Impotência, violência e o totalitarismo do bem

Impotência, violência e o totalitarismo do bem

Uma das grandes questões modernas é a violência. Um sentimento de insegurança toma os moradores de pequenas e grandes cidades porque o processo civilizatório falhou ao tentar dominar os impulsos agressivos que um homem tem frente ao outro.

Afinal, o homem tem um lobo interno que deseja devorar o próximo ou é naturalmente bom sendo depois corrompido pela desigualdade das condições sociais? 

Nem um nem outro.

A psicanálise, tanto em sua teoria como na prática clínica, visa a análise e “solução” de conflitos. Conflitos são lutas internas entre dois ou mais pensamentos, ideias ou desejos. Neste sentido vejo que “um certo lobo” e “um certo cordeiro” que nos habitam lutam diariamente, medem forças. Ocasionalmente um ganha do outro.

Muita se fala no politicamente correto ou, como diz Luiz Felipe Pondé,  o totalitarismo do bem. O autor explica esta condição como se tivéssemos um sentimento fixado, neurótico de que “o mundo seria muito melhor se todos fossem iguais a mim”. Essa é a missão do chefe (ou estado) totalitário: visa uniformizar tudo a sua frente tendo como modelo de máxima perfeição um fantasma narcísico, uma fantasia egocêntrica que diz respeito ao seu próprio umbigo. Então chefes de estado vão proibindo, cerceando cada vez mais a liberdade individual, para garantir a sobrevivência de seus súditos e para controlar destinos, atitudes e pensamentos. O pensamento totalitário visa controlar tudo a sua volta e por isso uniformiza tudo que lhe é estranho ou diferente. 

Na raiz desse pensamento ou sentimento totalitário e violento, está a mais profunda impotência. Podemos falar agora de uma simples briga de trânsito (que expressa muito bem o comportamento explosivo e violento, muito comum hoje em dia). Você está no transito e sente-se como uma hemácia perdida, sozinha no meio de um fluxo sanguíneo intenso. Carros passam, buzinam, motos cortam por todos os lados... há nesse momento um sentimento de profunda impotência em torno de todos esses elementos incontroláveis. Frente à essa realidade aparentemente caótica surge uma ideia ou um pensamento em resposta à isso: a violência. Então, você percebe que se der um soco na cara de tal motoqueiro pode resolver a situação. Em outras palavras, sente que se atuar de forma contundente na realidade, pode por fim à esse sentimento angustiante de impotência. Em suma, sempre que você sente necessidade de agredir algo ou alguém, perceba que há latente, escondida, uma angustia frente à algum tipo de impotência. Lembro-me de mais um exemplo: um pai cansado de birras e desobediências do filho pequeno resolve gritar e dar umas palmadas. Isso é típico.

Como resultado desse desejo violento de uniformização, governos vão cada vez mais controlando tudo a sua volta: as matas, os animais, os humanos (que também, ironicamente, desejam ser controlados). Inevitavelmente a ciência passa a se constituir como os andaimes da construção de uma humanidade melhor, mais consciente e mais feliz. Termino citando Pondé: “Não confio em ninguém que queira criar um homem melhor”.

 

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