A visão do corpo afeta a percepção de dor?

A visão do corpo afeta a percepção de dor?

            O corpo, órgão, por excelência, multisensorial, envia ao cérebro informações a partir de vários sistemas sensoriais.  Devido à variedade destes, têm-se analisado como eventos, numa modalidade sensorial, modelam a percepção de eventos em outra. Neste contexto, pesquisadores, em três experimentos interdependentes, investigaram como a visão do corpo altera a percepção e processamento neural da dor, haja vista que modulação provocada pela observação do próprio corpo poderia envolver tanto inibição, quanto enriquecimento. No primeiro, usando caixa de espelho, os participantes vivenciaram dor numa das mãos, mas não viram qualquer estímulo visual aparecendo para causá-la, gerando, portanto, conflito perceptual.  No segundo, olhavam diretamente para sua mão ou para um objeto. O estimulador de raios a laser, que provocava estímulos dolorosos sobre a mão, era, agora, visível aos participantes, eliminando qualquer conflito intersensorial. No último, os experimentadores investigaram se a analgesia, visualmente induzida, era específica à observação da própria mão ou se a mesma poderia ser, similarmente, eliciada pela observação da mão de outra pessoa.

          Os resultados dos três experimentos revelaram uma nova forma de analgesia visualmente induzida. Observar a própria mão produz reduções significativas tanto da intensidade subjetiva, e do desprazer, associado à dor, quanto da amplitude do potencial evocado a laser. Estes efeitos foram observados tanto na condição ilusória de olhar diretamente a mão, induzida através da caixa de espelho, quanto na condição em que observaram suas mãos diretamente durante a estimulação. Mas a redução foi específica na condição de observação da própria mão, indicando, portanto, que ver o próprio corpo tem um feito analgésico.  Em outras palavras, observar o próprio corpo não apenas induz plasticidade nas representações corticais, dentro das quais os sinais de dor são processados, mas, também, modula o processamento perceptual individual dos eventos de dor.

          Duas possíveis interpretações teóricas foram aventadas. Primeira: a hipótese de que conflito entre as representações, visual e proprioceptiva, poderia ter induzido analgesia visual. Todavia, esta hipótese foi descartada, pois os resultados foram similares quando espelhos induzindo conflito não foram usados. Segunda, e mais provável: associou o efeito analgésico a um senso de propriedade (este é o meu corpo). Nesse sentido, um progressivo senso de controle corporal, quando observando a própria mão, mediava tanto as experiências subjetivas, quanto as respostas neurais à dor.  Em resumo, a observação do corpo, através de uma caixa de espelho, ou não, pode ter grandes efeitos analgésicos.

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