RACISMO: POR QUE ESSA DISCUSSÃO IMPORTA?

RACISMO: POR QUE ESSA DISCUSSÃO IMPORTA?

Em 25 de maio de 2020, um pouco além das 20h, um funcionário da Cup Foods, um supermercado em Minneapolis, realizou uma chamada para o número 911, número do serviço de emergência dos EUA, um funcionário de um supermercado da cidade de Minneapolis, em Minnesota, reportando que um homem tinha utilizado de uma nota falsa de US$ 20, para comprar um maço de cigarros era falsificado.

Em continuidade, relatou à atendente que o homem parecia "bêbado" e que "não estava sob controle de si mesmo", recusando-se a devolver o maço de cigarros.

Logo após a chamada, aproximadamente às 20h08, dois policiais chegaram ao local. Depois de se aproximarem onde encontrava-se o homem sentado, um dos policiais, sacou sua arma e ordenou que este mostrasse as mãos.

Uma vez algemado, o homem teria concordado quando Lane explicou que ele estava sendo preso por "usar dinheiro falso".

Mas, quando os policiais tentaram coloca-lo dentro da viatura policial, segundo o relatório, um confronto físico começou.

Por volta das 20h14, o homem "ficou tenso, caiu no chão e disse aos policiais que era claustrofóbico."

Durante uma nova tentativa de colocar o homem na viatura policial, um dos policiais puxou-o do banco do passageiro, "fazendo-o cair no chão". Ele permaneceu ali, caído com o rosto para baixo, algemado.

O homem preso tratava-se de um homem afro-americano de 46 anos, trabalhava como segurança em estabelecimentos da cidade, mas, como aconteceu com milhões de norte-americanos, foi demitido em meio à pandemia do novo coronavírus e cliente regular da Cup Foods, seu nome George Floyd.

Derek Chauvin, policial acusado de haver assassinado George Floyd, com um histórico problemático, com um total de 18 queixas de brutalidade registradas no banco de dados do Departamento de Polícia de Minneapolis, segurou o joelho no pescoço de George Floyd por exatos 08 minutos e 46 segundos, resultando na morte por asfixia mecânica.

A “técnica de imobilização” usada por Derek em George Floyd não faz parte do manual de treinamento dos departamentos de polícia. Mas ele não parecia estar se importando com isso. Sua reação era tranquila.

Esses momentos, capturados por vários telefones celulares e amplamente compartilhados nas redes sociais, seriam os últimos minutos da vida de Floyd, viralizaram, desencadeando manifestações violentas não só em Minneapolis, mas em muitas cidades nos EUA, já há vários dias.

Mesmo em meio à pandemia da covid-19, esse fato, em especial  fez eclodir no mundo uma ampla discussão sobre o racismo. Em apoio ao movimento que pede por justiça, marcas e celebridades se manifestaram publicamente, pedindo que as pessoas se posicionem contra o preconceito e a discriminação racial.

Por que essa discussão importa?

O Brasil carrega uma história de 300 anos de escravidão. Dentre os países da América, o nosso foi o último a abolir a escravidão negra formalmente, em 1888. 

Depois de mais de um século, ficou enraizado no inconsciente coletivo da sociedade brasileira um pensamento que marginaliza as pessoas negras, as impede de se constituírem como cidadãs plenas.

O povo negro de hoje continua largado à própria sorte e banido dos capítulos da cidadania e da inclusão social. Continua vivendo em cativeiro. São homens e mulheres sem emprego e renda, sem moradia digna, sem escolas, sem atendimento adequado de saúde. São vítimas da fome, da miséria, da pobreza, sem o mínimo de dignidade humana. As poucas políticas públicas que ainda existem estão sendo aniquiladas ou jogadas para debaixo do tapete, como o sistema de cotas e o Estatuto da Igualdade Racial.

No dia-a-dia da sociedade brasileira estão normalizadas frases e atitudes de cunho racista e preconceituoso. São piadas que associam negros e indígenas a situações vexatórias, degradantes ou criminosas. Ou atitudes baseadas em preconceitos, como desconfiar da índole de alguém pela cor de sua pele.

Uma outra forma comum de racismo é a adoção de eufemismos para fazer referência a negros ou pretos, como as palavras “moreno” e “pessoa de cor”. Essa atitude evidencia um desconforto das pessoas, em geral, ao utilizar as palavras “negro” ou “preto” pelo estigma social que a população negra recebeu ao longo dos anos.

Essas ações reverberam nas instituições públicas e privadas. No Estado e nas leis que alimentam a exclusão da população negra. Elas se materializam, por exemplo, na ausência de políticas públicas que possam promover melhores condições de vida a essa população.

As questões raciais são estruturantes porque fazem parte da construção das nossas sociedades. As subjetividades que nos compõem — os nossos preconceitos, por exemplo — acabam construindo as relações sociais que estabelecemos. E essas relações estão impregnadas de uma construção histórica equivocada, que mantém a população negra em posição de subalternidade.

Precisamos urgentemente traçar diretrizes que resultem na proteção e promoção da igualdade.

A conjuntura atual de desmonte de direitos da população negra, afro brasileira e de comunidades tradicionais, os discursos racistas traz-nos a responsabilidade de nos organizamos para enfrentar um período desafiador.

Debater esse tema, de forma exaustiva, é promover a reflexão de que queremos um debate que leve em consideração as políticas de igualdade, diversidade e proteção dos direitos humanos.

Pesquisa do Ministério da Saúde aponta que a cada três mortos por covid-19, a doença causada pelo novo coronavírus, um é negro. É óbvio que isso está ligado à desigualdade social e ao vazio de esperança.

Essa gente vive em comunidades carentes e nas periferias das grandes cidades, sem o mínimo de saneamento básico e vivendo em condições subumanas.

Os governos, nos três âmbitos, equivocadamente, diga-se, seguem ignorando esses locais e seus habitantes e não apresentam políticas públicas para levar bem-estar a eles.

Apesar de ter-se observado ao longos de duas décadas a reformulação das agendas voltadas à erradicação das desigualdades em geral como das desigualdades raciais em particular, no entanto, tais transformações ultimamente estagnaram, tornando-se urgentemente necessárias o implemento de mudanças estruturais, assim como as formas de enfrentamento das desigualdades via políticas de inclusão social.

E neste momento de extrema tristeza para o país, temos que ter clareza e agir, única e exclusivamente com o objetivo de salvar vidas e restabelecer a paz social.

“A dívida com os descendentes de escravos ainda não foi paga. O preconceito (mal) dissimulado tenta evitar esse acerto de contas. Um universalismo abstrato é usado como chicote contra os que falam de situações concretas. Mas é questão de tempo. A história não para de exumar cadáveres. Não há mais trégua para a infâmia.” (Juremir Machado da Silva, extraído da Obra: “Raízes do conservadorismo brasileiro — A abolição na imprensa e no imaginário popular.”)

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