
A grande redescoberta
Em 1932, o Ministério Escocês para
Pesquisa em Educação empreendeu a ambiciosa tarefa de aplicar testes de
inteligência para todas as crianças do país, então, com 11 anos de idade. O
objetivo era quantificar deficiências mentais e a distribuição da inteligência
na comunidade. Em 1947, repetiu idêntico estudo, agora visando determinar se as
crianças seriam, na média, menos inteligente que as primeiras. Tais estudos
ficaram conhecidos como “Scottish Mental Surveys de 1932 e 1947 (SMS)”, cujos
dados, depois de publicados numa série de monografias, foram arquivados e
esquecidos.
Em 1997, Ian Deary, Professor de
Epidemiologia Cognitiva da Universidade de Edinburgh, e Lawrence Whalley,
Professor de Saúde Mental da Universidade de Aberdeen, entendendo a necessidade
de uma medida pré-mórbida da cognição para estudar a associação entre doenças
cardiovasculares e declínios cognitivos, redescobriram tais dados, que,
supunham, “mudariam suas vidas”. Diferente de outros estudos, estes testaram a
inteligência de toda uma população e, não apenas de uma amostra. A habilidade anterior daquelas crianças,
agora idosas, refletida na distribuição dos escores dos testes na população
inteira, abria oportunidades sem precedentes para pesquisa longitudinal.
Tal importância orientou os autores a
acompanhar várias destas, para verificar no que se tornaram e como envelheceram.
Por mais de 10 anos, com estudos e acompanhamentos contínuos, tentaram resolver
a questão “O que causa o envelhecimento cognitivo?”, analisando fatores
biológicos e sócio-comportamentais que poderiam estar associados ao declínio
cognitivo. Análises genéticas moleculares, imageamento cerebral, entrevistas e
testagem cognitiva foram técnicas empregadas. Dados relevantes para a
epidemiologia foram discutidos para verificar se a inteligência, mensurada na
idade de 11 anos, relacionava-se com a saúde física e mental na maturidade, com
a longevidade ou sobrevivência, bem como, com as relações entre inteligência com
todas as causas de mortalidade, com as causas específicas de morte e
mortalidade relacionadas a fatores físicos, e com a saúde mental. Foram analisadas as correlações entre
envelhecimento cognitivo e vários fatores biológicos, e outros relacionados à
saúde, incluindo genes, estrutura cerebral, fumar, saúde física, suplementos
dietéticos, entre outros. A estabilidade
das diferenças de inteligência ao longo de 70 anos de vida também foi
registrada, e suas conseqüências, incluindo casamento, mobilidade social,
qualidade de vida e personalidade. Enfim, esta grande redescoberta permitiu a
abertura de uma nova área da ciência: a Epidemiologia Cognitiva.