
A ideia perigosa de Sir Charles Darwin
No
ano de 2009 comemorou-se o bicentenário do nascimento de Sir Charles Darwin e os
150 anos da publicação de seu famoso livro A
origem das espécies, livro este no qual Darwin esboçou a teoria que o fez
um dos cientistas mais famosos do mundo. A despeito da distância temporal, a
importância de suas idéias ainda hoje ecoa nos quatro quadrantes do planeta e
as controvérsias por ele criadas ainda persistem vigorosamente em nossa
sociedade. Sua influência na ciência do século XX foi tamanha que, sem sombra
de dúvida, sua teoria da evolução tornou-se uma das pedras fundamentais da
moderna biologia. De fato, tanto a descoberta do DNA, como a revolução
molecular emergente do último século, erigiram-se a partir de suas idéias.
Entre 1830-40, especulando sobre as
espécies já conhecidas, e as que iam sendo originadas e descobertas, surgia-lhe
a idéia da evolução e da seleção natural como o mecanismo da evolução
biológica. A Teoria da Evolução enfatizava a variação hereditária como a
matéria-prima sobre a qual a seleção natural opera e, portanto, destacava a
significância biológica das diferenças individuais porque o Homo sapiens não
teria evoluído sem a existência da variação individual. Entretanto, receoso em
divulgá-la amplamente, pelo impacto que esta poderia suscitar, Darwin preferiu
discuti-la, somente, com alguns poucos privilegiados. Treze meses rascunhando o
que viria a ser a famosa obra, esta só conheceria o lume em novembro de 1859.
Congregando um conjunto de evidências e sólidas argumentações, que comprovavam
suas afirmações, estas constituíram uma “dinamite intelectual”, ou seja, a de que
a natureza poderia operar sem necessitar de qualquer intervenção divina.
Imediatamente à tomada de conhecimento da mesma, centenas de comentários,
hostis e favoráveis, começaram a ser tecidos. Até que, na pena de um antigo
amigo, Darwin viria a ler as mais duras palavras que até então lhe foram
dedicadas, “Li seu livro com mais dor do que prazer... algumas partes li com
profunda tristeza, pois, achei-as falsas e extremamente danosas”. Um outro, não
menos decepcionante, viria a chamar-lhe a seleção natural de “a lei da
confusão-bagunça”, e outros, mais cruéis, imputaram-lhe a afirmação pejorativa
de que o homem descendia dos macacos, afirmação esta que ele jamais fizera.
Entretanto, reações positivas logo
viriam a reanimá-lo, dos que, acreditando, comunicavam-lhe que suas idéias
viriam a revolucionar a ciência, “A idéia de seleção natural tem a
característica comum a todas as verdades universais: clarificando o que estava
obscuro e simplificando o que estava intrincado, colocá-lo irá como o maior
cientista deste século, se não de todos”. Mas, a todas as críticas recebidas,
fossem boas ou más, Darwin não recuou em afirmar que “Eu não posso pensar que se
a teoria fosse falsa, ela pudesse explicar tanto os fatos, como esta o faz”.
Nunca afirmando nada acerca da origem da vida, o cientista conseguiu
preservar-se da idéia religiosa de criação divina do mundo. Mas, a partir
daquela data, tinha consciência de que permitira à Natureza seguir a ordem que,
em sua teoria, ele tinha ordenado.
Com seis edições, e traduzida para
onze línguas, ainda no período vitalício de seu autor, tal obra nunca deixou de
ser, constantemente, reimpressa. E, em apenas uma década, a teoria darwiniana
já prevalecia, com poucos cientistas ainda refutando suas afirmações, e isto se
deveu não porque a teoria estivesse em voga, mas, sim, porque a evidência era
abundante e imediatamente condizente com a teoria geral. Assim, em poucos anos
após sua publicação, a quase totalidade da comunidade científica já aceitava a
teoria da evolução como a da origem das espécies. Não se limitando a apenas uma
alteração de paradigmas, tal teoria constitui-se numa verdadeira mudança de
pensamento da humanidade. Hoje, ao referenciar Darwin, muitos são os cientistas
que o identificam como o único filósofo causador da maior revolução no
pensamento humano em apenas ¼ de século. Em adição, ele nos legou novas
concepções do mundo da vida e uma teoria que é, por si própria, um instrumento
poderoso de pesquisa. Até hoje ele nos mostra como combinar, num todo
consistente, os fatos acumulados por todas as classes separadas de
trabalhadores, revolucionando, portanto, o estudo global da natureza.
Na atualidade, entretanto, a
despeito da robustez adquirida por suas concepções, alguns segmentos sociais ainda
insistem em contestar as premissas básicas de sua teoria da evolução e seleção
natural. Para estes é preciso recordar que o pior mal que fazem ao intelecto é
não discutir, em profundidade, quaisquer que sejam as implicações sociais,
culturais, filosóficas, teológicas, psicológicas e biológicas, não só desta,
mas de qualquer outra teoria. Idéia perigosa que foi, continua sendo e será
sempre perigosa.