Luminares da Ciência (1)

Luminares da Ciência (1)

Festschrift para o Dr. Frederico Graeff

 

            Dentre cientistas brasileiros, um que faz jus ao recebimento de um “Festschrift”, palavra alemã que identifica uma publicação que homenageia determinada personalidade por sua contribuição acadêmica e, também, por sua brilhante carreira científico-acadêmica, é Frederico Graeff. Graduado pela FMRP-USP, Graeff é um dos neurocientistas brasileiros que mais tem contribuído para o conhecimento da neurobiologia comportamental, especialmente da ansiedade e das desordens do pânico.

            Inteligente, criativo e sábio, domina, prioriza e exercita, como poucos, o método experimental. Com rara felicidade, consegue mediar extremos como pesquisa básica e implicações clínicas. Suas contribuições em Farmacologia Comportamental, campo das interações droga-comportamento, são tão originais e inéditas que é possível considerá-lo um marco da pesquisa antes e após sua atuação. Dentre seus trabalhos, freqüentemente citados na literatura internacional, destacam-se aqueles que, sistematicamente, investigam a ligação entre a matéria cinzenta periaquedutal dorsal (MCPD) e as desordens do pânico. Nestes trabalhos, a proposta de que a serotonina (5-HT) facilita a ansiedade quando atuando na amídala, ao mesmo tempo que inibe o pânico, quando atuando na MCPD.

            A serotonina, importante neurotransmissor excitatório, compõe o sistema serotonérgico, sistema este no qual alterações, como as induzidas por aprendizagem, ou processos patológicos, subjazem à plasticidade comportamental e mudanças de temperamento, resultando em comportamentos anormais e transtornos psiquiátricos. Numa “scholar review”, recentemente publicada por ele no prestigioso Neuroscience and Biobehavioral Reviews (2004), são apresentadas evidências experimentais indicando que ansiedade e pânico são diferentes emoções, não apenas em termos de suas experiências subjetivas, mas, também, de manifestações comportamentais e fisiológicas, enquanto respostas à drogas e substrato neural. Nela, ansiedade é associada com reações defensivas à ameaças potenciais, atenuada por ansiolíticos, integrada à estruturas cerebrais límbicas (amídala e hipocampo) e, também, capaz de ativar o eixo hormonal HPA (hipotálamo-pituitária-adrenal). Ao contrário, pânico é relacionado às reações de defesa, eliciadas por ameaças proximais, resistentes a ansiolíticos e integradas nas estruturas primitivas cerebrais, tais como, hipotálamo e PAG (matéria cinzenta periaquedutal) e não ativa o eixo HPA.

            O modelo teórico-experimental proposto por Graeff e colaboradores, revelando que a serotonina desempenha duplo papel sobre a ansiedade, facilitando-a no prosencéfalo, mas inibindo-a na MCPD, é um dos modelos mais comprovados na literatura em neurobiologia comportamental. Um múltiplo Festschrift à Graeff, portanto!

 

 

Do Araguaia a Cidadão do Mundo: Prof. José Antunes Rodrigues

 

            Quem encontra, pela primeira vez, o Prof. Antunes, imediatamente se encanta com sua fala mansa e educada e com sua alta inteligência e gestos polidos. Ele irradia otimismo e entusiasmo. Sua humildade é contagiante e, sempre, ao encerrar uma conversa, encontra uma palavra de incentivo ao interlocutor. O que ninguém imagina é que este homem é um dos gigantes da ciência brasileira, reconhecido nos quatro quadrantes do mundo. Orgulha-se de dois de seus grandes mestres, Professores Miguel Covian e Samuel McCann, fazendo questão de bem lembrar que sua carreira acadêmico-científica foi moldada pelos princípios éticos e humanistas ensinados por estes dois grandes cientistas, em cujas idéias sempre se inspirou.

            Dr. Antunes é um cientista completo. Com rara felicidade integra atividades administratvas, de ensino e de pesquisa. Ao longo de sua carreira ocupou várias funções, entre elas a de Diretor da FMRP-USP, tendo sido exímio e ativo junto ao Conselho Universitário da instituição. Sua paixão é a Fisiologia. Aqueles que ouvem-no sabem que, quando este homem começa a falar de pesquisa, não tem hora para parar. Fez inúmeras contribuições para o entendimento do papel do Sistema Nervoso Central (SNC) no controle do equilíbrio hidromineral, enfatizando as vias neurais na regulação homeostática. Foi um dos primeiros a demonstrar o papel dos núcleos paraventriculares, e supra-ópticos, no controle da ingestão de sódio. A rotina deste homem, eleito Professor Emérito, começa muito cedo. É um dos primeiros a chegar e, quase sempre, o que apaga as luzes do laboratório. Atualmente, encontra-se entusiasmado conduzindo experimentos que buscam demonstrar modificações na expressão gênica do Peptídeo Natriurético Atrial (ANP), vasopressina e ocitocina em áreas restritas do SNC em respostas à sobrecarga salina.

            Sua produção científica é intensa. Publicou quase três centenas de trabalhos em periódicos internacionais, de alto impacto e visibilidade. Seus trabalhos têm mais que 3.200 citações, as quais, por si próprias, atestam a qualidade de suas concepções teórico-experimentais. Seu índice h, indicador atualmente usado para aferir a amplitude qualitativa da produtividade científica, é cerca de 30, igual aos dos maiores pesquisadores do mundo em fisiologia. Condecorações e prêmios são inúmeros, entre os quais se destacam a Ordem Nacional do Mérito Científico – Grã Cruz e a Ordem Nacional do Mérito Científico - Comendador, que atestam o reconhecimento do Governo Brasileiro à sua frutífera, e coroada, carreira científica. Não obstante, sua grande paixão é estar com seus alunos, no laboratório, pensando no próximo experimento a fazer.

            As águas do Araguaia sempre ondulam em honra ao seu cientista ilustre.

 

Compartilhar: