Auto-ajuda, clichês e uma certa esperança

Auto-ajuda, clichês e uma certa esperança

“Quando a esmola é muita

Até santo desconfia”

(autor desconhecido)

 

Com títulos bastante atraentes, livros de auto-ajuda são fenômenos de venda em todo mundo. Os intelectuais e pessoas mais comedidas desaprovam. Mas o que está por traz ou pela frente desse fenômeno? “O Sucesso é Ser Feliz”; “O Sentido da Vida”; “Mentes brilhantes, mentes treinadas” e outros títulos atraem o leitor porque parecem condensar coisas complicadíssimas em simples palavras.

Percebo que autores desses livros possuem um grande amor à humanidade que se expressa em uma preocupação forte em salvar o mundo ou salvar o seres humanos de uma desgraça anunciada. Psicanalistas e outros profissionais da “área psi” compartilham desse mesmo “amor à humanidade”, mas atuam de maneira mais sutil no sofrimento humano. Não possuem a intenção direta de salvar ninguém... Muitas vezes, embora o sofrimento seja muito grande, a própria pessoa não deseja (ou não pode) salvar-se de nada. O sofrimento e culpa constituem a própria salvação, paradoxalmente. Isso é complicado demais e os livros de auto-ajuda descomplicam isso. Transformam a difícil tarefa de se tornar humano - que é tarefa para a vida inteira - num processo simples, regrado e com passos pré-definidos e aparentemente simples de seguir.

As vezes penso que nós, psicanalistas e outras pessoas que não gostam muito de autoajuda complicam demais as coisas. Mas basta analisarmos nossos sentimentos profundos para verificar que as coisas não são tão simples, e certos conflitos perduram até nossa morte, nos trazendo sofrimento. Como lidar então com sofrimento eterno até a hora de nossa morte?

Dois caminhos: 1. autoajuda vai lhe dar o sentimento de que você é iluminado, lhe dar frases de efeito que transformarão seu sofrimento em alguma coisa mais palpável, definida e compartilhada com os outros e assim você sofre menos e se sente compreendido, confortável... digamos, mais “normal”. Conheço muitas pessoas que de fato se livraram de muito sofrimento com livros de auto-ajuda. 2. Percepção de que a dor e sofrimento existem para serem vividos, transgredidos, superados e novamente experimentados de forma cíclica e redundante; desistindo portanto da ideia de retirar o sofrimento do ser humano, pois constitui tarefa para a vida inteira, é totalmente pessoal, intransferível e se dá na relação com o outro. Isso parece ser a essência do próprio ato de viver e da formação do ser humano como tal.

É fato que as pessoas preferem os caminhos mais curtos e confortáveis para conseguir o que quer que seja, e livros de auto-ajuda vão sempre vender mais do que sessões psicanalíticas ou outra terapia psíquica.

Finalizando, fica aqui a expressão da minha esperança no ser humano: de que não se deixem enganar por pensamentos simplórios, clichês e (pseudo) intelectuais que alegam possuir a cura para todos os males da humanidade.

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