A tecnologia nos faz mais inteligentes?

A tecnologia nos faz mais inteligentes?

              Desde o início da civilização, as pessoas têm criado aparatos físicos e simbólicos que as ajudam a fazer o que não podem realizar com as próprias mãos: equipamentos, ferramentas, máquinas, sistemas escritos, matemática e similares. Tais produtos de invenção humana estendem tanto o nosso alcance físico quanto nosso alcance intelectual. Não obstante, o que nos interessa aqui é se as tecnologias inventadas nos faz, ou não, mais inteligentes. Ou, questionado mais formalmente, será que as tecnologias expandem nossas capacidades cognitivas em qualquer sentido fundamental? É certo que com a ajuda de certas tecnologias nós podemos ver mais distante, como é o caso dos telescópios ópticos, e descobrir coisas minúsculas, como é o caso dos microscópios ópticos e eletrônicos, bem como, acessar o conhecimento do passado e o conhecimento do outro lado do mundo com maior conveniência. Um exemplo? As bibliotecas e a internet. Assim, parece razoável que essas possibilidades possam, a primeira vista, nos tornar mais brilhantes. Entretanto, quais tipos de tecnologias nos tornam cognitivamente mais capazes? Em que sentido?

            Para responder esta questão, temos que considerar três cenários: 1º) os efeitos obtidos “com a tecnologia”, ou seja, como o uso de uma tecnologia enriquece nosso desempenho intelectual; 2º) os efeitos “da tecnologia”, ou seja, como o uso de uma tecnologia pode produzir resíduos cognitivos que enriquecem o desempenho, mesmo na ausência da mesma; e 3º) os efeitos “através da tecnologia”, ou seja, como a tecnologia, algumas vezes, não enriquece o desempenho, mas, fundamentalmente, reorganiza-o.

            No caso dos efeitos “com a tecnologia”, podemos, diretamente, perguntar como a tecnologia afeta o intelecto. Considere o caso dos computadores. Há, certamente, diferenças entre melhorar o desempenho na escrita com o uso de um processador de texto, indo à busca de informação de maneira inteiramente nova, ou aprender a partir de um modelo dinâmico, construído para pensar de maneiras novas, que reflitam o pensar do equipamento. Efeitos “com a tecnologia” são, usualmente, manifestados pelo efeito ampliado do desempenho enquanto alguém está operando uma dada ferramenta.

            Por outro lado, efeitos “da tecnologia” manifestam-se pelas mudanças que ocorrem no domínio das habilidades originadas como consequência daquela atividade com o instrumento, mesmo sem o instrumento em mãos. Em outras palavras, efeitos “da tecnologia” podem ser efeitos positivos ou negativos que persistem sem a tecnologia em uso após um período de uso da mesma. Por exemplo, alguém pode perguntar se há uma melhoria na habilidade de escrita e leitura ao usar um processador de texto como ferramenta, ou uma tendência para ser mais ou menos sistemático na busca de informação em geral como consequência de se pesquisar na Internet.

            Por sua vez, efeitos “através da tecnologia” consideram se as novas tecnologias, qualitativa e profundamente, remodelam nossos sistemas de atividade mais do que simplesmente aumentando-as. Voltando às tecnologias cognitivas, pode-se verificar a longa tradição escolástica na área de letramento, mostrando que leitura e escrita reorganizam nossos processos de recuperar, comparar, listar e ordenar nossas ideias, bem como, eventualmente, transmiti-las para outros.

            Assim considerando, cada uma dessas categorias de efeitos representa uma maneira pela qual tecnologias cognitivas podem ser ditas enriquecedoras das capacidades cognitivas de uma pessoa para fazê-las mais brilhantes. A resposta, portanto, a pergunta que abre este artigo é, seguramente, sim e, indubitavelmente, as tecnologias também influenciam a cognição. Já, saber se elas nos deixam mais inteligentes ainda é muito cedo para afirmar.

 

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