
O declínio da violência no mundo
É comum as pessoas, e até mesmo a imprensa, de modo geral, divulgar que o mundo está ficando extremamente violento. Esta afirmação é, frequentemente, popularizada pelos românticos, os religiosos, os nostálgicos e, até mesmo, os cínicos.Todavia, este histórico factóide, raramente, é comprovado pelas evidências e pelos números. E, de certo modo, tem sido um dos grandes mitos humanos. Steven Pinker, em seu mais recente livro “Os anjos bons de nossa natureza: por que a violência tem declinado”, reuniu um conjunto de números revelando que, ao longo dos últimos cinco séculos, o mundo está se tornando um lugar cada vez mais seguro para se viver, bem como, que a raça humana nunca foi tão pacífica.
De forma irrefutável, apresenta evidências de que todas as formas de violência estão em declínio, desde as guerras à crueldade com animais. E, em alguns casos, a queda já dura mais de século, excetuando-se casos isolados. A obsolescência de uma grande guerra é um dos grandes fatos históricos do declínio da violência. Também, as taxas de homicídios europeus diminuíram quase 30 vezes, desde a Idade Média, de 40/100.000 pessoas/ano a 1,3 no fim do século 20. Os costumes bárbaros, que foram comuns por milênios, e que vão de sacrifício de vidas humanas, perseguição religiosa à heresia, escravismo, esportes sanguinolentos, mutilação, tortura punitiva, execuções sádicas (como queimar alguém vivo e crucificar alguém) e execuções por crimes sem vítima, têm sido abolidos em grande parte do mundo. Ao lado disso, nos últimos 50 anos, a revolução dos direitos, consecutivamente, como o direito civil, o direito feminino, o direito infantil, o direito dos homossexuais e o direito dos animais têm contribuído, substancialmente, para a redução das taxas de abuso sexual, da esposa, seqüestro, abuso dos infantis, agressões por orientações sexuais e proteção dos animais de laboratório.
Dentre as inúmeras razões alegadas por Pinker para esta dramática redução, encontram-se seis grandes tendências. Falemos delas. A primeira, ocorrida ao longo de milênios, foi a transição das sociedades predadoras e horticulturais, nas quais nossa espécie dispendeu grande parcela de sua história evolutiva, às civilizações agrícolas, com cidades e governos, iniciadas 5 mil anos atrás. Pinker denomina este período pacífico de “Processo de Pacificação”. A segunda, compreendendo mais da metade do milênio, e que tem sido mais bem documentada na Europa, revela um declínio de 10 a 50 vezes na taxa de homicídios. Esta tendência tem sido denominada de Processo de Civilização. A terceira, compreendendo alguns séculos, e que se efetuou na Idade da Razão e no Iluminismo Europeu (séculos XVII e XVIII), viu os primeiros movimentos organizados para abolir formas de violência socialmente sancionadas, tais como, despotismo, escravismo, duelo, tortura judicial, matar por superstição, punição sádica e crueldade com os animais, juntamente com as ondas de pacifismo sistemático, chamada, pelos historiadores, de Revolução Humanitária.
A quarta grande transição ocorreu após o fim da Segunda Guerra Mundial e, desde então, tem havido desenvolvimentos históricos na direção de fortalecer os Estados, as nações e findar guerras entre países, promovendo um período de longa paz. A quinta tendência, envolvendo combate armado, é mais tênue e menos visível e, embora difícil de ser creditada, é possível verificar, desde o final da Guerra Fria, em 1989, conflitos organizados de todos os tipos, como guerras civis, genocídios, repressão por governos autocráticos e ataques terroristas, diminuindo em todo o mundo. Em reconhecimento à natureza deste período feliz, Steve Pinker denominou-o Nova Paz.
Finalmente, a Era Pós-Guerra, simbolicamente inaugurada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, tem constatado uma crescente repulsa à agressão em menor escala, exemplificada pela violência contra minorias étnicas, mulheres, crianças, homossexuais e animais. Este movimento progressivo, iniciado em fins da década de 50, e que prossegue até os dias de hoje, tem sido denominado de Revolução dos Direitos.
Concluindo, a essência do título “Os anjos bons de nossa natureza: por que a violência tem declinado?” reside no fato de a natureza humana ser algo relativamente difícil de mudar, independente dos esforços de pais, professores ou doutrinadores político-religiosos. A concepção de que existe uma natureza humana vai contra a corrente popular das Ciências Humanas e, principalmente, entre intelectuais de esquerda, para os quais seria possível “melhorar” e / ou “promover” a humanidade.