
Os anjos bons da nossa natureza (1)
Este é o título do livro, um dos mais profundos e longos, daqueles escritos por Steven Pinker, atualmente, professor do Departamento de Psicologia de Harvard. De acordo com o “The New York Times Book Review” é um livro essencial para todos aqueles que se interessam pela natureza humana. O autor, já no prefácio, afirma que o livro trata de um acontecimento que pode ser o mais importante de toda a história humana e nele defende de forma clara e empírica que a violência vem diminuindo desde um passado distante a ponto de considerar que estamos todos, hoje, vivendo a era mais pacífica que nossa espécie já atravessou. Esta diminuição, para ele, é plenamente visível, inconfundível e ocorrendo em escalas que vão de milênios a meros anos, das guerras até o castigo físico de crianças.
Para Pinker, os anjos bons da nossa natureza constituem uma história de seis tendências, cinco demônios interiores, quatro anjos bons e cinco forças históricas. Vejamos agora as seis tendências.
As seis tendências são assim agrupadas para dar certa coerência aos numerosos avanços considerados por ele pelo recuo da violência na nossa espécie. A primeira, que ocorreu na escala milenar, foi a transição da anarquia das sociedades caçadoras, coletoras e horticultoras, nas quais nossa espécie atravessou a maior parte de sua história evolutiva, para as primeiras civilizações agrícolas com cidades e governos, iniciadas cerca de 5 mil atrás. Acompanhando essa mudança houve uma redução nos ataques e rixas crônicas que caracterizavam a vida em um estado natural e uma diminuição de aproximadamente cinco vezes nas taxas de mortes violentes. Ele denominou esta fase de Processo de Pacificação que caracteriza a imposição da paz.
A segunda transição compreendeu um período de mais de meio milênio e parece, certamente, estar mais evidenciada na Europa. Entre o final da Idade Média e o século XX, os países europeus tiveram um declínio de dez a vinte vezes em suas taxas de homicídio. Pinker, considerando a análise elaborada pelo Sociólogo Norbert Elias, em seu clássico livro “O processo civilizador”, faz dele suas palavras, atribuindo esse surpreendente declínio à consolidação de uma colcha de retalhos de territórios feudais em grandes reinos com autoridade centralizada e uma infraestrutura de comércio. Em reconhecimento a Elias, Pinker denominou esta tendência como Processo Civilizador.
A terceira transição ocorreu na escala secular e teve início na época da Idade da Razão do Iluminismo europeu ao longo dos séculos XVII e XVIII. Esse foi o momento dos primeiros movimentos organizados para abolir formas de violência socialmente sancionada, tais como, o despotismo, a escravidão, o duelo, a tortura judicial, a execução supersticiosa, as punições sádicas e a crueldade com animais, e foi também a época dos primeiros frêmitos do pacifismo sistemático. Ele chamou, imitando alguns historiadores, esta transição de Revolução Humanitária.
A quarta grande transição ocorreu após a Segunda Guerra Mundial. Desde então, os dois terços de século decorridos viram um progresso inédito em toda a história: as grandes potências, e as Nações desenvolvidas, em geral, pararam de guerrear entre si. Tal como os historiadores, ele chamou esse abençoado estado de coisas de Longa Paz.
A quinta tendência considera também o combate armado, embora seja mais sutil. Ainda que possa não ser imediatamente aparente, desde o fim da Guerra fria, em 1989, todos os tipos de conflitos organizados – guerras civis, genocídios, repressão por governos autocráticos e ataques terroristas – diminuíram no mundo. Em reconhecimento à natureza incipiente desse avanço, Pinker denominou-o de Nova Paz.
Finalmente, a era pós-guerra, inaugurada simbolicamente pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, testemunhou uma crescente repulsa pela agressão em escalas menores, por exemplo, na violência contra minorias étnicas, mulheres, crianças, homossexuais e animais. Isso se desdobrou em conceitos de direitos humanos – direitos civis, direitos das mulheres, direitos das crianças, direitos dos homossexuais e direitos dos animais, os quais vêm sendo solidificados a partir de fins de 1950 até nossos dias. Pinker chamou esta tendência de Revolução dos Direitos.