Por que estudar felicidade?
Novamente,
neste início do ano, o senador Cristovam Buarque volta à tona com seu projeto
de lei que visa a inserir na Constituição Brasileira o fomento da felicidade. É
verdade que felicidade é considerada, por muitos, o objetivo fundamental da
vida: real, ou virtualmente, todos querem ser felizes. Há tempos, a Declaração
da Independência Americana toma felicidade como uma verdade autoevidente,
entendendo que a busca da felicidade é um direito inalienável comparável á vida
e à liberdade. Nos idos de 1980, o rei do Butão promulgou a felicidade nacional
bruta como o princípio norteador em seu país. Mais recentemente, o
ex-presidente francês Sarkosy constituiu um grupo de notáveis que se reuniram
para buscar indicadores de bem-estar subjetivo em adição a indicadores
objetivos como os econômicos, refletidos no PIB ou IDH.
Sem
querer discutir se é conveniente, prático, possível ou mesmo ético governos
interferirem nos meios, mecanismos ou processos de fomento da felicidade, é
importante destacar as várias razões econômicas ou psicológicas para estudar
felicidade, sem adição ao interesse intrínseco acerca do tema. Quais são essas
razões?
Primeira, identificar os determinantes da
felicidade. Por que as pessoas vivenciam um dado nível de satisfação com a vida
que elas levam? Felicidade depende de um grande número de determinantes,
portanto, uma das tarefas mais importantes da pesquisa sobre felicidade é
isolar quais condições afetam o bem-estar social, e individual, e em que
extensão isto ocorre. Pesquisas sobre felicidade não são restritas à influência
de fatores econômicos, pois aspectos não materiais da vida de uma pessoa, tais
como, relações sociais entre membros familiares, amigos e vizinhos são, também,
importantes. Ademais, fatores genéticos, sócio-demográficos, culturais,
políticos e de personalidade afetam o bem-estar subjetivo e, em muitos casos,
agregam-se com os fatores econômicos.
Segunda, entender a natureza da felicidade. A
ideia de que os indivíduos têm felicidade como seu objetivo último na vida é,
certamente, indiscutível. Todavia, felicidade não é, necessariamente, o único
objetivo que importa, pois há outros, fundamentais, que todos os seres humanos
buscam otimizar, tais como, bem-estar físico e social, além de outros, que eles
também tentam alcançar, como, por exemplo, estimulação, conforto, status,
identidade e afeição. Felicidade não é um objetivo estático que os indivíduos
são hábeis em obter apenas aspirando-a. Pelo contrário. Felicidade é subproduto
de uma vida saudável, que produz satisfação ao longo da existência.
Terceira, testar teorias e predições
econômicas. Modelos econômicos fazem predições sistematicamente diferentes
sobre taxas, impostos, rendas, empregos, desempregos e outras intervenções
sócio-psicológicas sobre o nível de utilidade subjetiva das pessoas. A
mensuração da satisfação da vida, em função de cada uma dessas variáveis ou
externalidades, podem ser úteis na elaboração de políticas públicas que visam
ao florescimento da felicidade.
Quarta, isolar as consequências da
felicidade. Pessoas que são satisfeitas com a vida que elas levam são esperadas
a atuar diferentemente das pessoas que são insatisfeitas. Pessoas felizes são
mais otimistas, mais sociáveis, mais empreendedoras, tendendo a ter mais
bem-sucedidas em suas atividades privadas, econômicas e sociais. Como
consequência, elas são mais felizes em seus casamentos e empregos. Além disso,
elas têm um horizonte muito maior e tomam mais riscos passíveis de torná-las
mais bem sucedidas enquanto empreendedoras.
Quinta, é a felicidade uma causa ou em
efeito? É verdade que os mesmos fatores podem ser determinantes ou
consequências da felicidade. Um exemplo? Casamento pode aumentar felicidade,
mas as pessoas mais felizes são mais prováveis de serem casadas porque elas são
parceiros mais atraentes. Por isso, identificar a direção da causalidade é
importante, pois é uma pré-condição para tentar aumentar a felicidade através
das intervenções públicas.
Sexta, ajuda a dar sentido às observações
paradoxais. Um paradoxo importante e que necessita uma explicação satisfatória
é entender que, em vários países, a renda real tem aumentado substancialmente
desde a Segunda Guerra Mundial, mas os registros subjetivos de bem-estar subjetivo
não, ou mesmo levemente diminuído.
Sétima, melhora a políticas econômicas. Na maioria dos casos é difícil implementar uma
intervenção pública otimizada, por que qualquer ação social envolve custos
individuais e institucionais. Por consequência, uma avaliação dos efeitos
líquidos torna-se necessária. Políticas econômicas envolvem negociação e,
particularmente, negociações entre desemprego e inflação. A política econômica
envolve, parcialmente, como condições institucionais sobre a felicidade, por
exemplo, a qualidade da governança e o tamanho do capital social, afetam o
bem-estar individual.
Assim
considerando, por ser a felicidade um constructo multidimensional, estudos que
visam entendê-la em sua plenitude constituem um empreendimento transdisciplinar
e interdisciplinar. Sua complexidade deve ser apenas desafiada.