E quando não houver mais?

E quando não houver mais?

‘Só se pode vencer a natureza obedecendo-lhe’ (Francis Bacon).

Em um mundo multifacetado hostilizamos cotidianamente o essencial à nossa sobrevivência – os recursos naturais. O psicólogo social Daniel Gilbert da Universidade de Harvard explica em um artigo publicado na revista Nature (‘Buried by bad decisions’ – Enterrado por más decisões) que possuímos cérebros otimizados para buscar comida e parceiros na savana africana, mas não tão bons para estimar consequências de longo prazo ou o impacto do consumo excessivo de recursos (Gilbert, 2011). Somos “pré-programados” para tomar decisões baseadas em necessidades de curto prazo.

Já pensaram no dia em que chegarmos ao ponto de ‘quando não houver mais’?

Quando não houver mais recursos naturais para extrairmos do solo, da flora, da fauna e da atmosfera? Recursos simples como o ferro, matéria prima utilizada na construção civil, automotiva, medicamentosa e qualquer coisa que neste instante você está utilizando. Recursos cuja flora imensa em sua diversidade e utilidade que preenche uma gama de necessidades básicas como o alimento em forma de frutas, grãos, o uso do remédio para sua dor de cabeça causada pelo estresse do cotidiano de uma vida corrida e em busca do mais e mais. Como bem poetizado por Érico Veríssimo, um dos escritores mais populares do século XX - “O objetivo do consumidor não é possuir coisas, mas consumir cada vez mais e mais a fim de que com isso possa compensar o seu vácuo interior, a sua passividade, a sua solidão, o seu tédio e a sua ansiedade.”

Recursos da fauna amplamente dizimada sem o menor pudor e criando rótulos, estigmas e tabus que vão desde o uso afrodisíaco como chifres de rinocerontes, passando pelos souvenirs de mãos de gorilas para cinzeiros, cabeças de tigres, leões e muitos outros para ornamentar sua sala de visita, glândulas de veados para composição do perfume que usa, e até a elegante pele de tigre asiático para ser o vestuário da mulher cheia de adornos por fora e oca por dentro.

Recursos como o oxigênio, do qual tanto necessitamos em nossas trocas gasosas para que tão somente nos mantenha vivos. A simplicidade da água que cai nos verões e primaveras preenchendo nossos olhares com a exuberância da vitalidade da natureza, esta mesma água condicionada em caixas, lagos, lagoas, reservatórios e rios, nos dão sustento alimentar básico e determinam um ciclo dentro da complexa cadeia produtiva e de consumo.

Pois bem, já pensaram ‘E quando não houver mais?’ 

Impressiona a capacidade do homem em produzir, formar, criar e conquistar até o inimaginável, todavia, a proporção é equivalente a sua falta de percepção nas alterações simples, mas, importantes ao seu redor.

Nossa flora se perde em corredores limitados por estradas ou pastagem de gado, nossa fauna declina ao ponto de conhecermos representantes apenas em livros e documentos anteriores a sua extinção, assim como o ar que respiramos, em tempos mais difíceis que já enfrentamos e continuamos a enfrentá-los estarão condicionados em prateleiras de supermercados como itens de primeira necessidade, já com nossa límpida e líquida água - esta, estará em cilindros de hidrogênio também como gás na mesma prateleira do oxigênio no supermercado de sua preferência. Todavia, como seres racionais e dotados de inteligência, entre estes dois cilindros (oxigênio/hidrogênio) terá um manual de instrução para que você aprenda como fazer a reação química e compor as duas partes de hidrogênio para a parte de oxigênio, já que você pode e tem a competência para isso e esta competência parece mais simples que ser parceiro com a natureza gratuita ao seu redor.

Quando não houver mais, provavelmente não precisará de mais nada já que a extinção é gradiente favorável.

Este texto foi escrito em parceria com o Dr. Márcio Rogério Penha, Biólogo, do Departamento de Psicobiologia da FFCLRP-USP com quem tive a honra de dividir a sala de aula nos tempos da faculdade. 

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