sorte”. Tal probabilidade existe, sem dúvida, mas é indiscutível que o comportamento humano está profundamente implicado nas causas e no curso dos acidentes. O que faz com que profissionais de saúde descrevam o quão difícil é persuadir as pessoas a se comportarem de modo seguro, e saudável, como, por exemplo, a não fumar na cama, nem beber e dirigir, mas, sim, comer corretamente e exercitar-se. Mesmo as leis que proíbem comportamentos inseguros, como dirigir em alta velocidade e deixar de usar equipamentos de segurança, têm eficácia limitada na pretendida mudança de comportamentos. Ou seja, acidentes não visitam as pessoas aleatoriamente, nem os seus perigos distribuem-se igualmente em todas as ocupações, idades, sexos ou locais.

            A literatura científica recente revela que alguns indivíduos tendem a sofrer mais acidentes que outros, mesmo com igual nível de exposição a estes em ambientes comuns. Há dados indicando que quanto mais inteligente você é, menos, provavelmente, você terá acidentes. A amostra clássica de Lewis Terman, envolvendo pessoas com QI acima de 140, revelou que, para estas, os acidentes foram bem abaixo do nível observado na população em geral. Em outros estudos, o risco de acidentes de trânsito eleva-se quando o QI do motorista diminui. O nível de educação, em certo grau, reflexo que é de uma medida de inteligência, tem sido também conectado aos acidentes e danos, incluindo acidentes fatais em outras atividades ou ocupações.

            Trabalhadores mais brilhantes são, tipicamente, mais produtivos, e, presumivelmente, mais eficazes em evitar acidentes inúteis. Há dados indicando que baixa habilidade cognitiva aumenta em pessoas saudáveis o risco de ficar fora da força de trabalho, mas, também, aumenta o risco de não ser saudável. As porcentagens de pessoas impedidas de trabalhar por problemas de saúde, bem como, as que registram limites na quantidade, ou no tipo, de trabalho, por problemas de saúde, aumentam substancialmente entre as classes cognitivas, variando dos mais brilhantes aos que têm grandes incapacidades cognitivas. Ademais, o risco de acidentes é mais alto entre trabalhadores que têm menos conhecimento do que entre aqueles que têm alguns meses, ou anos, de experiência, bem como, quando as tarefas são mais complexas, novas ou confusas. Também, os erros aumentam quando as tarefas demandam altas habilidades cognitivas. Portanto, a questão central não reside nas causas dos acidentes, mas sim no quê os previnem. Uma vez que estamos, continuamente, expostos a todos os tipos de perigo, devemos atuar, defensivamente, durante toda a vida para minimizá-los. Para tanto, os indivíduos devem, primeiramente, reconhecê-los, detectar os primeiros sinais de perigo e, apropriadamente, avaliar ou responder a estes sinais. Fracassos na percepção destes sinais usualmente conduzem a acidentes fatais ou catastróficos.

            Prevenir e controlar os acidentes, bem como as doenças crônicas, constitui, em essência, exercício de processos cognitivos de alta ordem. Os perigos são ambíguos e, em sua maior parte, ficam incubados sem qualquer evidência visível; outros, não tão claros no caleidoscópio da vida diária, indicam o quão periculosos são ou poderiam ser. Evitar a morte acidental, de modo análogo ao exercício efetivo dos auto-cuidados com saúde, requer habilidades de processamento de informação semelhantes às envolvidas em empregos complexos, ou seja, monitorar, continuamente, um grande, e variado, espectro de informações, discernir padrões e anomalias, entender relações e causas, avaliar probabilidades e prever eventos futuros. Em essência, a prevenção de acidentes requer imaginar o não visto, o emergente e o futuro. Entretanto, tais ações alcançam, com mais freqüência, as mentes mais preparadas, possibilitando-lhes controle e prevenção mais eficazes. Em outras palavras, lidar com as situações inesperadas, identificar rapidamente as soluções cabíveis e reagir, prontamente, quando problemas inesperados ocorrem, constituem, novamente, os ingredientes ativos da inteligência.

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